SBOC REVIEW
[▶ Comentário em vídeo] Osimertinibe com ou sem Quimioterapia em Câncer de Pulmão Não-Pequenas Células EGFR-Mutado Avançado
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Resumo do artigo:
O inibidor de tirosina quinase de EGFR (TKI-EGFR) de terceira geração osimertinibe é um potente, seletivo e irreversível inibidor das mutações ativadoras (como as deleções do éxon 19 e a mutação L858R no éxon 21) e da mutação de resistência T790M do EGFR. Apresenta importante atividade em sistema nervoso central (SNC), sendo indicado como tratamento de primeira linha em câncer de pulmão não-pequenas células (CPNPC) avançado com mutações ativadoras de EGFR desde a comprovação de ganho em sobrevida livre de progressão (SLP) e sobrevida global (SG) em comparação com TKI-EGFRs de primeira geração no estudo FLAURA. Apesar da atividade da droga, a maioria dos pacientes com CPNPC avançado apresenta progressão de doença ao tratamento. Estudos de fase 2 e 3 avaliando a combinação de gefitinibe (TKI-EGFR de primeira geração) com quimioterapia já haviam demonstrado eficácia superior em comparação ao gefitinibe isolado. Dessa maneira, o estudo FLAURA2 buscou avaliar a eficácia e segurança em primeira linha da combinação de osimertinibe com quimioterapia em CPNCP avançado EGFR-mutado.
Neste estudo fase 3, pacientes com CPNPC localmente avançado ou metastático não previamente tratados e portadores de mutações ativadoras do EGFR (deleção do éxon 19 ou L858R) foram randomizados 1:1 para receberem osimertinibe 80 mg/dia e quimioterapia (pemetrexede 500 mg/m2 + cisplatina 75 mg/m2 ou carboplatina AUC 5) ou osimertinibe 80 mg/dia em monoterapia. A quimioterapia era administrada em ciclos de 21 dias por 4 ciclos com manutenção de pemetrexede a cada 21 dias posteriormente. Foi permitida a inclusão de pacientes com metástases em SNC desde que estáveis. Os pacientes foram estratificados quanto a raça, tipo de mutação de EGFR e performance.
O estudo teve como desfecho primário a SLP avaliada pelo investigador. Desfechos secundários incluíam SG, taxa de resposta objetiva (TRO) duração de resposta (DRO), taxa de controle de doença (TCD), profundidade da resposta, segunda SLP (SLP2) e segurança.
Foram randomizados 557 pacientes, sendo 279 para a combinação e 278 para a monoterapia. Um total de 41% dos pacientes apresentava metástases em SNC e 53% metástases extratorácicas. 60% dos pacientes apresentava deleção do éxon 19, enquanto 38% apresentavam a mutação L858R no éxon 21.
O estudo foi positivo para o seu desfecho primário com SLP medianas de 25,5 meses no braço combinação versus 16,7 meses no braço monoterapia (HR 0,62; IC 95% 0,49-0,79). Em dois anos, 57% dos pacientes do braço combinação estavam livres de progressão ou morte em comparação aos 41% do braço monoterapia. Entre os pacientes com metástases em SNC ao diagnóstico, as SLP medianas foram de 24,9 meses na combinação versus 13,8 meses na monoterapia (HR 0,47; IC 95% 0,33-0,66). A TRO favoreceu a combinação (83% versus 76%), assim como a DRO (24,0 meses versus 15,3 meses). Análises de subgrupos demonstraram uma tendência consistente de benefício em SLP para a combinação independentemente de fatores como idade, histórico de tabagismo e tipo de mutação de EGFR. Houve, também, ganho em SLP2 (HR 0,70; IC 95% 0,52-0,93), enquanto que os dados de SG seguem imaturos (27% de maturidade).
Em contrapartida, houve maior toxicidade na combinação, com 64% de eventos adversos grau três ou maior (27% na monoterapia), além de mais eventos que cursaram com óbito dos pacientes. Tais eventos adversos levaram a maiores taxas de interrupção, redução de dose e descontinuação de tratamento.
Finalmente, o estudo traz a combinação de osimertinibe com quimioterapia como uma alternativa de tratamento em primeira linha.
Comentário do avaliador científico:
A combinação de osimertinibe com poliquimioterapia baseada em platina demonstrou resultados interessantes no estudo fase 3 randomizado e internacional FLAURA2, sugerindo uma nova opção de tratamento nesse cenário. Entretanto, alguns pontos ainda devem ser esclarecidos.
Houve um ganho estatisticamente significativo em SLP consistente em diversos subgrupos, incluindo pacientes de pior prognóstico, como aqueles com metástases em SNC ao diagnóstico e os portadores da mutação L858R no éxon 21. O ganho em TRO foi modesto, dado que o uso isolado de osimertinibe traz, por si só, importante resposta tumoral. Já o aumento em DRO e o ganho em SLP2 foram animadores. Cabe ressaltar, ainda, que o estudo avaliou apenas as mutações ativadoras de EGFR mais comuns.
Com os dados iniciais do FLAURA2 em mãos, fica o questionamento sobre como melhor selecionar pacientes com CPNPC avançado EGFR-mutado para intensificação de tratamento com quimioterapia, uma vez que os dados de sobrevida global ainda estão imaturos e houve incremento significativo em toxicidades (incluindo grau 3 ou maior). Sabe-se que muitos pacientes têm bons prognósticos e sobrevidas prolongadas com o uso de osimertinibe em monoterapia; portanto, seria o uso concomitante de quimioterapia a melhor opção em detrimento ao uso sequencial no momento da progressão ao TKI-EGFR? Da mesma maneira, haveria a necessidade de manutenção de pemetrexede a cada 3 semanas para todos os pacientes que iniciaram o tratamento combinado, expondo-os a mais eventos adversos e comprometendo a qualidade de vida?
A análise de fatores clínicos (presença de metástases em SNC, performance do paciente), moleculares (presença de outras mutações de EGFR, comutações em diferentes vias, análises de células tumorais e DNA tumoral circulantes) e, principalmente, os dados maduros de SG poderão nos auxiliar na escolha da melhor estratégia de tratamento para esses pacientes.
Citação: Planchard D, Jänne PA, et al. Osimertinib with or without Chemotherapy in EGFR-Mutated Advanced NSCLC. N Engl J Med. 2023 Nov 23;389(21):1935-1948. doi: 10.1056/NEJMoa2306434. Epub 2023 Nov 8. PMID: 37937763.
Avaliador científico:
Dr. Francesco Sansone Bermejo
Residência de Oncologia Clínica pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP-FMUSP)
Oncologista Clínico do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP-FMUSP)
Oncologista Clínico do Hospital São Luiz Campinas (Rede D’Or)