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SBOC REVIEW

Adição de anticorpo anti-PD1 à quimioterapia perioperatória em câncer gástrico ou gastroesofágico localmente avançado (KEYNOTE-585)

Resumo do artigo:

A neoplasia gástrica é a quinta mais frequente no mundo e terceira em causa de morte por câncer no sexo masculino. A cirurgia em pacientes não metastáticos é a única opção terapêutica curativa, no entanto, as taxas de recorrência permanecem elevadas, levando à adição de estratégias que possibilitem melhorar esses dados, como a terapia multimodal – quimioterapia perioperatória (neo e/ou adjuvante) ou quimiorradiação. Todas essas modalidades são indicadas com intuito de aumentar as possibilidades de ressecção completa, com a maior percentagem de resposta patológica completa.

É sabido que o tratamento do câncer gástrico localmente avançado, está baseado em quimioterapia neoadjuvante (FLOT), que se mostrou eficaz em melhorar a taxa de ressecção cirúrgica com redução na taxa de recorrência e metástase. À luz das informações atuais, sabemos que os imunoterápicos inibidores de PD-1 ou PD-L1, atuam na imunidade antitumoral, tendo eficácia duradoura em pacientes com esse tipo de câncer avançado ou metastático.

Na ESMO de 2023, foi apresentado os resultados da análise intermediária pré-especificada (terceira) do estado KEYNOTE 585. Estudo fase 3, multicêntrico, randomizado, controlado, duplo cego, controlado por placebo, realizados em 143 centros médicos. Pacientes elegíveis tinham 18 anos ou mais, eram diagnosticados com neoplasia gástrica ou gastroesofágica virgem de tratamento, localmente avançado, ressecável e com ECOG 0-1.

Os pacientes foram randomizados em duas coortes, a principal e a FLOT. Na coorte principal, 804 pacientes foram randomizados – 402 para pembrolizumabe e 402 para placebo. Esses pacientes receberam imunoterapia neoadjuvante 200 mg por via intravenosa ou placebo associado a quimioterapia dupla à base de cisplatina, a cada 3 semanas, durante 03 ciclos, seguidos de cirurgia, repetido esquema anterior, de forma adjuvante, por mais 03 ciclos e pembrolizumabe ou placebo por 11 ciclos. Na coorte do FLOT, 203 pacientes foram randomizados – 100 para pembrolizumabe mais FLOT e 103 para placebo mais FLOT. Esses pacientes receberam FLOT e imunoterapia/placebo a cada 02 semanas por 04 ciclos, seguido de cirurgia, repetido esquema, de forma adjuvante, por mais 04 ciclos seguidos de pembrolizumabe ou placebo por 11 ciclos.

Como desfechos primários, foram considerados a taxa de resposta patológica completa (sigla em inglês pathCR) avaliado por BIRC, a sobrevida livre de eventos (SLE), a sobrevida global (SG) e a segurança avaliada em todos os pacientes que receberam pelo menos uma dose de tratamento.

Na coorte principal, após mediana de 47,7 meses, o pembrolizumabe foi superior ao placebo no que tange a resposta patológica completa: 52 (12,9%) de 402 versus 8 (2%) de 402; perfazendo uma diferença de 10,9%, p<0,00001. A mediana da sobrevida livre de eventos também foi maior no braço da imunoterapia (44,4 meses versus 20,6 meses, p=0,0198), mas sem significância estatística (p=0,0178). A SG mediana foi de 60,7 meses no braço do pembrolizumabe versus 58 meses no braço placebo (HR 0,90, p=0,174). Eventos adversos grau 3 ou maior ocorreram em 312 (78%) dos 399 pacientes do grupo da imunoterapia e 297 (74%) dos 400 do grupo do placebo, sendo os mais comuns: náusea, anemia e hiporexia.

Eventos adversos graves que culminaram em óbito ocorreram em 04 pacientes no braço da imunoterapia (1% – pneumonia, lesão renal aguda, isquemia intersticial e redução do apetite) e 02 pacientes no braço do placebo (< 1% – sepse e colite secundárias à neutropenia).

 

Comentário do avaliador científico:

O estudo evidencia que adição de imunoterapia à quimioterapia, no cenário perioperatório, promove aumento pathCR, porém, não se traduz em SLE. Observa-se uma tendência à redução desses eventos, mas isso não se concretiza em dados com significância estatística.

Uma limitação achada foi que o esquema FLOT não foi utilizado do grupo controle da coorte principal, haja vista, o recrutamento inicial em 2017 e o estudo FLOT em 2019 (estudo que mostrou ganho SLP e SG). Por conseguinte, o estudo foi alterado e introduzido uma pequena coorte com FLOT. Então indago: se o FLOT fosse utilizado no braço controle, os resultados poderiam ser diferentes, no que se refere a sobrevida livre de eventos e SLP e SG?

A pathCR foi semelhante à de outros estudos, como o DANTE, que utiliza FLOT + atezolizumabe perioperatórios e do MATTERHORN, que utiliza FLOT + durvalumabe. No entanto, os dados de sobrevida ainda continuam não publicados.

Diante dos dados podemos inferir que uma mudança de paradigmas pode ocorrer com a introdução de tratamentos multimodais, associados à combinações de quimioterapia à imunoterapia, porém, devemos ter cautela e observar com parcimônia os dados disponibilizados, para que possamos, de fato, ofertar ao nosso paciente, ganho clínico e de sobrevida, às custas de uma não piora na toxicidade e às custas de viabilidade financeira.

 

Citação: Lancet Oncol 2023. Published Online December 19, 2023, https://doi.org/10.1016/ S1470-2045(23)00541-7.

 

Avaliador científico:

Dra. Anny Hellen Albino Dantas

Oncologia Clínica pela Liga Norte Riograndense contra o Câncer;

Cuidados paliativos pelo HIAA.

Atual coordenadora médica da Unidade IV – HOS.