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SBOC REVIEW

Adição de anticorpo anti-VEGF à quimioimunoterapia no câncer de pulmão de células não pequenas avançado (estudo APPLE)

Resumo do artigo:

A imunoterapia tem papel bem estabelecido no tratamento do câncer de pulmão de células não pequenas (CPCNP) avançado, combinada ou não à quimioterapia, com aumento de sobrevida global (SG) demonstrado por estudos de fase III. Ainda assim, muitos pacientes evoluem com progressão de doença devido à resistência ao tratamento. Vários ensaios têm avaliado se a adição de terapias-alvo à combinação de anticorpos anti-PD-1/PD-L1 mais doublet de platina melhoraria os desfechos de sobrevida nos pacientes com CPCNP avançado.

Bevacizumabe é um anticorpo monoclonal específico contra o fator de crescimento do endotélio vascular (VEGF) com benefício estabelecido no tratamento do CPCNP combinado à quimioterapia padrão com agente platinante. Ensaios pré-clínicos sugerem que a ação anti-VEGF melhora resposta imune através da normalização da vascularização tumoral, aumento da infiltração de células T, promoção da maturação de células dendríticas e atenuação da atividade imunossupressora. Estudos clínicos demonstraram que a adição de bevacizumabe a um anticorpo anti-PD-L1 prolonga sobrevida livre de progressão (SLP) em câncer de rim e hepatocarcinoma.

O Apple trial é um estudo de fase III, multicêntrico, randomizado, aberto, conduzido em 37 hospitais do Japão que avaliou a adição de bevacizumabe à quimioterapia com pemetrexede, carboplatina e atezolizumabe no CPCNP avançado não escamoso. Foram incluídos pacientes adultos com CPCNP inoperável ou localmente avançado, metastático ou recorrente. Não foi permitido tratamento prévio com quimioterapia ou imunoterapia, mas tratamento com inibidores de tirosina-quinase (TKIs) dirigidos ao EGFR, ALK, ROS-1 ou BRAF. Foram excluídos pacientes com metástases cerebrais sintomáticas, doenças autoimunes ou hipertensão não controlada.

Os pacientes foram randomizados (1:1) para receber atezolizumabe na dose de 1200 mg, carboplatina (AUC 5) e pemetrexede 500 mg/m² a cada 3 semanas (grupo APP) ou atezolizumabe, carboplatina e pemetrexede nas mesmas doses com bevacizumabe 15 mg/kg cada 3 semanas (grupo APPB). Após 4 ciclos de terapia de indução, manutenção com atezolizumabe e pemetrexede ou com atezolizumabe, pemetrexede e bevacizumabe foi administrada até progressão de doença, toxicidade limitante ou até 2 anos do início do estudo.

O endpoint primário foi SLP avaliada por um comitê cego independente. Endpoints secundários foram SG, SLP, resposta objetiva, duração e taxa de resposta, avaliados pelo investigador. 412 pacientes foram recrutados, sendo 205 no grupo APPB e 206 no grupo APP. A SLP mediana foi 9,6 meses no grupo APPB versus 7,7 meses no grupo APP (HR 0,86; IC 95%, 0,70-1,07; p = 0,92).

A taxa de resposta objetiva foi de 62% no grupo APPB versus 51% no grupo APP. A duração de resposta mediana foi de 10,2 (IC 95%, 8,2-13,1) meses no grupo APPB versus 12,4 (IC 95%, 8,3-12,7) meses no grupo APP.

Uma análise de subgrupo pré-estabelecida, destacou um aumento na SLP com APPB versus APP nos pacientes com alterações em drivers oncogênicos (mediana de 9,7 versus 5,8 meses; HR 0.67; IC 95%, 0,46 – 0,98). Na população portadora de drivers oncogênicos, a SG mediana foi de 32 meses (IC 95%, 22,0-não atingida) no grupo APPB versus 20,8 meses no grupo APP (IC 95%, 17,1-27,7; HR 0,63; IC 95%, 0,38-1,03).

Os achados do estudo não demonstraram superioridade da adição de bevacizumabe à quimioimunoterapia no tratamento de primeira linha dos pacientes com CPCNP avançado não escamoso. Contudo, o esquema quádruplo mostrou tolerabilidade semelhante e maior SLP no subgrupo de pacientes portadores de alterações em drivers oncogênicos.

 

Comentário do Avaliador:

Este é o primeiro estudo clínico de fase 3 randomizado a investigar o efeito da adição de um inibidor de VEGF a um anti-PD-L1 combinado à quimioterapia padrão com doublet de platina no CPCNP avançado.

Nesse cenário, a combinação imunoterapia com antiangiogênico foi também avaliada num estudo fase 2 (Lung-MAP S1800A), que comparou Pembrolizumabe e ramucirumabe ao tratamento padrão em pacientes já expostos aos anti-PD-1/ PD-L1, evidenciando aumento de SG. Uma análise exploratória do IMpower150 do subgrupo EGFR mutado designado ao braço com atezolizumabe/quimioterapia/bevacizumabe também evidenciou aumento de SG (27,8 versus 18,1 meses) em relação ao grupo quimioterapia/bevacizumabe, porém representam uma população pequena do trial (dado exploratório). Ademais, o duplo bloqueio do EGFR e do VEGF já foi avaliado em outros estudos, sendo uma das opções de tratamento de primeira linha no CPCNP.

Neste estudo, o aumento da SLP no subgrupo positivo para drivers oncogênicos é animador. Uma possível explicação é que tumores com mutações no EGFR expressam níveis mais elevados de VEFG, assim a inibição do mesmo modificaria o microambiente tumoral aumentando o efeito do anti-PD-1/PD-L1. Considerando a possível atividade sinérgica destas drogas, a associação das mesmas merece ser mais explorada na população com mutações drivers.

 

Citação: Shiraishi Y, Kishimoto J, Sugawara S, et al. Atezolizumab and Platinum Plus Pemetrexed With or Without Bevacizumab for Metastatic Nonsquamous Non–Small Cell Lung Cancer: A Phase 3 Randomized Clinical Trial. JAMA Oncol. Published online December 21, 2023. doi:10.1001/jamaoncol.2023.5258

 

Avaliadora científica:

Dra. Roberta Venturella 

Residência em oncologia clínica pelo Hospital Nossa Senhora da Conceição.

Oncologista Clínica do Hospital Mãe de Deus e Ernesto Dornelles

Preceptora da residência de Oncologia Clínica no Hospital Ernesto Dornelles