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SBOC REVIEW

Antidepressivo mostra benefício contra hiporexia relacionada ao câncer de pulmão

Resumo do artigo:

A incidência de anorexia em pacientes com câncer de pulmão, de acordo com a literatura, atinge aproximadamente 60% dos casos. A anorexia se manifesta predominantemente como perda de apetite e mudanças no paladar, resultantes de alterações na sinalização periférica e central da via alimentar. Tais efeitos provocam diminuição na ingestão de alimentos, perda de peso, redução da funcionalidade e menor tolerância aos tratamentos, piorando o prognóstico desses pacientes.

Reconhecer precocemente a anorexia relacionada ao câncer é crucial no tratamento do câncer de pulmão. Atualmente, não há intervenção farmacológica aprovada e uso de mirtazapina vem recebendo atenção nesse contexto. A mirtazapina atua como um antagonista alfa-2 pré e pós-sináptico de receptores 5HT2, 5HT3 e H1, proporcionando efeitos antidepressivos, analgésicos e antieméticos. Além disso, ela pode aumentar o apetite e promover o ganho de peso.

Com base na capacidade da mirtazapina de estimular o apetite por efeitos regulatórios centrais e na motilidade gástrica, ela tem sido investigada como uma opção no manejo da anorexia relacionada ao câncer. O objetivo deste estudo foi avaliar o efeito da mirtazapina sobre o apetite e o consumo calórico em pacientes com câncer de pulmão de células não pequenas (CPCNP) e anorexia, com segurança e qualidade de vida relacionadas à saúde como desfechos secundários. Este foi um estudo randomizado, duplo-cego e controlado por placebo, conduzido em um centro de câncer terciário, com um acompanhamento de 8 semanas.

Um total de 86 pacientes foram randomizados, com 43 em cada grupo do estudo. Na análise de acompanhamento da quarta semana, participaram 38 pacientes no grupo da mirtazapina e 33 no grupo do placebo. Na análise da oitava semana, foram incluídos 31 pacientes no grupo da intervenção e 27 no grupo do placebo. A idade média dos participantes foi de 63,5 anos, com a maioria apresentando adenocarcinoma (88,7%), pontuação na escala ECOG de 1 (90,2%), estágio clínico IV (90,1%) e em primeira linha de tratamento (70,4%).

Após 4 semanas, a mirtazapina demonstrou um aumento significativo na ingestão calórica (379,3 kcal; IC 95%, 1382,6-576,1; p < 0,001), incluindo proteínas (22,5 g; IC 95%, 11,5-33,4; p = 0,001), carboidratos (43,4 g; IC 95%, 13,1-73,8; p = 0,006) e gorduras (13,2 g; IC 95%, 6,0-20,4; p = 0,006). Na análise da oitava semana, observou-se um aumento significativo no consumo de gorduras no grupo da mirtazapina (14,5 g vs. 0,7 g; p = 0,02).

O uso de mirtazapina também resultou em uma significativa redução na proporção de pacientes com sarcopenia (82,8% vs. 57,1%, p = 0,03) em 8 semanas. Não foram observadas diferenças nos escores de apetite entre os grupos após 4 e 8 semanas. O tratamento foi bem tolerado, com relatos de maior percepção de pesadelos nas primeiras 2 semanas, embora esse achado não tenha sido significativo após 4 e 8 semanas.

Este estudo sugere que a mirtazapina pode ser uma intervenção farmacológica nutricional acessível e segura em pacientes com CPCNP e anorexia, resultando em um aumento da ingestão calórica em 8 semanas, principalmente devido ao aumento no consumo de gorduras. É necessário avaliar os efeitos do uso a longo prazo de mirtazapina sobre parâmetros nutricionais, como os níveis de albumina, ocorrência de sarcopenia e sobrevida.

 

Comentário do avaliador:

A anorexia é um sintoma comum entre pacientes com câncer avançado, podendo ser identificada em até 80% dos casos, especialmente naqueles afetados por neoplasias do trato gastrointestinal superior e pulmonar. Além da sintomatologia relacionada à doença subjacente, o impacto do tratamento oncológico também deve ser considerado. Quimioterapia e agentes orais como inibidores de tirosina-quinase e inibidores de PARP estão, todos, associados a diferentes graus de anorexia.

Atualmente, não há evidências robustas para a recomendação de terapias farmacológicas no manejo da anorexia. Agentes canabinóides, agonistas de grelina, corticosteróides e progestinas são opções; porém, estão associados a dificuldade de acesso, efeitos colaterais significativos ou benefícios temporários.

Dados publicados em 2023, incluindo pacientes com câncer gástrico, hepatobiliar e pulmonar, demonstraram que o uso de olanzapina em baixa dose (2,5 mg) foi associada a ganho de peso e melhora do apetite. Esses dados resultaram em uma atualização pontual nas diretrizes da ASCO em 2023, recomendando olanzapina em baixa dose como um estimulador de apetite e ganho de peso.

O estudo sobre o papel da mirtazapina é o primeiro a avaliar uma intervenção farmacológica nutricional na ingestão calórica incluindo apenas pacientes com CPCNP. Os resultados demonstraram que o uso de mirtazapina pode contribuir para o manejo desse grupo específico de pacientes, potencialmente melhorando a qualidade de vida relacionada aos cuidados de saúde.

 

Citação: Arrieta O, Cárdenas-Fernández D, Rodriguez-Mayoral O, et al.
Mirtazapine as Appetite Stimulant in Patients with Non–Small Cell Lung Cancer and Anorexia: A Randomized Clinical Trial. JAMA Oncol. Published online
January 11, 2024. doi:10.1001/jamaoncol.2023.5232

 

Avaliador Científico:

Dr. Marcus Leonardi Teixeira

Residência Médica em Oncologia Clínica pelo Hospital de Clínicas de Porto Alegre- UFRGS

Médico Oncologista no Grupo Oncoclínicas Salvador – Bahia.