SBOC REVIEW
Atezolizumabe adjuvante versus placebo para pacientes com carcinoma de células renais com risco aumentado de recorrência após ressecção (IMmotion010): um estudo de fase 3, multicêntrico, randomizado e duplo-cego
Resumo do artigo:
O padrão de tratamento para o carcinoma de células renais locorregional é a nefrectomia. Entretanto, a taxa de recorrência de doença em 5 anos é cerca de 68% para os pacientes de alto risco e a maior parte das recorrências ocorrem com doença à distância. O benefício do tratamento adjuvante afim de reduzir esse risco permanece incerto, a despeito de diferentes estudos nesse cenário.
Dos estudos que avaliaram o papel do tratamento adjuvante com inibidores de tirosina quinase (TKIs) do receptor do VEGF (VEGFR), somente o estudo STRAC demonstrou ganho de sobrevida livre de recorrência com sunitinibe adjuvante comparado a placebo. Entretanto, o perfil de toxicidade comparado a magnitude do ganho, bem como a ausência de benefício em sobrevida global, não levaram à adesão frequente desse tratamento.
O papel da imunoterapia adjuvante foi avaliado no estudo KEYNOTE 564, no qual o benefício em sobrevida livre de recorrência de pembrolizumabe (anti-PD-1) comparado com placebo levou à aprovação desse tratamento na população de risco alto. Com objetivo semelhante, o estudo IMmotion010 testou a hipótese de que atezolizumabe adjuvante (anti-PD-L1) por um ano quando comparado a placebo retardaria a recorrência em pacientes de alto risco.
IMmotion010 é um estudo de fase 3, multicêntrico, randomizado e duplo-cego, realizado em 215 centros em 28 países. Foram incluídos pacientes com carcinoma de células renais com componente histológico de células claras ou sarcomatoides, com alto risco de recorrência após a nefrectomia. O risco aumentado foi caracterizado por T2 (Fuhrman 4), T3a (Fuhrman 3-4), T3b/c, T4 ou N+ (independente do Fuhrman). Foram incluídos também pacientes sem evidência de doença após serem submetidos à metastasectomia.
Os participantes foram designados (1:1) para receber atezolizumabe adjuvante ou placebo. O desfecho primário foi sobrevida livre de doença (SLD) avaliada pelo investigador na população com intenção de tratar (ITT). Os desfechos secundários incluíram sobrevida global, SLD avaliada por revisão independente na população ITT, além de SLD em pacientes com expressão de PD-L1 >= 1%.
De 3 de janeiro de 2017 a 15 de fevereiro de 2019, 778 pacientes foram randomizados. A duração média de acompanhamento foi de 44,7 meses para a população ITT. A mediana de SLD avaliada pelo investigador foi de 57,2 meses (IC 95% 44,6 a não estimável) no grupo atezolizumabe e 49,5 meses (IC 95% 47,4 a não estimável) no grupo placebo (HR 0,93, 95% CI 0,75–1,15; p=0,50). Também não houve diferença em SLD no subgrupo de pacientes com expressão de PD-L1 >= 1%. Os dados de sobrevida global (SG) ainda eram imaturos, sendo a taxa de SG em 3 anos de 90,3% (IC 95% 87,3–93,3) no grupo atezolizumabe e 89,8% (IC 95% 86,6–92,9) no grupo placebo (HR 0,97, IC 95% 0,67–1,42).
Os eventos adversos relacionados ao tratamento mais comuns no grupo de atezolizumabe foram fadiga (20%), prurido (14%), hipotireoidismo (13%) e diarreia (12%). Eventos adversos de grau 3-4 relacionados ao tratamento ocorreram em 14% dos pacientes que receberam atezolizumabe, sendo os mais comuns hipertensão (2%), hiperglicemia (3%) e diarreia (1%).
Em conclusão, os resultados do IMmotio010 falharam em demonstrar ganho de sobrevida livre de doença com atezolizumabe adjuvante quando comparado a placebo após nefrectomia.
Pal, Sumanta Kumar et al. Adjuvant atezolizumab versus placebo for patients with renal cell carcinoma at increased risk of recurrence following resection (IMmotion010): a multicentre, randomised, double-blind, phase 3 trial. The Lancet, Volume 400, Issue 10358, 1103 – 1116.
Atezolizumabe adjuvante versus placebo para pacientes com carcinoma de células renais com risco aumentado de recorrência após ressecção (IMmotion010): um estudo de fase 3, multicêntrico, randomizado e duplo-cego.
Comentário da avaliadora científica:
A despeito do benefício comprovado em sobrevida livre de doença de pembrolizumabe adjuvante no KEYNOTE 564, dados do IMmotion010 apontam na direção contrária, bem como os dados negativos de outros dois estudos com imunoterapia no cenário perioperatório apresentados na ESMO 2022 (CheckMate 914 e PROSPER).
Uma hipótese para a divergência nos resultados é que o anti-PD-L1 (atezolizumabe) possa ter menor benefício do que o anti-PD1 (pembrolizumabe) neste cenário. Diferenças na proporção de pacientes com doença avançada, bem como no tempo de tratamento e dose-intensidade das medicações, também podem ter contribuído para os resultados negativos nos demais estudos.
Se por um lado uma parte dos pacientes estarão curados com a nefrectomia e a imunoterapia não é isenta de eventos adversos (algumas vezes graves e irreversíveis), por outro lado, não se deve ignorar os resultados positivos do KEYNOTE 564, sobretudo nos pacientes com critérios de mais alto risco de recorrência. Portanto, é necessário manter os esforços para identificar quais pacientes realmente se beneficiam do tratamento adjuvante. Estudos avaliando o papel de biomarcadores, a pesquisa de DNA circulante tumoral, o perfilamento genético e molecular tumoral, bem como a associação de imunoterapia a outros fármacos, poderão contribuir para preencher essa lacuna.
Por fim, até o momento, os dados de imunoterapia adjuvante no câncer renal são controversos e devem ser discutidos individualmente com os pacientes, considerando os riscos e benefícios em cada caso.
Avaliadora científica:
Dra. Louise Moreno
Residência Médica em Oncologia Clínica no Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein (HIAE)
Título de Especialista em Oncologia Clínica pela SBOC/AMB
Oncologista no Centro de Oncologia do HIAE
Observership em Uro-Oncologia no City of Hope Comprehensive Cancer Center – Califórnia