SBOC REVIEW
Atezolizumabe e quimioterapia para câncer endometrial avançado ou recorrente (AtTEnd): um estudo randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, de fase 3
Resumo do artigo:
O câncer de endométrio é o segundo câncer ginecológico mais comum em mulheres e sua incidência e mortalidade se associam à obesidade e à idade avançada. O tratamento do câncer de endométrio com inibidores do checkpoint imunológico (ICI) já demonstrou benefício em tumores avançados com alta carga mutacional tumoral e naqueles com deficiência de enzimas reparo do DNA (dMMR) ou instabilidade de microssatélites. O inibidor de PD-L1 atezolizumabe estabeleceu ganho de sobrevida substancial quando combinado com quimioterapia nos cenários de câncer de mama triplo negativo e câncer de pulmão, mas seu papel no câncer endometrial ainda é desconhecido.
O estudo AtTEnd foi um estudo multicêntrico, duplo-cego, randomizado, controlado por placebo, de fase 3, feito em 89 hospitais de 11 países. Recrutou pacientes com carcinoma endometrial avançado ou recorrente, ou carcinossarcoma, com bom status-performance e que não receberam quimioterapia sistêmica anteriormente no cenário de recorrência. Os pacientes foram randomizados (2:1) para receberem atezolizumabe 1200 mg ou placebo, associado à quimioterapia (carboplatina AUC 5 ou 6 e paclitaxel 175 mg/m²), a cada 21 dias, por 6–8 ciclos. Atezolizumabe ou placebo foram mantidos até a progressão. Os fatores de estratificação foram países, subtipo histológico, status avançado ou recorrente e status dMMR ou pMMR. Os desfechos coprimários testados hierarquicamente foram sobrevida livre de progressão (em pacientes com dMMR e na população geral) e sobrevida geral (na população geral).
Os resultados publicados englobam a análise primária de dados de sobrevida livre de progressão e sobrevida global interina. Entre 2018 e 2022, 551 pacientes foram randomizados para atezolizumabe (n=362) ou placebo (n=189). O acompanhamento mediano foi de 28,3 meses. 81 (23%) pacientes no grupo atezolizumabe e 44 (23%) pacientes no grupo placebo tiveram doença dMMR por avaliação central.
Na população dMMR, a sobrevida livre de progressão (SLP) mediana não foi estimável (IC 95%, 12,4 meses–não estimável [NE]) no grupo atezolizumabe e 6,9 meses (IC 95%, 6,3–10,1) no grupo placebo (razão de risco [HR] 0,36; IC 95%, 0,23–0,57; p=0,0005). Na população geral, a SLP mediana foi de 10,1 meses (IC 95%, 9,5–12,3) no grupo atezolizumabe e 8,9 meses (IC 95%, 8,1–9,6) no grupo placebo (HR 0,74; IC 95%, 0,61–0,91; p=0,022). A sobrevida global (SG) mediana foi de 38,7 meses (IC 95%, 30,6–NE) no grupo atezolizumabe e 30,2 meses (IC 95%, 25,0–37,2) no grupo placebo (HR 0,82; IC 95%, 0,63–1,07; p=0,048).
Os eventos adversos de grau 3–4 mais comuns foram neutropenia (97 [27%] de 356 pacientes no grupo atezolizumabe vs 51 [28%] de 185 no grupo placebo) e anemia (49 [14%] vs 24 [13%]). Eventos adversos graves relacionados ao tratamento ocorreram em 46 (13%) pacientes no grupo atezolizumabe e seis (3%) pacientes no grupo placebo.
Comentário do avaliador científico:
O estudo AtTEnd mostrou que o atezolizumabe em combinação com quimioterapia de primeira linha padrão melhorou significativamente a SLP em pacientes com carcinoma endometrial avançado ou recorrente, tanto na população com dMMR quanto na população geral. Entretanto, o ganho da SLP do atezolizumabe na população geral foi impulsionado pelo efeito na população dMMR, o qual obteve um benefício claro do imunoterápico também em: duração da resposta, segunda SLP e sobrevida global (positiva no subgrupo com dMMR).
Tais resultados são consistentes com as descobertas dos estudos RUBY e NRG-GY018, os quais avaliaram inibidores de PD-1 combinados com quimioterapia no mesmo cenário de doença, além do estudo DUO-E, avaliando um inibidor de PD-L1 combinado com quimioterapia, com ou sem olaparibe. No entanto, o benefício de sobrevida livre de progressão observado no subgrupo de pacientes com tumores pMMR nesses ensaios anteriores não foi replicado no AtTEnd.
Quando o estudo AtTEnd foi projetado, o tratamento com carboplatina-paclitaxel era o tratamento padrão de primeira linha. Atualmente, diretrizes baseadas em evidências para tratamento do câncer endometrial avançado recomendam considerar perfis mutacionais, características histopatológicas, indicadores prognósticos e fatores de risco para orientar a seleção de tratamento cada vez mais personalizada.
Já temos vários ensaios randomizados de fase 3 que combinaram ICI com carboplatina-paclitaxel: dostarlimabe no RUBY; pembrolizumabe no NRG-GY018; durvalumabe no DUO-E. Agora, o atezolizumabe se soma como outra opção de combinação à quimioterapia que aumentou a SLP em pacientes com carcinoma endometrial avançado ou recorrente, particularmente naqueles com carcinomas dMMR.
O papel da imunoterapia em carcinomas endometriais em pacientes com pMMR permanece controverso.
Citação:
Colombo N, Biagioli E, Barretina Ginesta MP, et al; and AtTEnd study group. Atezolizumab and chemotherapy for advanced or recurrent endometrial cancer (AtTEnd): a randomised, double-blind, placebo-controlled, phase 3 trial. Lancet Oncol. 2024 Sep;25(9):1135-1146. doi: 10.1016/S1470-2045(24)00334-6.
Avaliador científico:
Dr. Pedro Victor de Souza Nogueira
Oncologista Clínico na Oncologia DASA-Natal/RN
Editor SBOC-Review
Oncologista Clínico pela USP-SP
Instagram: @pedrovictor.nogueira
Cidade de atuação: Natal/RN