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SBOC REVIEW

Cardiotoxicidade secundária aos inibidores de checkpoint imunológico: uma revisão sistemática e meta-análise de ensaios clínicos randomizados

Resumo do artigo:

Atualmente, pelo ganho em desfechos de sobrevida, os inibidores de checkpoint imunológicos (ICI) são indispensáveis no arsenal terapêutico contra muitos tumores sólidos. Apesar de bem tolerados, ICI podem suscitar eventos adversos cardíacos (EAc) potencialmente fatais. Estudar a incidência destes EAc e compará-la com outros tratamentos se faz premente.

Dra. Agostinetto e colegas conduziram esta revisão sistemática e meta-análise seguindo a diretriz “Preferred Reporting Items for sistematic Reviews and Meta-Analyses” (PRISMA). Busca sistemática de ensaios clínicos randomizados incluindo tumores sólidos tratados com ICI vs outras terapias e duplo-bloqueio de checkpoint imune (ICI-ICI) vs um ICI foi realizada no PubMed, MEDLINE, base EMBASE, e conferências médicas até 30 de Junho de 2020. Os objetivos primário e secundário foram, respectivamente: avaliar o risco de EAc com ICI comparado à outras terapias e com ICI-ICI versus um ICI.

Foram calculados razão de risco combinados (RR) com intervalo de confiança (IC) de 95% para eventos de cardiotoxicidade usando modelos de efeito aleatório. Conduziu-se duas meta-análises separadas para satisfazer os objetivos. A análise incluiu 80 estudos com 35337 pacientes, dos quais 66 estudos com 34664 pacientes atendiam o objetivo primário, e 14 estudos com 673 pacientes atendiam o secundário.

Não houve aumento estatisticamente significativo do RR para a incidência de EAc entre ICI vs não-ICI, assim como ICI-ICI vs. um ICI. Em geral, qualquer EAc ocorreu em até 4% dos pacientes e miocardite ocorreu em até 0,2%. A incidência combinada de qualquer EAc foi 3,8% no grupo ICI vs 3,4% no grupo não-ICI (RR 1,14; IC 95% 0,88-1,48). A incidência de arritmias foi 1,79% e 1,49% com ICI e não-ICI, respectivamente (RR 1,32; IC 95% 0,94-1,84). A incidência de outras cardiotoxicidades foi <1%, com RR também não-significante, incluindo miocardite (0,12% vs 0,01%; RR 1,14), insuficiência cardíaca (0,43% vs 0,63%; RR 0,61), doença valvar (0% vs 0,03%; RR 0,63), parada cardíaca (0,24% vs 0,09%; RR 1,23), e morte cardíaca (0,33% vs 0,21%; RR 1,07).

Quando comparados EAc em ICI-ICI vs um ICI, a incidência combinada de qualquer EA cardíaco foi 2,87% vs 0,40%, respectivamente (RR 1,91; IC 95% 0,52-7,01). Arritmias tiveram a maior incidência observada: 2,48% com ICI-ICI vs 0% com um ICI (RR 1,65; IC 95% 0,40-6,89). A incidência das outras cardiotoxicidades foram <1%: miocardite (0,17% vs 0%; RR 1,1), infarto do miocárdio (0,5% vs 0%; RR 0,98), pericardite (0% vs 0,49%; RR 0,67), insuficiência cardíaca (0,38% vs 0%; RR 1,04), doença valvar (0% vs 0%), parada cardíaca (0% vs 0%), e morte cardíaca (0,27% vs 0%; RR 1,28).

Tais achados se mantiveram constantes nas análises de subgrupo de acordo com o tipo de tumor, cenário de doençaa, linha de tratamento, e tipo de tratamento combinado.

Atualmente, esta é a maior meta-análise avaliando a cardiotoxicidade induzida por ICI, investigando não somente miocardite, um EAc reconhecido pela etiologia potencialmente imuno-induzida, mas também uma gama abrangente de outros EAs. Entretanto, os autores especificam que nem todos os ensaios clínicos incluídos nas meta-análises relataram dados EAc. Muitos estudos detalharam apenas EA ocorrendo acima de um gatilho de incidência pré-determinado, que pode ter variado entre 1% a 20%. Dessa maneira, a incidência real de EAc pode ter sido subestimada, e uma melhor padronização do relato de EA pelos ensaios clínicos deve ser priorizada.

 

Agostinetto E, Eiger D, Lambertini M, Ceppi M, Bruzzone M, Pondé N, Plummer C, Awada AH, Santoro A, Piccart-Gebhart M, de Azambuja E. Cardiotoxicity of immune checkpoint inhibitors: A systematic review and meta-analysis of randomised clinical trials. Eur J Cancer. 2021 Mar 16;148:76-91. doi: 10.1016/j.ejca.2021.01.043. Epub ahead of print. PMID: 33740500.
Cardiotoxicidade secundária aos inibidores de checkpoint imunológico: uma revisão sistemática e meta-análise de ensaios clinicos randomizados.

 

Comentário do avaliador científico:

Diante do uso crescente na prática clínica e novas aprovações dos ICI no tratamento oncológico, esta meta-análise traz questões relevantes: (1) ICI induzem mais EAc do que outros tratamentos oncológicos, e (2) ICI-ICI é mais cardiotóxico do que um ICI? Metodologicamente correto, este estudo não mostrou aumento do risco de EAc e miocardite com ICI. Ademais, as incidências combinadas dos EAc foram baixas, o que aponta ICI como medicamentos seguros do ponto de vista cardiovascular, mesmo em combinação. Os autores sinalizam que pode haver sub-relato de EAc nas publicações incluídas, o que poderia subestimar os resultados. Vale ressaltar ainda que uma meta-análise de dados individuais pode levar à identificação de eventuais fatores de risco para cardiotoxicidade com ICI e, consequentemente, permitir melhor seleção dos candidatos à terapia. Um estudo de caso-controle (Mahmood et al., J Am Coll Cardiol 2018) e uma análise retrospectiva (Johnson et al., N Engl J Med 2016) sugerem que ICI-ICI aumenta o risco e a severidade de miocardite em relação à monoterapia, sendo dado conflitante que merece investigação complementar. Nesse ínterim, suspeição clínica alta e aderência às diretrizes de manejo de EA imuno-induzidos são a melhor forma de mitigar os efeitos detrimentais da cardiotoxicidade dos tratamentos oncológicos.

 

Avaliador científico:

Dr. Daniel Eiger
Oncologista clínico pelo Hospital Israelita Albert Einstein
ESMO fellow em pesquisa clínica pelo Instituto Jules Bordet