Instalar App SBOC


  • Toque em
  • Selecione Instalar aplicativo ou Adicionar a lista de início

SBOC REVIEW

Dados populacionais da incidência e mortalidade do câncer de colo de útero no Brasil: Focando nas Disparidades da População Negra e Indígena

Resumo do artigo:

O câncer de colo de útero (CCU) é reconhecidamente o câncer mais incidente em 23 países do mundo, e é a principal causa de morte por câncer em 36 países. Além disso, aproximadamente 90% dos novos casos e as mortes em 2020 ocorreram em países subdesenvolvidos. Notavelmente, os números epidemiológicos regionais no Brasil são discrepantes, destacando-se a maior taxa de mortalidade por 100.000 mulheres no Amazonas (24,13) e a menor em São Paulo (10,56).

Em países de alta renda, iniciativas eficazes permitem que a população-alvo seja vacinada contra o HPV em idade adequada e que mulheres sejam adequadamente rastreadas, o que permite a identificação de lesões pré-neoplásicas facilmente tratáveis com impacto positivo em sobrevida. Na realidade contrária de países de baixa renda, há acesso limitado a estas medidas preventivas e o CCU é muitas vezes diagnosticado tardiamente; como no Brasil, onde cerca de 60% dos pacientes apresentam o diagnóstico de CCU em estadiamento mais avançado. Países em desenvolvimento também enfrentam dificuldades de acesso ao tratamento padrão.

O presente estudo teve como objetivo explorar as tendências nas taxas de incidência e mortalidade por CCU de acordo com a raça/cor da pele no Brasil, com foco na gravidade da disparidade racial. Os dados nacionais dos Registros de Câncer de Base Populacional (RCBPs) foram analisados quanto às tendências de incidência entre 2010 e 2015. Para a mortalidade, os dados do Sistema Nacional de Informações sobre Mortalidade foram recuperados para o período de 2000 e 2020. Uma autodeclaração sobre raça/pele a cor foi coletada seguindo a classificação proposta pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) — branco, preto, pardo, amarelo ou indígena. Para a análise, negros e pardos foram agrupados como pretos.

Entre 2010 e 2015, foram registrados 10.844 casos novos de CCU nos RCBPs participantes, sendo os casos distribuídos entre mulheres brancas (49,6%), negras (48,0%) e de outra raça/cor (2,3%). Em comparação com as contrapartes brancas, as mulheres negras tiveram um risco 44% maior de incidência de CCU.

Quanto à mortalidade, entre 2000 e 2020, ocorreram 108.590 óbitos por CCU em todo o país. As médias das taxas de mortalidade ajustadas por idade segundo raça/cor da pele foram de 3,7/100.000 para brancas, 4,2/100.000 para negras, 2,8/100.000 para amarelas e 6,7/100.000 para indígenas. Tomando como referência as taxas de mortalidade em mulheres brancas, houve aumento de 27% no risco de morte em mulheres negras (RR = 1,27) e de 82% em mulheres indígenas (RR = 1,82).

 

 

de Melo AC, da Silva JL, Dos Santos ALS, Thuler LCS. Population-Based Trends in Cervical Cancer Incidence and Mortality in Brazil: Focusing on Black and Indigenous Population Disparities. J Racial Ethn Health Disparities. 2023 Jan 17. doi: 10.1007/s40615-023-01516-6.
Dados populacionais da incidência e mortalidade do câncer de colo de útero no Brasil: Focando nas Disparidades da População Negra e Indígena.

 

Comentário do avaliador científico:

Fortemente correlacionados com piores indicadores de desenvolvimento socioeconômico, os altos números de incidência e mortalidade por CCU no Brasil mostrados neste estudo expõem graves deficiências crônicas no sistema nacional de saúde da mulher.

Em relação às disparidades raciais, os dados também sugerem um maior impacto negativo do CCU quanto às altas taxas de incidência e mortalidade em mulheres não brancas, incluindo principalmente mulheres negras e, mais dramaticamente, mulheres indígenas. Essas diferenças podem estar relacionadas a fatores históricos baseados no racismo estrutural que mantêm barreiras ao acesso ao diagnóstico precoce e ao tratamento adequado. É decepcionante concluir que as mulheres brasileiras, especialmente as indígenas, continuam morrendo de um câncer potencialmente evitável.

Estudos com dados detalhados em nível individual para descrever fatores subjacentes aos padrões raciais ainda estão pendentes. Para atingir as metas da Organização Mundial da Saúde (OMS) da estratégia global para a eliminação do CCU até 2030, o Brasil precisará melhorar muito as campanhas de vacinação, triagem e tratamento precoce do CCU.

 

Avaliador científico:

Dr. Jessé Lopes da Silva
Pesquisador no Instituto Nacional de Câncer
Oncologista Clínico da Força Aérea Brasileira e do Grupo Oncoclínicas