SBOC REVIEW
Deficiência de POLE ou POLD1 emerge como mais novo alvo agnóstico para imuno-checkpoint
Resumo:
O uso de inibidores de pontos de checagem imunológicos (ICI) é considerado terapia padrão ouro em pacientes com câncer colorretal metastáticos (CCRm) que apresentam deficiência de proteínas mismatch repair (dMMR), o que resulta em instabilidade de microssatélites (MSI-H). Esse achado correlaciona-se com alta carga mutacional tumoral (TMB), um fator preditivo de resposta aos ICIs. No entanto, existe um subgrupo de CCRm “ultramutados” (> 100mut/Mb) nos quais não se encontra a deficiência de mismatch repair, ou seja, são MMR proficientes (pMMR). Tal genótipo tem sido relacionado com a presença de mutações nas polimerases épsilon (POLE) ou delta (POLD1), as quais também levam às suas ineficiências como proteínas (dPOLE/POD1) de reparo do DNA e, consequente, ao acúmulo de mutações específicas. Mutações de POLE/D1 foram descritas principalmente em cânceres de endométrio (5-10%) e CCR (2-4%) para todos estágios; já para CCRm, em menos de 1%. dPOLE/POD1 tem sido relacionada inicialmente em dMMR/MSI-H, mas sua frequência em CCRm MMR proficientes ainda é pouco descrita. Estudos têm demonstrado importante atividade de agentes anti-PD-1 em tumores sólidos deficientes de POLE ou POLD1 e nenhuma resposta em POLE/D1 proficientes. Especificamente em pacientes com câncer colorretal metastático esses dados são incertos. Dessa forma, foi conduzido esse estudo multicêntrico em que se coletou dados de pacientes com CCRm tratados com ICIs (anti-PD-L1 isolados ou em associação com anti-CTLA-4). Em seguida, esses casos foram relacionados com achados genômicos de POLE/D1 e MMR/MSI-H de acordo com a presença de deficiência de POLE/D1 (dPOLE/D1) e mismatch repair proficientes (pMMR).
Foram analisadas taxa de resposta, sobrevida livre de progressão (PFS) e de sobrevida global (OS), entre 27 pacientes com CCRm e dPOLE/D1 e 610 pacientes com CCRm e dMMR/MSI-H; todos tratados com ICIs. Após um seguimento de 24,9 meses, a taxa de resposta total entre casos de dPOLE/D1 foi 89% (100% em pacientes que receberam combinação de anti-CTLA-4 e anti-PD-L1 e de 75% naqueles que usaram anti-PD-L1 de forma isolada) contra 54% nos pacientes com CCRm e dMMR/MSI-H (IC 95%, 1,5 – 14,1; p=0,01). Já a taxa de controle de doença chegou a 92% versus 77% (IC 95%, 0,8 – 17,3; p=0,18). A PFS e OS em 2 anos foi de 88% contra 60% (HR = 0,24; IC de 95%, 0,08 – 0,74; p=0,01) e de 86% contra 72% (HR = 0,38; IC de 95%, 0,12 – 1,18; p = 0,09) respectivamente.
TMB foi avaliada em 27 pacientes com dPOLE/D1 e em 108 pacientes com dMMR/MSI-H e foi significativamente maior entre os com CCRm dPOLE/D1 que nos dMMR/MSI-H, com valor médio de 160,8 mut/Mb (119,3-258,1 mut/Mb) versus 48,5 mut/Mb (35,0 – 63,6 mut/Mb) (p < 0,001) respectivamente. dPOLE/D1 foi associado à idade mais jovem (média de 47 anos), sexo masculino, e menos mutações RAS/BRAF. dPOLE foi encontrada ao longo de todo trato colorretal, com predominância nos casos de adenocarcinoma de reto e de junção retossigmóide, já os casos de dPOLD1 foram os cânceres de cólon direito.
Comentário:
Devido à significativa resposta dos tumores CCRm dMMR/MSI-H tratados com imunoterapia, a busca por outros biomarcadores preditores tem sido cada vez mais intensificada. Avanços no entendimento molecular do câncer permitiram a descoberta de um subtipo raro de câncer que apresenta deficiência de outras proteínas de reparo: POLE e POLD1. O estudo em questão mostra importantes taxas de respostas e sobrevida entre pacientes com CCRm e deficiência de POLE/D1 tratados com ICIs (superando inclusive os resultados já expressivos em CCRm com dMMR/MSI-H) mesmo em pacientes politratados e/ou com CCRm pMMR/MMS (proficiente de MMR).
No entanto, é preciso entender melhor quais as mutações que realmente levam à deficiência dessas proteínas. Estudos têm demonstrado que são as mutações da POLE, no seu sítio de ligação no domínio da exonuclease do DNA, que levam a essas altas cargas mutacionais. Apesar das limitações desses estudos e da baixa incidência das deficiências de proteínas de reparo POLE/D1, os resultados preditivos do tratamento com ICI são muito expressivos e não podemos ignorá-los. Na dependência de mais estudos, provavelmente teremos mais um alvo de terapia agnóstica.
Citação:
M. Ambrosini, B. Rousseau, P. Manca, et al. Immune checkpoint inhibitors for POLE or POLD1 proofreading-deficient metastatic colorectal câncer. Ann Oncol. 2024 Jul;35(7):643-655. doi: 10.1016/j.annonc.2024.03.009
Avaliador científico:
Dr. Andre Moreno
Professor do curso de medicina na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS)
Oncologista Clínico pela Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre – Porto Alegre/RS
Membro da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) e do Grupo Brasileiro de Oncologia Torácica (GBOT)
Instagram: @drandremoreno
Cidade de atuação: Chapecó/SC