SBOC REVIEW

Divarasibe (GDC-6036) monoterapia em tumores sólidos com mutação em KRAS G12C
Resumo do artigo:
Mutações no oncogene KRAS representam a mutação guiadora mais frequente no câncer, sendo que a troca de glicina por cisteína na posição 12 leva a mutação KRAS G12C. Tal alteração é encontrada em 12-14% dos pacientes com câncer de pulmão de células não pequenas (CPCNP), 04% dos carcinomas colorretais (CCR) e 04% em outros tumores sólidos. O tratamento padrão é baseado em quimioterapia citotóxica, imunoterapia ou ambas, porém com benefícios modestos. Mais recentemente, foram desenvolvidos os inibidores de KRAS G12C, como sotorasibe e adagrasibe, que demonstraram atividade após progressão. No estudo em questão, foi avaliado o papel do divarasibe, visto dados in vitro mostrando maior potência e seletividade que os demais inibidores.
Trata-se de um estudo de fase I, aberto, multicêntrico, de escalonamento e expansão de dose, avaliando divarasibe em pacientes com tumores sólidos, avançados ou metastáticos, com mutação KRAS G12C. O desfecho primário era segurança da droga e os demais desfechos incluíam atividade antitumoral preliminar e biomarcadores de resposta e resistência. Foi avaliado ainda o status mutacional de TP53, STK11, KEAP1 e APC, por biópsia líquida (FoundationOne Liquid CDx).
Foram incluídos pacientes com 18 anos ou mais, com tumores sólidos, KRAS G12C mutado, após progressão ao menos uma terapia sistêmica padrão e que nunca haviam recebido inibidor de KRAS G12C. Divarasibe era administrado oral, uma vez ao dia, com doses de 50 a 400 mg, em ciclos de 21 dias, de maneira contínua, até progressão de doença, toxicidade limitante ou descontinuação do estudo.
Foram incluídos 137 pacientes (60 com CPNPC, 55 com CCR e 22 com outros tumores sólidos), com mediana de 2 linhas de tratamento sistêmico prévio.
Em relação à segurança, não houve evento dose-limitante e a dose de 400 mg foi selecionada para as coortes de expansão de dose. A maioria dos pacientes apresentou evento adverso relacionado ao tratamento G1 ou G2, sendo náuseas (74%), diarreia (61%) e vômitos (58%) os mais comuns. 15 pacientes (11%) apresentaram eventos adversos G3, em especial diarreia e elevação de transaminases. Foi reportado 1 evento adverso G4 secundário a uma reação anafilática. Eventos adversos sérios ocorreram em 42 pacientes (31%), resultando em modificação de dose de 23 pacientes (17%) e descontinuação do estudo em 4 pacientes (3%).
Dentre os pacientes com CPNPC e dose de 400 mg de divarasibe, resposta confirmada ocorreu em 56,4% (IC95% 39,6 – 72,2), com sobrevida livre de progressão (SLP) mediana de 13,7 meses (IC95% 8,1 – não estimada). Em relação aos pacientes com CCR recebendo a dose de 400 mg de divarasibe, resposta confirmada foi vista em 35,9% (IC95% 21,2 – 52,8), com SLP mediana de 6,9 meses (IC95% 5,3 – 9,1). Resposta foi observada entre os subgrupos, independente de PD-L1 ou presença de comutações, apesar do número pequeno em cada subgrupo. 22 pacientes com outros tumores sólidos receberam divarasibe 400 mg, sendo que 8 (36%) apresentaram resposta objetiva.
Os níveis de DNA livre circulante tumoral eram passíveis de avaliação em 70 pacientes, sendo que todos os pacientes com resposta parcial ao tratamento atingiram frequência alélica da variante menor ou igual a 1% no primeiro dia do terceiro ciclo (C3D1).
Por fim, este estudo demonstrou que divarasibe em monoterapia possui um perfil de segurança manejável e atividade antitumoral promissora em pacientes com CPNPC, CCR e outros tumores sólidos previamente tratados com mutação de KRAS G12C.
Comentário do avaliador científico:
Considerado por muito tempo uma alteração não acionável, o KRAS G12C passa por uma revolução frente a nova gama de inibidores disponíveis.
Sotorasibe e adagrasibe já demonstraram atividade em linhas posteriores, porém com benefício limitado e não isento de toxicidade. O divarasibe mostra nesse estudo de fase I resultados de posologia favorável, segurança da droga e atividade antitumoral promissora.
Com toda a limitação e ressalvas ao comparar estudos, os resultados numéricos parecem ser favoráveis ao divarasibe tanto no contexto de descontinuação da droga quanto em taxa de resposta objetiva. Naturalmente, tais dados devem ser interpretados com cautela visto tratar-se de um estudo de fase I e com resposta avaliada pelos próprios investigadores.
Além disso, a demonstração de redução da frequência alélica do KRAS G12C ao longo do tratamento com biópsia líquida seriada reforça o papel da terapia-alvo, enquanto a detecção de um amplo espectro de alterações genômicas em KRAS, via da MAPK e PI3K mostra a heterogeneidade dos mecanismos de resistência adquirida.
Como perspectivas, aguardaremos estudos randomizados futuros, além da combinação de divarasibe com outros agentes.
Citação: Sacher, A., et al. Single-Agent Divarasib (GDC-6036) in Solid Tumors with a KRAS G12C Mutation. N Engl J Med. 2023 Aug 24;389(8):710-721. doi: 10.1056/NEJMoa2303810.
Avaliador científico:
Dr. Breno Jeha Araújo
Residência médica em oncologia clínica no ICESP-HCFMUSP
Preceptor da residência médica em oncologia clínica do Hospital Sírio-Libânes