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SBOC REVIEW

Dostarlimabe para câncer de endométrio avançado ou recorrente

Citação: Mirza MR, Chase DM, Slomovitz BM, et al. Dostarlimab for Primary Advanced or Recurrent Endometrial Cancer. N Engl J Med. Published online March 27, 2023. doi: 10.1056/NEJMoa2216334

Resumo do artigo:
O câncer de endométrio é o 6º mais comum em mulheres no mundo e o tratamento padrão para doença avançada ou recorrente é quimioterapia (QT) baseada em platina desde os anos 2000. No entanto, a sobrevida mediana nesse cenário ainda é inferior a 3 anos.

Cerca de 30% dos cânceres de endométrio apresenta deficiência de reparo no DNA e aumento da expressão de receptores PD-1. Essas características associadas à alta carga mutacional fazem com que esses tumores sejam sensíveis a imunoterapia. Dorstalimabe é um anticorpo anti-PD-1 que já havia demonstrado atividade antitumoral em pacientes com deficiência de reparo no DNA e alta instabilidade microssatélite em estudo de fase 1 (GARNET) publicado em 2022. No estudo Ruby, de fase 3, o agente dorstalimabe foi avaliado na dose de 500 mg associado a QT com carboplatina AUC 5 e paclitaxel 175 mg/m2 a cada 3 semanas versus mesmo esquema de QT e placebo para pacientes com câncer de endométrio EC III não passíveis de cura, EC IV e aquelas com doença recorrente em que a QT adjuvante havia sido realizada há mais de 6 meses. Após 6 ciclos, era iniciada a manutenção com dorstalimabe 1000 mg a cada 6 semanas ou placebo até completar 3 anos, progressão de doença ou toxicidade limitante.

As pacientes estágio IIIA e IIIB necessitavam apresentar doença mensurável enquanto as IIIC1 participavam do estudo independente do volume de doença desde que fossem histologia carcinossarcoma, células claras, seroso ou mista. Já pacientes IIIC2 e IV eram randomizadas independente de doença mensurável ou histologia.

Os desfechos primários eram sobrevida livre de progressão (SLP) avaliada pelo investigador, nas pacientes com deficiência de reparo do DNA e na população geral, e sobrevida global na população geral.
Foram incluídas 494 pacientes, sendo que 118 delas apresentavam deficiência de reparo no DNA. Foram 245 pacientes no grupo experimental e 249 no placebo. Na população geral, 18,6% dos pacientes eram EC III, 33,6% eram EC IV e 47,8% apresentavam doença recorrente.

A maioria das pacientes apresentava carcinoma endometrioide (54,7%) com apenas 8,9% de carcinossarcoma e 20,6% de adenocarcinoma seroso.
Entre as pacientes com deficiência de reparo do DNA, o seguimento foi de 24,8 meses e a SLP foi 61,4% no braço do dorstalimabe e 15,7% no placebo, com redução do risco de progressão de 72% (HR 0,28, IC 95% 0,16 – 0,50, P<0,001).

Na população geral, o tempo de seguimento foi 25,4 meses e a SLP foi 36,1% no grupo experimental e 18,1% no placebo com redução do risco de progressão de 36% (HR 0,64, IC 95% 0,51 – 0,80, P<0,001).
Para o outro desfecho primário, a sobrevida global em 2 anos na população geral, observou-se taxa de 71,3% no grupo dorstalimabe e 56% no placebo com redução no risco de morte de 70% (HR 0,64, IC 95% 0,46 – 0,87, P=0,002 – valor não significante conforme os parâmetros pré-definidos do estudo). No subgrupo com deficiência de reparo do DNA, tais taxas foram 83,3% no grupo dorstalimabe e 58,7% no placebo, com redução no risco de morte de 70% (HR 0,30, IC 95% 0,13 – 0,70).

Entre as pacientes proficientes, a SLP também foi maior no braço experimental – em 2 anos, 28,4% versus 18,8% no placebo, com HR de 0,76 (IC 95% 0,59 – 0,98). A sobrevida global foi 67,7% no grupo do dorstalimabe versus 55,1%, com HR 0,73 (IC 95% 0,52 – 1,02).

Os eventos adversos mais comuns foram náusea, alopecia e fadiga em ambos os grupos. Rash maculopapular foi o evento que apresentou maior diferença de incidência, sendo 14,1% no grupo do dorstalimabe e 3,7% no placebo e foi o principal evento que levou a suspensão do dorstalimabe.

Por fim, este estudo demonstrou que a terapia com dorstalimabe associado a QT aumentou a SLP para pacientes com câncer de endométrio recém diagnosticado EC III com doença incurável, EC IV ou doença recorrente, com benefício substancial para a população com deficiência no reparo do DNA/ alta instabilidade microssatélite.

Comentário do avaliador científico:
Este estudo demonstrou que o agente anti-PD-1 dortalimabe em adição a quimioterapia apresenta eficácia em primeira-linha para o câncer de endométrio. Foram incluídos pacientes em estágio III não passíveis de tratamento curativo (18,6%), estágio IV recém diagnosticadas (33,6%) ou com doença recidivada (47,8%) desde que a última QT tenha sido ofertada há mais de 6 meses.

Todas as pacientes realizaram imuno-histoquímica para pesquisa de deficiência de reparo no DNA – alta instabilidade microssatélite. Deve-se destacar que a maior magnitude de benefício do dorstalimabe foi para esse grupo de pacientes, que compuseram cerca de 24% da amostra do estudo.

 Com relação a SLP, tanto na população instável quanto na população geral, o ganho foi significante, sendo que a redução do risco de progressão para as pacientes deficientes foi de 72% e na população geral, de 36%.
O benefício para SLP não parece ser consistente em todos os subgrupos do braço dorstalimabe. Dessa forma, um seguimento prolongado pode ser necessário para avaliar a eficácia do tratamento nas pacientes estágio III e no subgrupo de pacientes sem doença mensurável, principalmente em função da amostra limitada e do seguimento relativamente curto.

Na primeira análise interina na população geral, a sobrevida global foi maior no grupo do dorstalimabe, porém os resultados não alcançaram até o momento o nível de significância pré-estabelecido no estudo.
Como perspectivas, este estudo terá nova publicação futuramente com tempo de seguimento maior.

 Simultaneamente, foi publicado no NEJM outro estudo mostrando o benefício da adição de imunoterapia, no caso o pembrolizumabe, à quimioterapia de primeira-linha para o carcinoma de endométrio. Tal estudo será também comentado em separado nesta mesma edição do SBOC Review.

Avaliador científico:
Dra. Virgínia Altoé Sessa
Residência Médica em Oncologia Clínica pelo A.C.Camargo Cancer Center
Oncologista Clínica do Grupo Oncoclínicas e do Hospital Evangélico de Vila Velha – ES