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SBOC REVIEW

É possível trocar a sobrevida global por desfechos intermediários em estudos de câncer de próstata?

Resumo do artigo:

O câncer de próstata metastático é uma doença incurável e com mortalidade elevada. Por muitos anos o principal tratamento disponível para os tumores sensíveis a castração (CPSC) era a terapia hormonal (TH). Houve, porém, uma mudança de cenário após a publicação do estudo CHAARTED e do STAMPEDE (braço do docetaxel), demonstrando aumento de sobrevida global (SG) para os pacientes submetidos a TH com docetaxel, portadores de doença de alto volume. Apesar dos avanços, muitos pacientes ainda morrem com câncer de próstata, por isso a necessidade de pesquisas para desenvolvimento de novas terapias. Estes estudos carecem de desfechos primários confiáveis para modificação de conduta, porém demoram para atingir a mediana de SG, incorrendo em mais gastos e atrasos na liberação de novos tratamentos. O artigo é uma revisão sistemática e meta-analise com objetivo de validar desfechos clínicos intermediários (DCI) que possam equivaler a SG como indicador em futuros trabalhos.

Os indicadores intermediários analisados foram sobrevida livre de progressão clínica (SLPc) e sobrevida livre de progressão radiológica (SLPr). Após a aplicação dos critérios de revisão sistemática foram selecionados 9 artigos, comparando a aplicação de TH versus TH associado a docetaxel. O estudo utilizou um modelo de validação meta-analítica em duas etapas para avaliar o potencial de substituição entre os indicadores. O valor de R² definido como clinicamente relevante foi acima de 0,75.

Foi realizado uma análise estratificada dos dados de 6.390 pacientes com CPSC, inseridos entre junho de 1994 e julho de 2013. A idade mediana foi de 67 anos, 70% com ECOG 0 e 36% com alto volume de doença. A mediana encontrada de SG, SLPr e SLPc foi respectivamente 4,3 anos (IC 95% 4,2-4,5), 2,4 anos (IC 95% 2,3-2,5) e 2,3 anos (IC 95% 2,2-2,4).

Ao avaliar a força de associação entre as variáveis, obteve-se um coeficiente de correlação de Kendall de 0,83 (IC 95% 0,82-0,84) para SLPr e SG, e um valor de 0,85 (IC 95% 0,85-0,86) para SLPc e SG. O “surrogate threshold effect” (STE) obtido foi de 0,8 para SLPr e de 0,81 para SLPc.

Estes resultados demonstram uma forte associação entre a SG e os DCI avaliados, atingindo os valores previamente definidos na metodologia. A preferência do autor foi utilizar a SLPr por ser um critério mais objetivo. O possível impacto na substituição do desfecho primário é a redução do tempo para obtenção da mediana, de 4,3 anos de SG para 2,4 anos de SLPr. Quando considerado pacientes em uso de novos antiandrogênicos a expectativa de SG é maior, com reflexo no tempo para obtenção de resultados.

Concluindo os dois indicadores de SLPr e SLPc aparentam ser substitutos confiáveis para estudos fase III, com boa correlação com a SG em pacientes utilizando TH no braço controle.

 

Comentário do avaliador científico:

Devido a elevada incidência do câncer de próstata e número limitado de tratamentos, existe uma necessidade crescente no desenvolvimento de novas drogas. Neste contexto a implementação de desfechos substitutos para SG é importante. A SG é o dado padrão ouro, porém usualmente necessita de um longo período de acompanhamento e pode sofrer influência de linhas de tratamentos subsequentes. O uso dos DCIs reduz o tempo de aprovação das drogas, custo de pesquisas e agiliza o acesso as medicações.

O estudo possui pontos fortes em sua metodologia, um grande número de pacientes, analise individual e agrupada, bem como identificação de desfechos substitutos para artigos futuros. A utilização do STE como abordagem meta-analítica é interessante, pois fornece um parâmetro prático e objetivo, demonstrando que a SLPr e SLPc são substitutos eficazes da SG para o desfecho primário no cenário de CPSC com uso isolado de HT no braço controle.

Ainda não há dados suficientes para utilizar SLPr e SLPc como desfechos primários em estudos clínicos atuais devido ao uso de novas drogas antiandrogênicas, carecendo de informações mais atualizadas e validação em estudos de “vida real”. Porém, os DCIs são uma estratégia promissora para otimizar tempo e recurso.

 

Citação: Halabi S, Roy A, Rydzewska L, Guo S, Godolphin P, Hussain M, Tangen C, Thompson I, Xie W, Carducci MA, Smith MR, Morris MJ, Gravis G, Dearnaley DP, Verhagen P, Goto T, James N, Buyse ME, Tierney JF, Sweeney C; STOPCAP/ICECaP Collaboration. Radiographic Progression-Free Survival and Clinical Progression-Free Survival as Potential Surrogates for Overall Survival in Men With Metastatic Hormone-Sensitive Prostate Cancer. J Clin Oncol. 2024 Jan 5:JCO2301535. doi: 10.1200/JCO.23.01535. Epub ahead of print. PMID: 38181323.

 

Avaliador científico:

Dr. Bruno Corrêa Lordêlo

Oncologista Clínico pelo Hospital de Câncer de Barretos-SP

Médico oncologista no Hospital Santa Izabel (Santa Casa da Bahia) e Núcleo de Oncologia da Bahia (Grupo Oncoclínicas)-BA