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SBOC REVIEW

Efeito de uma intervenção antirracismo na disparidade racial no tempo de cirurgia para câncer de pulmão

Resumo do artigo:

A desigualdade racial na assistência ao câncer de pulmão é bem documentada. Caracterizada principalmente pelo atraso na cirurgia, maior que 8 semanas do diagnóstico, que pode contribuir, sobremaneira, para uma pior sobrevida nos pacientes negros.

O tempo de cirurgia no câncer de pulmão é um indicador de boa qualidade à assistência ao câncer, e impacta diretamente na sobrevida de pacientes diagnosticados com câncer de pulmão de células não pequenas (CPCNP) em estádios mais precoces.

Historicamente, pacientes negros levam mais tempo para serem abordados cirurgicamente que pacientes brancos, e, consequentemente, têm menores taxas de sobrevida. Intervenções antirracistas têm mostrado benefício em reduzir disparidades raciais no tratamento do câncer de pulmão.

Com o objetivo de avaliar o impacto de tais intervenções no tempo de cirurgia para câncer de pulmão em pacientes negros, os autores conduziram uma análise secundária da Accountability for Cancer Care through Undoing Racism and Equity, uma iniciativa que pode ser encarada como Responsabilidade no Tratamento do Câncer Através de Medidas Antirracistas e Promoção da Equidade (ACCURE). O estudo prospectivo de ações antirracistas, realizado em 4 centros de assistência ao câncer, teve como objetivo avaliar o impacto de tais ações no tempo total até a cirurgia para câncer de pulmão, e as disparidades raciais implicadas nesse tempo.

A intervenção consistiu em 3 passos, sendo eles: (1) um sistema de alerta em tempo real para identificar etapas de cuidados não atendidas; (2) feedback raça-específico sobre as taxas de tratamento do câncer de pulmão e; (3) navegação do paciente. O desfecho primário consistiu na realização da cirurgia em até 8 semanas do diagnóstico. Através da regressão log-binomial, foi estimado o Risco Relativo (RR), levando-se em consideração um Intervalo de Confiança (IC) de 95%, e ajustado para fatores clínicos e demográficos.

Foram incluídos 2.363 pacientes com CPCNP, estádios clínicos (EC) I e II; sendo que 263 foram alocados no grupo intervenção; 1.798 compunham o grupo controle retrospectivo; e 302 o grupo controle prospectivo. No grupo da intervenção, 87,1% dos pacientes negros, e 85,4% dos pacientes brancos atingiram o desfecho primário, tendo sido operados em até 8 semanas do diagnóstico (p=0,13). Comparados com 58,7% dos pacientes negros, e 75% dos pacientes brancos no controle retrospectivo (p<0,01); e 64,9% dos pacientes negros e 73,2% dos pacientes brancos (p=0,29) no controle prospectivo.

Quando comparados, os pacientes negros do grupo intervenção tinham mais chance de serem operados a tempo (menos de 8 semanas), que os pacientes negros do grupo controle retrospectivo, RR 1,43; IC 95%, 1,26-1,64. Essa diferença também pôde ser vista entre os pacientes brancos do grupo intervenção em relação ao grupo controle retrospectivo, RR 1,10; IC 95%, 1,02 -1,18. Ou seja, a intervenção, ACCURE, está associada à redução global no tempo para cirurgia, e à redução da diferença de tempo para cirurgia entre negros e brancos.

 

 

Charlot, M; Stein, JN; Damone, E; et al. Effect of an Antiracism Intervention on Racial Disparities in Time to Lung Cancer Surgery. JCO Published online February 14, 2022: DOI https://doi. org/10.1200/JCO.21. 01745.
Efeito de uma intervenção antirracismo na disparidade racial no tempo de cirurgia para câncer de pulmão.

 

Comentário da avaliadora científica:

Acesso inadequado à atenção especializada, má coordenação do cuidado e má comunicação paciente-provedor levam a um pior desfecho em pacientes negros com câncer.

No câncer de pulmão estádio precoce, pacientes negros têm mais atraso no tratamento e maior mortalidade em relação a pacientes brancos.

A diferença de tratamento do câncer com base na raça é resultado do racismo sistêmico. Apesar de bem documentadas as disparidades raciais na assistência ao câncer de pulmão, poucas intervenções foram tomadas.

O ACCURE foi um dos primeiros estudos a abordar o racismo institucional e diminuir a lacuna de tratamento entre pacientes negros e brancos com CPCNP EC I e II.

Pacientes do grupo intervenção, em média, operaram quase 2 semanas antes dos pacientes do grupo controle. Considerando 8 semanas para melhores resultados de sobrevida, mais de 85% dos pacientes de ambos os grupos raciais receberam cirurgia a tempo, embora esse limiar não tenha sido alcançado em nenhum grupo racial nos controles.

Tais achados sugerem que a intervenção ACCURE pode ser uma ferramenta poderosa para, não apenas reduzir as disparidades raciais na assistência ao câncer de pulmão, mas também, para melhorar a sobrevida do câncer para todos os pacientes, negros e brancos.

 

Avaliadora científica:

Dra. Abna Vieira
Residência em Oncologia clínica pela Faculdade de Medicina do ABC
Membro do Race.ID FMUSP, grupo de pesquisa em saúde da população negra
Oncologista clínica do ICESP-FMUSP