SBOC REVIEW

Enzalutamida contínua após progressão no Câncer de Próstata Metastático Resistente à Castração tratado com Docetaxel (PRESIDE): um estudo internacional, randomizado, fase 3b
Resumo do artigo:
Atualmente diversas terapias estão aprovadas para tratamento do câncer de próstata metastático resistente à castração (CPRCm). No entanto, invariavelmente ocorre resistência, progressão da doença e óbito. A melhor sequência ou combinação de agentes para otimizar os resultados do tratamento tem sido avaliada em diversos estudos, tais como ACIS, PROpel, CONTACT-02, PEACE-III, IPATential150, entre outros.
A eficácia em redução do PSA e segurança da combinação enzalutamida (E) e docetaxel foi demonstrada em estudo de fase 1b com 18 pacientes (NCT 01565928). Em seguida, o estudo de fase 2 CHEIRON, de 246 participantes, indicou menores taxas de progressão de doença em 6 meses, porém às custas de toxicidade. Já a estratégia de manutenção de E pós progressão no CPRCm foi avaliada no protocolo PLATO, com associação de abiraterona, com resultado negativo.
O estudo de fase 3b PRESIDE (NCT02288247), avaliou a continuação da E após progressão a esta droga, em adição à docetaxel em pacientes com CPRCm sem uso prévio de quimioterapia e de outros bloqueadores androgênicos. O desfecho primário foi a sobrevida livre de progressão mediana (SLPm), a qual foi considerada da data da randomização até progressão radiológica, progressão clínica inequívoca ou óbito. O esquema do estudo ocorreu da seguinte forma:
Etapa 1 – Ensaio clínico aberto em que pacientes portadores de CPRCm com recente progressão ao bloqueio hormonal (ADT) receberam E 160 mg/dia VO por 12 semanas como 1ª linha. Na 13ª semana, após estadiamento com exames radiológicos convencionais e dosagem sérica de PSA, apenas aqueles que não apresentavam progressão de doença seguiam para a Etapa 2.
Etapa 2 – Ensaio clínico duplo-cego que incluiu o grupo de pacientes inicialmente responsivos à E e com subsequente progressão (posterior a avaliação da 13ª semana). Os dois braços do estudo recebiam docetaxel 75 mg/m² IV a cada 3 semanas por até 10 ciclos e prednisona 10 mg VO diário, sendo realizada randomização 1:1 para os braços E 160 mg/dia VO ou placebo. A SLPm foi calculada na população por intenção de tratar.
Dos 816 pacientes inicialmente recrutados, apenas 271 foram incluídos na Etapa 2. O estudo foi positivo para o desfecho primário, com SLPm de 9,5 meses no grupo intervenção (IC 95% 8,3 – 10,9) e 8,3 (IC 95% 6,3 – 8,7), no grupo placebo, com hazard ratio de 0,72 (IC 95% 0,53 – 0,96; p= 0,027). O benefício foi visto em todos os subgrupos, especialmente nos portadores de doença visceral e em partes moles, embora esta análise não tenha sido pré-planejada.
Os desfechos secundários também favoreceram a terapia de combinação, com melhor taxa de resposta global (32% versus 26%) e maior tempo para progressão do PSA (8,4 meses contra 6,2 meses). Toxicidade de qualquer grau ocorreu em 98% dos pacientes, apesar do perfil observado ser conhecido e esperado, sendo os mais frequentes astenia, neutropenia, fadiga, diarreia e anemia.
No entanto, eventos adversos graves ocorreram em 49% dos pacientes no braço E, e 39% no placebo, levando a descontinuação da droga em 9% e 5%, respectivamente. O evento grau 3 mais comum foi astenia (7% versus 4%) e grau 4, neutropenia (17% versus 21%). No total, ocorreram 20 óbitos – 13 no grupo intervenção e 7 no grupo placebo.
Em conclusão, o estudo PRESIDE atingiu seu objetivo primário, mostrando que continuidade da E em adição à docetaxel aumentou a SLPm em relação ao grupo controle, suportando a hipótese de que existam clones sensíveis à E, mesmo após progressão, e que esta estratégia pode ser eficaz para uma parcela de pacientes CPRCm. O benefício clínico, porém, deve ser balanceado frente a toxicidades, custos e outras opções terapêuticas.
Merseburger AS, Attard G, Åström L, et al. Continuous enzalutamide after progression of metastatic castration-resistant prostate cancer treated with docetaxel (PRESIDE): an international, randomised, phase 3b study. Lancet Oncol. Published online October 18, 2022. doi: 10.1016/S1470-2045(22)00560-5.
Enzalutamida contínua após progressão no Câncer de Próstata Metastático Resistente à Castração tratado com Docetaxel (PRESIDE): um estudo internacional, randomizado, fase 3b.
Comentário da avaliadora científica:
Desde 2014, início do PRESIDE, houve incorporação de novos agentes hormonais e quimioterapia em estágios mais precoces da doença, e hoje é mais rara na prática clínica a população avaliada no estudo. Há de se considerar o follow-up mediano curto, de 8,1 meses, não sendo reportados dados de sobrevida global (SG).
A SLPm de 9,5 meses observada no braço intervenção do estudo PRESIDE, se assemelha ao observado com outras estratégias no CPRCm, tais como: enzalutamida pós progressão a quimioterapia (estudo AFFIRM: SLPm 8,3 meses e SGm 18,4 meses), olaparibe pós progressão a enzalutamida ou abiraterona (estudo PROFOUND: SLPm 7,4 meses) e Lutécio-177-PSMA-617 pós progressão a hormonioterapia e quimioterapia com taxano (estudo VISION: SLPm 8,7meses e SGm 15,3 meses). No entanto, diferenças nas populações e nas formas de avaliação da SLP entre os estudos dificultam tal contextualização.
Por fim, o estudo PRESIDE confirma uma prova de conceito de bloqueio hormonal sustentado e levanta a hipótese de possível sinergismo entre E e docetaxel. Levando-se em conta as diferentes estratégias de tratamento possíveis, diferenças entre desenhos dos estudos, mecanismos de ação e interações biológicas precisam ser consideradas para refinar as estratégias de sequenciamento e combinações em CPRCm.
Avaliadora científica:
Dra. Clarissa Cavalin Silva
Residência Médica em Oncologia Clínica pela D’or, RJ
Fellow de Oncologia Geniturinária no Instituto Oncoclínicas
Especialização em Oncogeriatria pelo Hospital Sírio-Libanês – SP
Pós-graduação lato sensu em Cuidados Paliativos – Instituto Albert Einstein de Ensino e Pesquisa – RJ