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SBOC REVIEW

Especial ASCO 2023 – Tumores do SNC

INDIGO: Um estudo global, randomizado, duplo cego e de fase III, de vorasidenibe versus placebo em pacientes com glioma grau 2 residual ou recorrente com mutação de IDH 1/2

Mellinghoff IK et al. INDIGO: A global, randomized, double-blind, phase III study of vorasidenib versus placebo in patients with residual or recurrent grade 2 glioma with an IDH1/2 mutation. J Clin Oncol v.41, 2023 (suppl 17; abstr LBA1)

O estudo INDIGO trouxe destaque a neuro-oncologia na ASCO 2023 e foi apresentado em sessão plenária neste ano, pelo seu investigador principal – Ingo K Mellinghoff.

Este é o primeiro estudo prospectivo, randomizado e de fase 3, com terapia alvo para o glioma grau 2 com mutação nos genes isocitrato desidrogenase 1 (IDH1) ou 2 (IDH2). Neste estudo, o uso precoce do vorasidenibe (VOR) reduziu significativamente o risco de progressão de doença ou morte e postergou a necessidade de tratamentos subsequentes na população estudada.

Embora os gliomas de grau 2 sejam tumores malignos de progressão lenta, com frequência acometem indivíduos jovens e os tratamentos convencionais pós-operatórios para doença de alto risco com quimioterapia e radioterapia não são curativos e estão associados a toxicidades de curto e longo prazo, com prejuízo a qualidade de vida. As mutações de IDH1 e IDH2 estão presentes nos gliomas grau 2 em cerca de 80% e 4%, respectivamente, são relacionadas ao processo de tumorigênese e primordiais para a classificação de 2021 da Organização Mundial da Saúde (OMS). O VOR é um inibidor dual das enzimas IDH1 e IDH2, com adequada penetração da barreira hematoencefálica e com perfil de segurança tolerável já demonstrado em estudos de fase 1.

Neste ensaio clínico, os pacientes com diagnóstico de oligodendroglioma ou astrocitoma grau 2 com doença residual ou recorrente e mutação de IDH1 ou IDH2, submetidos a cirurgia como único tratamento dirigido à doença oncológica, foram randomizados na mesma proporção para receber VOR 40 mg via oral diariamente ou placebo, em ciclos de 28 dias, e estratificados por status da codeleção 1p19q e tamanho do tumor inicial (< 2 cm e ≥ 2cm). Os critérios de elegibilidade incluíram: idade ≥ 12 anos, KPS > 80%, intervalo mais próximo entre a última cirurgia e a randomização entre 1 e 5 anos, doença mensurável sem realce e ausência de necessidade de quimioterapia/radioterapia imediata. O objetivo primário do estudo foi sobrevida livre de progressão radiográfica (SLP), determinada por um comitê cego e independente de radiologia e dentre os objetivos secundários foi avaliado o tempo até a próxima intervenção (do inglês time to next intervention – TTNI).

O estudo contava com três análises interinas pré-planejadas e os resultados obtidos na segunda análise (até 06 de setembro de 2022) levaram a abertura do estudo em março de 2023 pelo comitê de monitoramento de dados e segurança, tendo em vista o precoce e expressivo benefício do fármaco. Até essa segunda análise interina, 331 pacientes haviam sido randomizados: 168 para VOR e 163 para placebo. A idade mediana entre todos os pacientes foi 40,4 anos, mais de 50% dos pacientes tinham KPS = 100, o tempo médio desde a última cirurgia até a randomização foi de 2,4 anos e 51% apresentavam oligodendroglioma e 48% astrocitoma.

A SLP foi estatisticamente significativa a favor do braço VOR (HR, 0,39; IC 95% 0,27 – 0,56; p = 0,000000067), com redução do risco de progressão ou de morte de 61%. A SLP mediana foi expressivamente maior no grupo que recebeu VOR: 27,7 meses contra 11,1 meses no grupo placebo, tendo esse benefício se estendido a todos os subgrupos de pacientes, independente do status da codeleção 1p/19q, do número de cirurgias e do tempo desde a última cirurgia até a randomização.

O TTNI também foi estatisticamente significativo a favor do braço VOR (HR, 0,26; IC 95% 0,15 – 0,43; p=0,000000019), com mediana de TTNI no grupo controle de 17,8 meses e ainda não atingida no grupo do VOR. Na análise de 24 meses 83,4% dos pacientes do grupo intervenção não tinham recebido outra terapia contra 27% do grupo placebo.

Em relação aos eventos adversos, o VOR demonstrou um perfil de segurança tolerável e os eventos adversos mais frequentes comparado ao grupo placebo foram elevação das transaminases e diarreia.

Em conclusão, o uso precoce de VOR melhorou significativamente a SLP e prolongou o tempo para uma nova intervenção nos pacientes com glioma grau 2 com IDH mutado e doença residual ou recorrente, demonstrando um benefício clínico expressivo nesses pacientes, para os quais a quimioterapia e radioterapia estão sendo adiadas. A medida que os dados forem amadurecendo será interessante avaliar o impacto na sobrevida global, no entanto é necessário um seguimento mais prolongado para avaliação deste desfecho.

Belzutifan para o tratamento de hemangioblastomas de sistema nervoso central associados a doença de von Hippel-Lindau. LITESPARK-004, um estudo de fase 2

Iliopoulos O et al. Belzutifan Treatment for von Hippel-Lindau Disease-Associated Central Nervous System Hemangioblastomas in the Phase 2 LITESPARK-004 Study. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 16; abstr 2008)

Neste estudo de fase 2, de braço único, pacientes portadores da doença de von Hippel-Lindau (VHL) diagnosticados por alteração germinativa no gene VHL, com uma ou mais lesões mensuráveis de carcinoma de células renais (CCR) de até 3 cm e sem outros tumores com necessidade de intervenção cirúrgica imediata ou evidência de doença metastática à distância e na ausência de terapia oncológica sistêmica prévia, foram selecionados para receber belzutifan 120 mg via oral diariamente.

As alterações no gene VHL levam a estabilização aberrante e acúmulo do fator induzido por hipóxia 2 alfa (HIF-2α), promovendo ativação de genes associados ao crescimento tumoral. Por essa razão, os pacientes com VHL tem maior chance de desenvolver tumores e cistos multiorgânicos, tais como CCR, tumores neuroendócrinos pancreáticos (pNET) e hemangioblastomas (HB) de sistema nervoso central (SNC). Estes, por sua vez, estão presentes em cerca de 80% dos pacientes com VHL, representando importante causa de morbi-mortalidade nesta população.

O belzutifan é o primeiro inibidor de HIF-2α a demonstrar atividade antitumoral clinicamente significativa tanto no CCR quanto em outras neoplasias associadas à doença de VHL no estudo em andamento LITESPARK-004. Na ASCO 2023, foram apresentados os resultados atualizados deste estudo para o subgrupo de pacientes com HB de SNC. Os desfechos avaliados foram taxa de resposta objetiva (TRO), duração de resposta (do inglês duration of response – DoR), tempo médio para resposta e sobrevida livre de progressão (SLP) avaliados pelo RECIST v1.1, através de um comitê independente. Também foram avaliadas a taxa de crescimento linear das lesões (do inglês linear growth rate – LGR) e a segurança. A resposta a intervenção foi avaliada de acordo com a característica da lesão, divididas em tumores sólido-císticos e exclusivamente sólidos.

Dos 61 pacientes incluídos no estudo, 50 (82%) tinham ≥ 1 HB de SNC, sendo que cerca de 92% já tinham sido submetidos a pelo menos um tratamento cirúrgico prévio para o HB e 22 (59%) tinham sido submetidos a cirurgia nos últimos 4 anos antes de iniciarem o belzutifan. Até 1º de abril de 2022, o seguimento mediano dos pacientes com HB de SNC foi de 38 meses; a TRO foi de 44% e dos 22 pacientes que apresentaram resposta, 4 foram à resposta completa e 18 apresentaram resposta parcial. A taxa de controle de doença foi de 90% (n = 45 e IC 78-97) e o tempo médio para resposta foi de 5,4 meses (de 2,3 a 33,1). A mediana de DoR não foi atingida e, no seguimento de 3 anos, 72% dos pacientes que responderam mantinham resposta. A mediana de SLP também não foi atingida e aos 36 meses 79% dos pacientes não haviam progredido doença ou morrido. Após o início do anti-HIF-2α, a LGR mediana foi de -1,6 mm ao ano (-7,0 a 3,1).

Considerando todos os indivíduos com lesões em SNC mensuráveis incluídos no estudo, 25 (50%) tinham ≥ 1 HB de SNC com componente sólido exclusivo, e para essa população a TRO foi de 76% (IC 95%, 55-91) e a taxa de controle de doença foi de 96% (n = 24 e IC 95% 80 – 100). Tanto a DoR quanto a SLP não foram alcançadas e na análise de 3 anos 75% dos pacientes que responderam ao tratamento mantinham resposta e 91% estavam vivos e sem progressão de doença. De todos os participantes do estudo apenas 1 necessitou de neurocirurgia após o início da terapia anti-HIF-2α.

O belzutifan foi bem tolerado e o evento adverso (EA) mais comum foi a anemia. Apenas dois pacientes (3%) descontinuaram o tratamento por EA relacionado ao tratamento e não houveram óbitos relacionados ao fármaco.

Como conclusão, observa-se uma significativa e durável atividade antitumoral com belzutifan nos pacientes com VHL e HB de SNC. Esta medicação já está aprovada no Brasil, mas se encontra em fase de precificação. Certamente, o uso do belzutifan terá impacto positivo no tratamento de pacientes com doença de VHL e HB de SNC que não necessitam de cirurgia imediata, achados consistentes com as demais neoplasias associadas à essa doença.

RANO 2.0: Proposta de atualização dos Critérios de Avaliação de Resposta em Neuro-Oncologia para os gliomas de alto e baixo grau em adultos

Wen PY et al. RANO 2.0: Proposal for an update to the Response Assessment in Neuro-Oncology (RANO) Criteria for high- and low-grade gliomas in adults. Poster session presented at: ASCO annual meeting; 2023 Jun 3; Chicago, IL. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 16; abstr 2017).

Os critérios de avaliação de resposta em neuro-oncologia (RANO) para glioma de alto (do inglês high-grade glioma – HGG) e baixo (do inglês low-grade glioma – LGG) grau foram desenvolvidos para melhorar a confiabilidade da avaliação de resposta em ensaios clínicos de glioma, porém várias limitações dos critérios originais do RANO foram relatadas. Diversos estudos que utilizaram diferentes versões previamente estabelecidas do RANO apresentaram importantes discrepâncias entre os dados de sobrevida livre de progressão (SLP) e sobrevida global (SG), culminando numa eminente necessidade do desenvolvimento de novos métodos de avaliação.

Para abordar essas limitações, uma grande coorte de pacientes com glioblastoma (GBM) recém-diagnosticados e recorrentes foi avaliada comparando o RANO-HGG com os critérios do RANO modificado (mRANO) e do RANO desenvolvido para imunoterapia (iRANO) a fim de informar as atualizações propostas no RANO 2.0.

Desenvolvido pelo Dr. Patrick Y. Wen – pesquisador do Dana Farber Institute – e colegas, o RANO 2.0 foi apresentado na ASCO de 2023 na sessão pôsteres de tumores do sistema nervoso central (SNC). Baseado na classificação dos gliomas da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2021, o RANO 2.0 recomenda um único conjunto comum de critérios para todos os graus de glioma, independentemente do status mutacional do IDH e da modalidade terapêutica avaliada, a fim de padronizar os métodos de avaliação em ensaios clínicos.

Nesta proposta recomenda-se que nos glioblastomas recém-diagnosticados, utilize-se a ressonância magnética (RM) pós-radioterapia (RT), geralmente obtida com 4 semanas após o término da RT, como linha de base para comparação de imagens subsequentes ao invés da RM pós-cirúrgica, conforme proposto nos critérios do RANO original. Além disso, como a incidência da pseudoprogressão é alta nos primeiros 3 meses após a radioterapia, a confirmação da progressão durante esse período com uma nova RM deve ser realizada entre 4 e 8 semanas desta para determinar a progressão radiográfica da doença.

A mensuração primária continua sendo a área transversal máxima bidimensional do tumor, mas as medições volumétricas também se tornam uma opção. Já a avaliação dos componentes com e sem realce pelo contraste se modificam: nos tumores IDH tipo selvagem com realce pelo contraste, o componente sem realce não será mais avaliado, exceto em pacientes recebendo terapia antiangiogênica; nos gliomas grau 2/3 deve-se medir o componente sem realce pelo contraste; e nos tumores IDH mutado e de linha média com um componente significativo de área sem realce, ambas as áreas (com e sem realce pelo contraste) deverão ser avaliadas como lesões-alvo. Também fora recomendado não utilizar a avaliação de progressão por FLAIR para GBM IDH selvagem, com exceção dos indivíduos em terapia antiangiogênica.

Para avaliação de resposta, recomenda-se avaliar até 3 lesões alvos. Progressão de doença foi definida como aumento ≥ 25% dos componentes com realce ou sem realce pelo contraste ou surgimento de nova lesão e resposta foi definida como redução ≥ 50% dos componentes com ou sem realce pelo contraste e pelo menos estabilidade de outros componentes.

Espera-se que com as mudanças dos critérios do RANO 2.0 haja melhora na avaliação de resposta em ensaios clínicos de glioma e que isso ajude no desenvolvimento de terapias mais eficazes para os pacientes. A avaliação através de critérios mais estritos nesta atualização determinou de forma mais apurada a avaliação de resposta e também de pseudoprogressão, todavia devemos avaliar a disponibilidade dos métodos de imagem e os custos envolvidos.

 

Mellinghoff IK et al. INDIGO: A global, randomized, double-blind, phase III study of vorasidenib versus placebo in patients with residual or recurrent grade 2 glioma with an IDH1/2 mutation. J Clin Oncol v.41, 2023 (suppl 17; abstr LBA1) …………….………… 1
Iliopoulos O et al. Belzutifan Treatment for von Hippel-Lindau Disease-Associated Central Nervous System Hemangioblastomas in the Phase 2 LITESPARK-004 Study. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 16; abstr 2008) ……………………………………………………… 2
Wen PY et al. RANO 2.0: Proposal for an update to the Response Assessment in Neuro-Oncology (RANO) Criteria for high- and low-grade gliomas in adults. Poster session presented at: ASCO annual meeting; 2023 Jun 3; Chicago, IL. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 16; abstr 2017)……..………………………………………….………………………………………. 3

Avaliador científico:

Dra. Thamires Oliveira Silva

Residência Médica em Oncologia Clínica pelo Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino, Rio de Janeiro/RJ