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SBOC REVIEW

Highlights de Tumores de Cabeça e Pescoço

NIVOPOSTOP (GORTEC 2018-01): Estudo fase III randomizado que avalia o nivolumabe adjuvante associado à quimiorradioterapia em pacientes com carcinoma espinocelular de cabeça e pescoço ressecados com alto risco de recidiva

Bourhis J, et al. NIVOPOSTOP (GORTEC 2018-01): A phase III randomized trial of adjuvant nivolumab added to radio-chemotherapy in patients with resected head and neck squamous cell carcinoma at high risk of relapse

Este é um estudo de fase III que avaliou o papel do nivolumabe como tratamento adjuvante combinado à quimiorradioterapia (CRT) em pacientes com carcinoma espinocelular de cabeça e pescoço (CEC) localmente avançado, já submetidos à ressecção cirúrgica e com alto risco de recidiva. Foram incluídos pacientes com tumores da cavidade oral, orofaringe (incluindo casos HPV-positivos), hipofaringe e laringe, submetidos à ressecção cirúrgica e que apresentavam pelo menos um critério de alto risco de recidiva: extensão extracapsular linfonodal, margens cirúrgicas positivas, comprometimento de quatro ou mais linfonodos ou invasão perineural extensa.

O estudo randomizou 680 pacientes, com idade inferior a 75 anos, em dois grupos: o grupo controle recebeu o tratamento padrão com radioterapia (66 Gy) combinada a cisplatina (100 mg/m² a cada três semanas por três ciclos). Já o grupo experimental recebeu nivolumabe 240 mg antes do início da quimiorradioterapia (CRT), seguido de nivolumabe 360 mg concomitante à CRT, e posteriormente 6 ciclos de nivolumabe 480 mg administrados a cada quatro semanas como manutenção. 58% da população do estudo apresentava tumor primário em cavidade oral, 83% doença em estágio IVA ou IVB, 56% da população possuía PDL1-CPS inferior a 20, sendo que destes, apenas 13% possuíam PDL-1 <1.

O desfecho primário do estudo foi sobrevida livre de doença (SLD). Com follow up mediano de 30,3 meses, a SLD em 3 anos foi de 63,1% no braço experimental, comparada a 52,5% no grupo com CRT isolada, com HR 0,76 (p = 0,034). A incorporação de nivolumabe à CRT resultou em redução das taxas de recidiva locorregional, sem impacto observado na incidência de metástases à distância. Em três anos, 13% dos pacientes que receberam nivolumabe + CRT apresentaram recidiva locorregional, comparado a 20% dos pacientes que receberam apenas CRT (HR 0,63; IC 95% [0,42–0,94]). Os dados de sobrevida global (SG) ainda não são maduros, mas a SG foi numericamente superior no grupo experimental (74% x 67%).

Com relação às toxicidades, observou-se um maior número de efeitos adversos no braço experimental, mas sem diferença em mortalidade. Nos 9 meses após a CRT, eventos adversos graves de grau 3/4 ocorreram em 31,1% versus 16,0%, respectivamente. TRAEs de grau ≥3 após 9 meses da CRT foram infrequentes em ambos os grupos (4,3% vs. 3,4%) e nenhum foi superior ao grau 3. Dois pacientes em cada grupo morreram em decorrência dos eventos adversos relacionados ao tratamento.

O estudo NIVOPOSTOP demonstrou que o uso adjuvante de nivolumabe reduz o risco de recidiva em pacientes com CEC de cabeça e pescoço localmente avançado e de alto risco – grupo que, mesmo após cirurgia seguida de quimiorradioterapia, ainda apresenta taxas de recorrência de aproximadamente 50%. O tratamento padrão para essa população permanece inalterado há duas décadas, com base nos estudos EORTC 22931 e RTOG 9501. A nova evidência, que demonstra superioridade do nivolumabe em relação à quimiorradioterapia padrão nesse cenário, abre caminho para uma nova abordagem terapêutica na prática clínica.  No entanto, é importante considerar que os dados de sobrevida global ainda são imaturos, e análises mais detalhadas, especialmente em pacientes com tumores PDL-1 negativos – que representaram a minoria no estudo –, a inda são necessárias.

 

Pembrolizumabe neoadjuvante e adjuvante no câncer de cabeça e pescoço localmente avançado

Uppaluri R, et al. Neoadjuvant and Adjuvant Pembrolizumab in Locally Advanced Head and Neck Cancer

O KEYNOTE-689 é um estudo de fase III, multicêntrico e randomizado que avaliou o uso de pembrolizumabe perioperatório em pacientes com carcinoma escamoso de cabeça e pescoço (HNSCC) localmente avançado e ressecável, incluindo tumores de laringe, hipofaringe, cavidade oral e orofaringe. Um total de 714 pacientes estágio III ou IVA foram randomizados para receber o tratamento padrão (cirurgia seguida de radioterapia ou quimiorradioterapia) com ou sem pembrolizumabe (2 ciclos neoadjuvantes e 15 adjuvantes). O desfecho primário foi a sobrevida livre de eventos (SLE), avaliada em três grupos: pacientes com PD-L1 CPS ≥10, CPS ≥1 e na população total. Dos pacientes incluídos, 65% apresentavam CPS ≥ 10 e 95% CPS ≥ 1.

Na análise interina, com mediana de seguimento de 38,3 meses, a adição de pembrolizumabe resultou em uma melhora significativa da SLE. Entre os pacientes com CPS ≥10, a taxa de SLE em 3 anos foi de 59,8% no grupo com pembrolizumabe versus 45,9% no grupo controle, HR 0,66 (p = 0,004). Resultados semelhantes foram observados na população com CPS ≥1, e na população geral. Na população total, a mediana de SLE foi de 51,8 meses no braço com pembrolizumabe, versus 30,5 meses no braço controle. Na população com PDL1 CPS ≥10 observou-se mediana de SLE de 59,7 meses com pembrolizumabe versus 26,9 meses no braço controle, sendo também a mesma mediana de SLE na população com CPS ≥1, (HR = 0,70; p = 0,001). Entre todos os pacientes, a redução no risco de recidiva e morte foi de 27% (p = 0,004), e entre os pacientes com CPS ≥ 10, o risco foi reduzido em 34% (p = 0,002). Além disso, foi observada taxa de resposta patológica maior em 9,4% dos pacientes que receberam pembrolizumabe – sendo 3% de resposta patológica completa, enquanto nenhum paciente do grupo controle apresentou essa resposta.

Eventos adversos de grau ≥ 3 ocorreram em taxas semelhantes (44,6% vs. 42,9%). A descontinuação por toxicidade foi maior no grupo experimental (17,7% vs. 12,4%), com 4 óbitos versus 1 no controle.

Em termos de implicações clínicas, o KEYNOTE-689 é o primeiro estudo a demonstrar um benefício significativo de imunoterapia neoadjuvante e adjuvante em CEC de cabeça e pescoço localmente avançado ressecável, sobretudo em pacientes com expressão de PD-L1 CPS ≥1. No entanto, algumas limitações devem ser reconhecidas, como a sub-representação de pacientes com CPS <1 e aqueles com tumores HPV positivos, o que exige cautela na extrapolação dos resultados a esses subgrupos. Os dados de sobrevida global e impacto a longo prazo ainda são imaturos, mas este regime tem potencial para se tornar tratamento padrão em um futuro próximo. Nesse contexto, destaca-se a crescente importância da discussão multidisciplinar no manejo do HNSCC localmente avançado ressecável, uma vez que estudos recentes, como o NIVOPOSTOP e o KEYNOTE-689, trouxeram evidências robustas do benefício da imunoterapia nesse cenário. Enquanto o NIVOPOSTOP demonstrou redução no risco de recidiva locorregional com o uso adjuvante de nivolumabe, o KEYNOTE-689 evidenciou redução no risco de recidiva à distância com imunoterapia neoadjuvante e adjuvante, reforçando a necessidade de discussão individual para definição de condutas neste cenário.

 

Pembrolizumabe neoadjuvante em combinação com dabrafenibe e trametinibe (DTP) para câncer anaplásico de tireoide mutado por BRAF V600E (BRAFm-ATC): Um estudo multicêntrico de fase 2

Zafereo M, et al. Neoadjuvant pembrolizumab in combination with dabrafenib and trametinib (DTP) for BRAF V600E-mutated anaplastic thyroid cancer (BRAFm-ATC): A multicenter phase 2 trial

Este estudo multicêntrico de fase 2, braço único, incluiu pacientes com BRAFm-ATC estágio IVB/IVC. Após um período inicial de 3 a 6 semanas com dabrafenibe (150 mg duas vezes ao dia) e trametinibe (2 mg/dia), adicionou-se pembrolizumabe (200 mg a cada 3 semanas), com reavaliações a cada três ciclos. Após 2-7 ciclos de DTP, os pacientes que foram considerados ressecáveis foram submetidos à ressecção cirúrgica. Em seguida da cirurgia, os pacientes continuaram com pembrolizumabe em associação com radioterapia ou seguiram diretamente para o tratamento adjuvante com DTP (até 26 ciclos). Como desfecho primário do estudo, foi avaliada a taxa de ressecção R0/R1 e sobrevida global (SG).

Os 36 pacientes analisados receberam uma mediana de 4 ciclos neoadjuvantes de DTP (variação: 2–7), com 26 (72%) apresentando resposta parcial ou completa por imagem. Trinta pacientes (83%) foram operados após DTP, sendo que 29 deles (97%) obtiveram ressecção R0/R1. O escore médio de morbidade cirúrgica (escala de 0 a 4, sendo 4 irressecável) melhorou de 3,3 para 1,6 após DTP (p < 0,01).

Resposta patológica completa foi observada em 20 dos 30 pacientes operados (67%), enquanto os 10 restantes (33%) apresentaram doença residual. Após a cirurgia, 11 dos 30 pacientes (37%) receberam radioterapia adjuvante cervical e 28 dos 36 (78%) completaram uma mediana de 11 ciclos adjuvantes de DTP (variação: 1–26). Com mediana de seguimento de 18 meses, 15 dos 36 pacientes (42%) evoluíram a óbito. A mediana de sobrevida livre de progressão (SLP) foi de 13,9 meses, com taxas de SLP de 59% em 1 ano e 33% em 2 anos. A mediana de sobrevida global (SG) foi de 18 meses, com taxas de sobrevida de 71% em 1 ano e 44% em 2 anos. Pacientes com resposta patológica completa tiveram melhor sobrevida em 2 anos do que aqueles com ATC residual (69% vs 30%; p = 0,018). Eventos adversos grau 5 ocorreram em 2 pacientes relacionados ao tratamento com DTP – perfuração duodenal e sepse.

O carcinoma anaplásico de tireoide é uma neoplasia agressiva frequentemente diagnosticada em cenário de doença irressecável. No estudo em questão, a combinação terapêutica foi associada a uma mediana de SLP de 13 meses, em comparação com 6,7 meses observados em estudos anteriores. Notavelmente, mais de 70% dos pacientes que receberam a combinação com DTP puderam ser submetidos à cirurgia, enquanto em controles históricos, essa taxa é de apenas 5%. Adicionalmente, foi observada uma elevação da mediana de SG para 18 meses, comparada a 14,6 meses com dados históricos. Tal estratégia terapêutica não apenas aumentou a taxa de ressecabilidade, como também promoveu melhores desfechos em termos de desfechos clínicos, ainda que essas comparações tenham sido feitas de forma indireta, com base em estudos prévios envolvendo essa população específica. Apesar das limitações metodológicas do estudo – incluindo o pequeno tamanho amostral, braço único e a ausência de avaliação da expressão de PD-L1 nos tumores analisados – os resultados obtidos sugerem que essa combinação pode representar uma promissora abordagem terapêutica futura para pacientes com carcinoma anaplásico de tireoide portadores da mutação BRAF V600E. A consolidação desse regime como padrão de tratamento, no entanto, dependerá de estudos adicionais e de maior maturação dos dados já disponíveis.

 

Avaliadora científica:

Dra. Samara Theodoro Pacheco

Oncologista clínica pelo A.C.Camargo Cancer Center – São Paulo/SP

Oncologista clínica na Rede D’Or – Brasília/DF

Título de Especialista em Oncologia Clínica pela SBOC/AMB

Instagram: @samaratheodoro

Cidade de atuação: Brasília/DF