SBOC REVIEW

Highlights de Tumores Ginecológicos
Pembrolizumabe com quimiorradioterapia concomitante em pacientes com câncer do colo do útero localmente avançado de alto risco: Resultados da análise final do estudo de fase 3, randomizado, duplo-cego ENGOT-cx11/GOG-3047/KEYNOTE-A18
Pembrolizumab with concurrent chemoradiotherapy in patients with high-risk locally advanced cervical cancer: Final analysis results of the phase 3, randomized, double-blind ENGOT-cx11/GOG-3047/KEYNOTE-A18 study
O estudo de fase 3, KEYNOTE-A18, avaliou a adição de pembrolizumabe ao tratamento padrão de quimiorradioterapia (QTRT) com cisplatina em pacientes com câncer de colo uterino localmente avançado de alto risco, EC FIGO 2014 IB2-IIB com linfonodo positivo e EC III-IVa. Foram randomizadas (1:1) 1.060 pacientes para receber 5 ciclos de pembrolizumabe 200 mg ou placebo a cada 3 semanas + QTRT, seguidos por 15 ciclos de pembrolizumabe 400 mg ou placebo a cada 6 semanas. O esquema de QTRT incluiu 5 ciclos (com uma 6ª dose opcional) de cisplatina 40 mg/m² semanalmente + radioterapia externa (EBRT), seguida de braquiterapia. Os pacientes foram estratificados conforme o tipo de EBRT planejado (radioterapia com intensidade modulada [IMRT] ou radioterapia com arco modulada por volume [VMAT] vs não-IMRT ou não-VMAT), estágio clínico (estágio IB2-IIB vs III-IVA) e dose total de radioterapia planejada (<70 Gy vs ≥70 Gy de dose equivalente). Os desfechos primários são sobrevida livre de progressão (SLP) conforme RECIST versão 1.1 pelo investigador e sobrevida global (SG).
Em sua análise final, o seguimento mediano foi de 41,9 meses (intervalo de 24,8 a 55,0), 64,3% das pacientes no braço pembrolizumabe estavam livres de progressão, enquanto 55,6% no braço controle [HR= 0,72 (95% CI, 0.59-0.87)]. Em relação à SG, a adição de pembrolizumabe apresentou benefício estatisticamente significativo, 81,8% vs 74,4% [HR: 0,73 (95% CI, 0.57-0.94)] na população geral do estudo. Entre os subgrupos pré-especificados, nas pacientes com doença em estágio IB2-IIB com linfonodos positivos tal benefício não obteve significância estatística (HR para SG = 0,92 [IC 95%, 0,62–1,38]). A incidência de eventos adversos relacionados ao tratamento de grau ≥3 foi de 69,5% no grupo pembrolizumabe + QTRT e de 61,5% no grupo placebo + QTRT.
A análise final do KEYNOTE-A18 reitera o benefício em SLP e SG da adição de pembrolizumabe ao regime de quimiorradioterapia, consolidando-se como tratamento padrão para pacientes previamente não tratadas com câncer de colo uterino localmente avançado de alto risco. Porém, como observado em análise de subgrupos pré-especificada, a magnitude do benefício é superior em pacientes EC III-IVa. O perfil de toxicidade foi manejável e consistente com os efeitos adversos já conhecidos das terapias.
ROSELLA: Um estudo de fase 3 de relacorilant em combinação com nab-paclitaxel versus monoterapia com nab-paclitaxel em pacientes com câncer de ovário resistente à platina (GOG-3073, ENGOT-ov72)
ROSELLA: A phase 3 study of relacorilant in combination with nab-paclitaxel versus nab-paclitaxel monotherapy in patients with platinum-resistant ovarian cancer (GOG-3073, ENGOT-ov72)
O ROSELLA foi um estudo de fase III, randomizado, aberto, que avaliou relacorilant, um antagonista seletivo do receptor de glicocorticoide, associado a nab-paclitaxel em comparação com a monoterapia com nab-paclitaxel em pacientes com câncer de ovário resistente à platina. As pacientes (N:381) foram randomizadas na proporção de 1:1 para receber relacorilant (150 mg no dia anterior, no dia e no dia seguinte à administração de nab-paclitaxel) + nab-paclitaxel (80 mg/m² nos dias 1, 8 e 15 de cada ciclo de 28 dias) ou nab-paclitaxel isoladamente (100 mg/m² no mesmo esquema). Os principais critérios de elegibilidade incluíram de 1 a 3 linhas prévias de tratamento antineoplásico e uso prévio de bevacizumabe. Os dois desfechos primários são a sobrevida livre de progressão (SLP) e a sobrevida global (SG). Os desfechos secundários incluem: SLP pelo investigador, taxa de resposta objetiva, melhor resposta global, duração da resposta e segurança.
O estudo ROSELLA atingiu seu desfecho primário: pacientes que receberam relacorilant + nab-paclitaxel apresentaram uma melhora estatisticamente significativa na sobrevida livre de progressão (SLP) em comparação com a monoterapia com nab-paclitaxel (HR 0,70, IC 95% 0,54–0,91, mediana de 6,5 vs 5,5 meses, P=0,008). Na análise interina, observou-se uma melhora clinicamente significativa na SG com a adição de relacorilant ao nab-paclitaxel (HR 0,69, IC 95% 0,52–0,92, mediana de 15,9 vs 11,5 meses, P=0,01), com menor incidência de ascite no grupo que recebeu relacorilant. Os eventos adversos (EAs) foram comparáveis entre os braços do estudo, sendo que a combinação de relacorilant + nab-paclitaxel foi bem tolerada. Os EAs mais frequentemente relatados foram toxicidades já conhecidas do nab-paclitaxel: anemia (58%), neutropenia (56%) e náuseas (39%).
Os dados do ROSELLA nos trazem uma nova opção de tratamento para pacientes com câncer de ovário platino-resistente com ganho de sobrevida global. O cenário de doença platino-resistente ainda é bastante desafiador, com poucas opções terapêuticas efetivas. Previamente aos dados do ROSELLA, somente o mirvetuximabe soravtansine, um anticorpo-droga conjugado, havia demonstrado ganho em sobrevida global nesse cenário nas pacientes com receptor de folato positivo.
TRUST: Estudo sobre terapia cirúrgica radical inicial no câncer de ovário avançado (ENGOT ov33/AGO‐OVAR OP7)
TRUST: Trial of radical upfront surgical therapy in advanced ovarian cancer (ENGOT ov33/AGO‐OVAR OP7)
O estudo TRUST é um ensaio clínico internacional, randomizado, multicêntrico, de fase III, com pacientes com câncer de ovário em estágio IIIB-IVB e bom estado funcional (ECOG 0/1). Ele comparou a cirurgia citorredutora primária seguida de 6 ciclos de quimioterapia adjuvante com 3 ciclos de quimioterapia neoadjuvante (NACT) seguidos de cirurgia citorredutora de intervalo e mais 3 ciclos adjuvantes adicionais. O tratamento de manutenção com bevacizumabe e/ou inibidores de PARP foi permitido, desde que os critérios de seleção fossem semelhantes para ambos os grupos.
Os pacientes eram elegíveis para o estudo se a avaliação clínica e radiológica pré-operatória os identificasse como potenciais candidatos à citorredução primária. Para garantir a qualidade cirúrgica, os centros participantes precisavam cumprir uma auditoria local de garantia de qualidade cirúrgica, possuir infraestrutura adequada, proficiência cirúrgica (taxas de ressecção completa ≥50% em cirurgias primárias) e volume cirúrgico suficiente (≥36 cirurgias de citorredução primária /ano).
Um total de 688 pacientes foi randomizado, 91% apresentavam histologia serosa de alto grau. A ressecção completa foi alcançada em 70% das pacientes submetidas à citorredução primária e em 85% das pacientes no grupo de citorredução de intervalo. A mediana da sobrevida livre de progressão (SLP) foi de 22,2 meses no grupo de citorredução primária e 19,7 meses no grupo de citorredução de intervalo (HR 0,80; IC95%: 0,66–0,96; p=0,02). A mediana da sobrevida global (SG) foi de 54,3 meses no grupo de citorredução primária e 48,3 meses no grupo citorredução de intervalo (HR 0,89; IC95%: 0,74–1,08; p=0,24).
Os pacientes que alcançaram citorredução completa primária tiveram o melhor desfecho, com mediana de SLP e SG de 27,9 e 67,0 meses, respectivamente. O benefício da citorredução primária foi mais evidente nos pacientes em estágio III: a mediana de SLP para citorredução primária vs. citorredução de intervalo foi de 26,3 vs. 21,4 meses; a mediana de SG para citorredução primária vs. citorredução de intervalo foi de 63,7 vs. 53,2 meses, porém sem significância estatística. As taxas de complicações pós-operatórias graves foram aceitáveis, com uma taxa de mortalidade pós-operatória em 30 dias inferior a 1% em ambos os grupos.
O estudo TRUST não atingiu seu objetivo primário de superioridade em termos de sobrevida global ao comparar citorredução primária em relação à citorredução de intervalo, porém houve benefício em sobrevida livre de progressão. As altas taxas de ressecção completa e as medianas de sobrevida global em ambos os braços demonstram que a citorredução completa é uma etapa crucial no tratamento do câncer de ovário avançado.
Biópsia do linfonodo sentinela versus linfadenectomia pélvica no câncer de colo do útero em estágio inicial: o estudo PHENIX
Sentinel lymph node biopsy versus pelvic lymphadenectomy in early-stage cervical cancer: The PHENIX trial
O PHENIX foi um estudo clínico controlado, randomizado, multicêntrico e de não inferioridade que avaliou pacientes com câncer do colo do útero em EC IA1 (com invasão linfovascular), IA2, IB1 ou IIA1, segundo a classificação FIGO 2009, incluindo carcinoma de células escamosas, adenocarcinoma ou carcinoma adenoescamoso. Todas as pacientes foram submetidas inicialmente à biópsia do linfonodo sentinela (BLS), e todos os linfonodos sentinelas (LNs) foram analisados por congelação intraoperatória. Com base no status do LN, as pacientes foram designadas intraoperatoriamente para as coortes PHENIX-I (LN negativo) ou PHENIX-II (LS positivo) e, em seguida, randomizadas em uma proporção 1:1 para realizar ou não a linfadenectomia pélvica (LP). O desfecho primário foi a sobrevida livre de doença. 908 pacientes com pelo menos um linfonodo sentinela (LS) detectado foram incluídas e randomizadas intraoperatoriamente, incluindo 838 pacientes LS-negativas no grupo PHENIX-I. As pacientes foram designadas para realizar apenas a biópsia do linfonodo sentinela ou linfadenectomia pélvica. A mediana de idade foi de 48 anos e a taxa de detecção bilateral de LS foi de 82,6%. As características clinicopatológicas, abordagens cirúrgicas e terapias pós-operatórias estavam bem equilibradas entre os grupos BLS e LP.
O tempo mediano de seguimento alcançou 52 meses (variando de 1 a 104 meses). A biópsia do linfonodo sentinela demonstrou duração operatória significativamente menor (P < 0,0001), menor perda sanguínea (P < 0,001) e menores taxas de morbidade (P < 0,001) em comparação com a linfadenectomia pélvica.
No grupo PHENIX-I, recidivas foram observadas em 16 pacientes do grupo BLS e em 26 pacientes do grupo LP. Recidivas em linfonodos retroperitoneais foram observadas em 9 pacientes do grupo LP, enquanto nenhuma foi detectada no grupo BLS (P < 0,05). Houve 3 mortes relacionadas ao câncer no grupo BLS e 14 no grupo LP. As taxas de sobrevida livre de doença em 3 anos foram de 96,8% para o grupo BLS e 94,5% para o grupo LP (HR = 0,61, intervalo de confiança [IC] de 95%: 0,33–1,14, P = 0,12); as taxas de sobrevida câncer-específica em 3 anos foram de 100,0% para o grupo BLS e 97,8% para o grupo LP (HR = 0,21, IC 95%: 0,06–0,74, P = 0,007).
Em conclusão, a técnica do linfonodo sentinela se mostrou não inferior à linfadenectomia pélvica em relação a desfechos de sobrevida, com menor morbidade cirúrgica.
Avaliadora científica:
Dra. Ana Beatriz Tavares Filgueiras
Oncologista clínica pelo Instituto do Câncer do Ceará – Fortaleza/CE
Fellowship em Tumores Femininos
Instagram: @beatriztavaresf