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SBOC REVIEW

Nova abordagem a sintomas vasomotores em pacientes com câncer de mama

Resumo do artigo:

O OASIS 4 é um estudo de fase 3, multicêntrico, duplo-cego e controlado por placebo, que avaliou o elinzanetanto na dose de 120 mg/dia, em mulheres de 18 a 70 anos com sintomas vasomotores (SV) moderados a graves associados à terapia endócrina (tamoxifeno ou inibidores de aromatase) para câncer de mama receptor hormonal positivo. Tal terapia já foi avaliada em outros cenários, mas faltavam dados para o uso em pacientes com câncer de mama.

A droga em análise é um antagonista dual dos receptores de neurocinina 1 e 3, presentes em neurônios especializados do hipotálamo. O declínio da atividade estrogênica gera hiperatividade destes neurônios e hiperexpressão da substância P e neurocinina B, responsáveis pela interrupção da termorregulação, gerando SV, assim como vasodilatação periférica e insônia primária.

O estudo foi desenhado para captar pelo menos 40% de mulheres em uso de tamoxifeno e 40% em uso de inibidor de aromatase, no cenário adjuvante, com ou sem análogo do GnRH. Foram avaliadas 758 pacientes e randomizadas 474 na proporção de 2:1 para elinzanetanto 120 mg/dia por 52 semanas ou placebo 1x/dia por 12 semanas, seguido por elinzanetanto 120 mg/dia por 40 semanas (para análise subsequente de segurança). Os desfechos primários foram a alteração na frequência média diária de SV moderados a graves, do início do estudo até a semana 4 e a semana 12. Dentre os principais desfechos secundários estão a variação média da gravidade dos sintomas, a variação na frequência diária de sintomas e a análise de qualidade de vida.

Foram incluídas pacientes que previamente registraram a ocorrência de no mínimo 35 episódios de SV moderados a graves por semana, em cenário adjuvante de câncer de mama, hormônio positivo, e apenas uma paciente em cenário de quimioprofilaxia. Ondas de calor sem sudorese foram caracterizadas como SV leves, com sudorese foram SV moderados e as ondas de calor que causaram interrupção de atividades diárias foram consideradas SV graves.

Excluídas pacientes metastáticas ou recidivadas durante o tratamento. Não foi permitido o uso de medicações concomitantes com potencial efeito confundidor para o impacto nos SV.

O elinzanetanto reduziu de maneira significativa a frequência média diária de SV moderados a graves em comparação ao placebo na semana 4 (diferença média de -3,5 episódios/dia com IC 95% -4,4 a -2,6 com p<0,001) e na semana 12 (diferença média de -3,4 episódios com IC 95% -4,2 a -2,5 com p<0,001). Houve ainda melhora na qualidade de vida relacionada à menopausa e nos distúrbios do sono, mensurados por instrumentos validados (MENQOL e PROMIS SD SF 8b), com diferenças clinicamente relevantes e sustentadas ao longo de 52 semanas. Na avaliação de desfechos exploratórios se identificou que 61% das pacientes tiveram redução de mais da metade da frequência de sintomas no grupo intervenção em comparação a 27% no grupo placebo na semana 4, e 74% versus 35,8% na semana 12.

O perfil de segurança do elinzanetanto foi favorável, com eventos adversos mais comuns sendo cefaleia, fadiga, diarreia e sonolência. Houve um caso grave de aumento de transaminases, mas todos os casos descritos foram reversíveis.

O elinzanetanto proporcionou uma frequência significativamente menor de SV relevantes, assim como redução dos distúrbios do sono e maior qualidade de vida, sem acréscimo em efeitos adversos de impacto.

 

Comentário da avaliadora científica:

Os SV associados às terapias endócrinas são, em geral, mais pronunciados que aqueles presentes na menopausa fisiológica, e considerando o número de pacientes tratadas para câncer de mama hormônio positivo no mundo, é inegável a importância de novas estratégias neste campo. Controlar SV, em última análise, significa aumentar a adesão ao tratamento adjuvante e consequentemente obter melhores resultados clínicos no tratamento oncológico.

Os ensaios OASIS 2 e 3 trouxeram a segurança e impacto do elinzanetanto em promover redução na gravidade e frequência de SV relacionados à menopausa fisiológica, já o OASIS 4 avalia um perfil de pacientes de maior gravidade em magnitude de sintomas.

O estudo apresenta características que indicam rigor metodológico e atingiu o cálculo amostral pré-definido, entretanto, observa-se que o patrocinador esteve envolvido em todas as etapas, incluindo o desenho da pesquisa, manejo dos dados, preparação e escrita do manuscrito. Mesmo com o cegamento parcial até a semana 26, tal nível de participação pode ter influenciado a seleção dos desfechos e a interpretação dos resultados, o que sugere a necessidade de análise crítica quanto à imparcialidade das conclusões.

Chama atenção que um desfecho previamente validado como relevante clinicamente, que é a porcentagem de pacientes que apresentam redução de pelo menos 50% na frequência dos SV diários, foi alocado como desfecho exploratório. O receio em não atingir significância estatística em um desfecho clinicamente validado impediu os autores de alocá-lo como primário ou secundário, perdendo a possibilidade de maior qualificação dos resultados. Apesar deste erro estratégico, o desfecho primário foi bem desenhado. Foi possível tornar um soft outcome quantificável, e a avaliação em dois pontos do tempo, 4 e 12 semanas, sugere início de ação e manutenção do efeito, o que é algo positivo para a análise.

Para sintomas tão complexos e sensíveis a múltiplas abordagens, o trabalho peca em melhor caracterizar o perfil clínico das pacientes. A ausência de dados como status menopausal, porcentagem de pacientes expostas à quimioterapia, a duplo bloqueio ou ooforectomia prejudica a avaliação das interferências na randomização. Na mesma linha, temos dados sobre tabagismo e IMC, mas não sabemos quantas pacientes realizam atividade física regular, uma das principais recomendações para o controle de sintomas vasomotores na prática atual.

Outro ponto interessante é notar o quanto os SV são sensíveis ao efeito placebo. Há, potencialmente, um componente subjetivo na percepção do sintoma. Ao longo das semanas, houve impacto crescente tanto no grupo intervenção, quanto no grupo placebo. Essa tendência natural em ambos os grupos, torna algumas lacunas de informação um pouco mais inquietantes.

Ao que pesem as críticas às escolhas metodológicas, o impacto do elinzanetanto foi relevante, com comodidade posológica e efeitos adversos toleráveis, com 91% dos pacientes decidindo pela manutenção da terapia após o estudo, sendo bem-vindo como nova opção no manejo de sintomas vasomotores em pacientes com câncer de mama em terapia endócrina.

 

Citação: Cardoso F, Parke S, Brennan DJ, et al. Elinzanetant for Vasomotor Symptoms from Endocrine Therapy for Breast Cancer. N Engl J Med. 2025 Jun 2. doi: 10.1056/NEJMoa2415566.

 

Avaliadora científica:

Dra. Carolina Rocha Silva

Oncologista clínica pelo Hospital Santa Izabel – Santa Casa de Misericórdia da Bahia – Salvador/BA

Oncologista clínica no Grupo Oncoclínicas – Salvador/BA

Pós-graduação em Saúde Coletiva pelo Instituto de Saúde Coletiva da UFBA

Instagram: @dra_carolinarocha

Cidade de atuação: Salvador/BA