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SBOC REVIEW

Nova endocrinoterapia agonista do receptor de andrógeno no câncer de mama avançado RA+, RE+ e HER2-

Resumo do artigo:

O papel do receptor de androgênio (RA) no câncer de mama com receptor de estrógeno (RE) positivo e HER2 negativo já é estudado há algum tempo. Basicamente, funciona como um supressor tumoral – a ativação deste receptor suprime o crescimento das células, tanto no contexto de doença sensível à hormonioterapia, quanto no contexto de resistência endócrina. Historicamente, terapias androgênicas, como o propionato de testosterona ou a fluoximesterona, produziram regressão de doença em até 30% das pacientes com câncer de mama avançado. No entanto, apesar dos benefícios terapêuticos neste contexto, os androgênios causam importantes eventos colaterais virilizantes em mulheres.

Então, iniciaram-se estudos pré-clínicos com os moduladores seletivos do receptor de androgênio (SARMs), que agem como agonistas de maneira seletiva no tecido mamário e não causam eventos virilizantes sistêmicos. Enobosarm é um SARM que inibe de forma duradoura, in vivo, o crescimento das células do câncer de mama receptor hormonal (RH) positivo. O objetivo do presente estudo é avaliar a atividade e segurança do enobosarm, em dois regimes posológicos possíveis (9 mg ou 18 mg), em uma coorte de mulheres com câncer de mama avançado, RA positivo, RE positivo e HER2-negativo.

Foram incluídas 136 pacientes na pós-menopausa, com câncer de mama RE e RA positivos, HER2 negativo, em estágio localmente avançado ou metastático. Era necessário ter recebido pelo menos uma terapia endócrina anterior e ter demonstrado sensibilidade endócrina inicial, definida por um intervalo livre de doença de 3 anos no cenário adjuvante ou 6 meses de sobrevida livre de progressão para doença metastática. Foi permitido um curso anterior de quimioterapia no cenário metastático. As pacientes foram randomizadas para receber 9 mg ou 18 mg de enobosarm oral, diariamente. Esta randomização foi estratificada por duas variáveis: (1) a presença de metástases ósseas exclusivas e (2) terapia endócrina imediatamente anterior (adjuvante, neoadjuvante ou metastático).

O desfecho primário foi a taxa de benefício clínico após 24 semanas em pacientes com RA+ confirmado centralmente ≥10% (população avaliável), definida por RECIST 1.1 como resposta completa, parcial ou doença estável. Os desfechos secundários foram taxa de benefício clínico em 24 semanas em todos os pacientes que receberam pelo menos uma dose de enobosarm independentemente do status de RA (ou seja, a população com intenção de tratar – ITT) e os resultados clínicos (avaliados tanto na população avaliável quanto a população ITT): taxa de resposta objetiva, melhor resposta global, sobrevida livre de progressão, tempo até a progressão do tumor e duração da resposta. O estudo não foi desenvolvido para comparar diretamente a diferença entre os dois grupos de dose de enobosarm (9 mg ou 18 mg), mas sim para avaliar se alguma das doses (ou ambas) promoveria benefício clínico de 30% em 24 semanas dentro da população avaliável, mantendo ao mesmo tempo um perfil de segurança aceitável.

Na análise da população avaliável após 24 semanas, 16 (32%, IC 95% 20–47%) de 50 pacientes no grupo de 9 mg e 15 (29%, 17–43%) de 52 no grupo de 18 mg tiveram benefício clínico com Enobosarm. O acompanhamento médio foi 7,5 meses. A sobrevida livre de progressão mediana foi de 5,6 meses no grupo de 9 mg e 4,2 meses no grupo de 18 mg. Segurança também foi avaliada, de forma que eventos adversos relacionados ao tratamento de grau 3 ou 4 ocorreram em 6 (8%) dos 75 pacientes que receberam 9 mg e em 10 (16%) de 61 que receberam 18 mg. A toxicidade foi, no geral, considerada aceitável, variando entre fadiga, mialgia e alteração de enzimas hepáticas.

 

Comentário do avaliador científico:

Este é o primeiro estudo publicado a explorar a ativação do receptor de androgênio com um SARM em câncer de mama avançado. Os resultados deste estudo são promissores, pois, apesar de ser um estudo fase 2, mostrou benefício clínico para pacientes selecionadas, quando tratadas com enobosarm após tratamento anterior com hormonioterapia.

A proporção de pacientes que tiveram benefício clínico foi semelhante para ambos os grupos – de 9 mg e de 18 mg por dia. Desta forma, pode ser considerado um pontapé inicial para o desenvolvimento de novas terapias endócrinas em um cenário que, durante muito tempo, teve como figura principal a modulação do receptor de estrogênio – seja reduzindo a produção de estradiol (supressão ovariana, inibidores da aromatase), bloqueando a ligação do estradiol ao RE (tamoxifeno) ou degradando o receptor (fulvestranto).

Em conclusão, os dados deste estudo fornecem prova de conceito para a atividade e segurança de um novo SARM, apoiando, assim, a premissa de que a ativação do RA pode exercer eventos antitumorais. O Enobosarm foi bem tolerado, sem eventos negativos na qualidade de vida. Esses dados suportam o desenvolvimento adicional de outras estratégias seletivas de ativação de RA no câncer de mama RA+, RE+ e HER2-.

 

Citação: Carlo Palmieri, Hannah Linden, Stephen N Birrell, Sally Wheelwright, Elgene Lim, Lee S Schwartzberg, Amy R Dwyer, Theresa E Hickey, Hope S Rugo, Patrick Cobb, Joyce A O’Shaughnessy, Stephen Johnston, Adam Brufsky, Wayne D Tilley*, Beth Overmoyer*. Lancet Onco 2024; 25: 317-25. Published online February 8, 2024.

 

Avaliadora científica:

Raquel Madureira Filipe

Médica Oncologista, formada na Fundação Amaral Carvalho (Jaú- São Paulo); Oncologista na Oncologia Dor Niterói (RJ) e no Hospital Federal da Lagoa (RJ).

Cidade de atuação: Niterói, Rio de Janeiro.