Instalar App SBOC


  • Toque em
  • Selecione Instalar aplicativo ou Adicionar a lista de início

SBOC REVIEW

Omissão da Terapia Endócrina em Câncer de Mama em Estágio Inicial com Expressão Baixa de Receptor de Estrogênio (1%-10%)

Resumo do artigo:

O papel da terapia endócrina (TE) no câncer de mama com baixa expressão de receptor de estrogênio (RE 1%-10%), também denominado ER-low, permanece incerto. Apesar de diretrizes como ASCO/CAP classificarem essas pacientes como receptor hormonal positivo, diversos estudos apontam características biológicas semelhantes às observadas no subtipo basal-like. Neste estudo observacional, Choong et al. utilizaram o National Cancer Database (NCDB) para investigar a associação entre a omissão da TE e a sobrevida global (SG) em pacientes com câncer de mama inicial ER-low e de alto risco, tratadas com quimioterapia entre 2018 e 2020.

Foram incluídas 7.018 mulheres com tumores estadio I-III, com expressão de RE entre 1% e 10% por imunohistoquímica (IHC), que receberam quimioterapia neoadjuvante (62%) ou adjuvante (38%). A mediana de idade foi 55 anos. A maioria apresentava receptor de progesterona negativo (73%), HER2 negativo (65%), grau histológico 3 (74%) e Ki-67 ≥20% (87%). A omissão da TE foi observada em 42% das pacientes até 12 meses após a cirurgia, sendo mais comum em pacientes com tumores de fenótipo agressivo e entre aquelas tratadas durante o ano de 2020, possivelmente por impacto da pandemia.

Com mediana de seguimento de 3 anos, 586 óbitos foram registrados. A SG em 3 anos foi de 92,3% nas pacientes que receberam TE versus 89,1% naquelas que a omitiram. A análise multivariada com a TE como covariável dependente do tempo mostrou que a omissão esteve associada a pior SG (HR 1,23; IC 95% 1,04–1,46; p = 0,02). O impacto foi mais evidente nas pacientes com RE entre 6%-10% (HR 1,42; IC 95% 1,00–2,02; p = 0,048), enquanto não houve diferença significativa para aquelas com RE entre 1%-5% (HR 1,15; IC 95% 0,91–1,45; p = 0,24).

A análise por tipo de quimioterapia também revelou diferenças. Entre as 4.377 pacientes tratadas com quimioterapia neoadjuvante, 49% atingiram resposta patológica completa (RPC). A omissão da TE não teve impacto na SG dessas pacientes (HR 1,06; IC 95% 0,62–1,80; p = 0,84), cuja taxa de SG em 3 anos foi de 97,1% em ambos os grupos (com ou sem TE). Já entre aquelas com doença residual após quimioterapia neoadjuvante, a SG em 3 anos foi de 85,1% com TE e 78,5% sem TE, sendo a omissão associada a maior risco de morte (HR 1,26; IC 95% 1,00–1,57; p = 0,046). No grupo tratado com quimioterapia adjuvante, não houve diferença significativa de SG com a omissão da TE (HR 1,10; IC 95% 0,82–1,48; p = 0,52).

Os autores destacam que, embora a biologia ER-low seja heterogênea e frequentemente próxima ao subtipo triplo negativo, há subgrupos que podem se beneficiar da TE, como pacientes com doença residual ou ER entre 6%-10%. A avaliação precisa da expressão hormonal e a heterogeneidade intratumoral são desafios que impactam diretamente a decisão terapêutica.

Apesar das limitações, como a ausência de dados sobre adesão, duração da TE e seguimento ainda curto, o estudo representa a maior coorte já publicada sobre o tema. Até que dados prospectivos estejam disponíveis, os autores recomendam cautela na omissão da TE, sobretudo em pacientes com características de maior risco clínico.

 

Comentários do avaliador científico:

Este estudo retrospectivo traz evidências relevantes sobre o impacto da omissão da terapia endócrina (TE) em pacientes com câncer de mama ER-low tratadas com quimioterapia. Os achados reforçam que, embora esse subtipo compartilhe características com o triplo negativo, a TE ainda pode oferecer benefício clínico, especialmente em pacientes com doença residual após tratamento neoadjuvante ou com expressão de ER entre 6% e 10%.

Entretanto, permanecem várias perguntas em aberto: qual o melhor esquema de TE nesse cenário? Há papel para a supressão ovariana ou a incorporação de inibidores de ciclina, como abemaciclibe e ribociclibe? No manejo semelhante ao dos tumores triplo-negativos, há espaço para o uso de carboplatina e imunoterapia com pembrolizumabe em esquemas neoadjuvantes? A adição de capecitabina, conforme proposto no estudo CREATE-X, poderia ser uma alternativa para pacientes com doença residual?

Além disso, o estudo apresenta limitações relevantes: não foram avaliadas a adesão à TE, o tipo de agente utilizado, nem o uso de terapias subsequentes, o que compromete a análise causal. O seguimento de apenas três anos também é insuficiente para capturar eventos tardios, especialmente em tumores com biologia luminal.

 

Citação: Choong GM, Hoskin TL, Boughey JC, Ingle JN, Goetz MP.  Endocrine Therapy Omission in Estrogen Receptor-Low (1%-10%) Early-Stage Breast Cancer. J Clin Oncol. 2025 Apr 11:JCO2402263. doi: 10.1200/JCO-24-02263. Epub ahead of print. PMID: 40215443


Avaliador científico:

Dr. Dyego Lucas Pereira Nunes

Oncologista Clínico pelo Hospital São Rafael – Salvador/BA

Oncologista Clínico na Oncologia D’Or e no Hospital da Mulher – Salvador/BA

Mestrando em Pesquisa Clínica e Translacional em Oncologia pela FIOCRUZ

Instagram: @drdyegonunes

Cidade de atuação: Salvador/BA