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SBOC REVIEW

Omissão de cirurgia após quimioterapia neoadjuvante: mudança de paradigma no câncer de mama inicial?

Resumo do artigo:

Historicamente, a cirurgia tem sido o principal tratamento para o câncer de mama invasivo. No entanto, cerca de 60% dos casos de câncer de mama HER2-positivo ou triplo-negativo tratados com terapia sistêmica neoadjuvante alcançam resposta patológica completa (RPC), o que levanta a possibilidade de eliminar a cirurgia nesses casos.

O estudo em questão investigou a viabilidade de realizar radioterapia como tratamento local, sem cirurgia mamária, em pacientes com RPC confirmada por biópsia após terapia neoadjuvante. Esse foi um ensaio clínico fase 2, multicêntrico, não randomizado. Foram incluídas mulheres ≥ 40 anos e com diagnóstico de câncer de mama cT1-2N0-1M0, HER2-positivo ou triplo-negativo. Todas as pacientes receberam quimioterapia neoadjuvante e, ao final desta etapa, as pacientes com doença residual na imagem menor do que 2 cm foram submetidas à biópsia por aspiração a vácuo (VAB) com 12 amostras usando agulha 9G para avaliar a presença de doença residual na mama.

As intervenções foram as seguintes: pacientes sem evidência de doença invasiva ou in situ de acordo com a VAB receberam radioterapia da mama com boost, sem cirurgia. Pacientes com doença nodal inicial + RPC mamária confirmada por biópsia realizaram dissecção axilar direcionada. Se houver ausência de doença residual na axila, a cirurgia da mama era omitida. O objetivo primário foi avaliar a taxa de recorrência tumoral na mama ipsilateral após 5 anos de seguimento. O seguimento foi feito com exame físico e mamografia a cada 6 meses.

De 50 pacientes incluídas, 29 (58%) tinham câncer de mama subtipo HER2-positivo e 21 (42%) triplo-negativo. A RPC foi detectada por VAB em 31 pacientes (62%). Essas 31 pacientes receberam somente radioterapia, sem cirurgia mamária. Entre 8 pacientes com doença nodal inicial e RPC mamária, nenhuma apresentou doença nodal residual após dissecção dirigida.

A taxa de recorrência local foi de 0% após mediana de 55,4 meses. E a sobrevida livre de doença e sobrevida global de 100%. Foram avaliados os biomarcadores células tumorais circulantes (CTC) DNA tumoral circulante (ctDNA). CTCs foram detectados em 5 amostras de pacientes e ctDNA em 2 pacientes. Não houve correlação entre biomarcadores e recorrência, pois nenhum paciente com RPC apresentou recidiva. Em relação à qualidade de vida, o arrependimento pela decisão de evitar cirurgia foi baixo e diminuiu com o tempo. A qualidade de vida melhorou ao longo dos 5 anos (escala FACT-B+4).

Esta foi a primeira tentativa clínica estruturada de eliminar cirurgia em pacientes com resposta completa à quimioterapia neoadjuvante. Resultados sugerem que a seleção de pacientes através da VAB permite tratamento eficaz com radioterapia e sem realização de cirurgia. Biomarcadores líquidos (CTC/ctDNA) ainda têm papel incerto, mas podem ser explorados como ferramentas futuras de estratificação de risco. As limitações do estudo estão associadas a uma amostra pequena (n=50) e ao fato de se tratar de um estudo não randomizado, sem grupo controle. Além disso, o tempo de seguimento (mediana de 55,4 meses) pode ser insuficiente para tumores com padrão de recorrência tardia, especialmente os HER2+/HR+. Os autores concluíram que a eliminação seletiva da cirurgia da mama após quimioterapia neoadjuvante mostrou-se segura e eficaz em pacientes com RPC comprovada por biópsia VAB. Nenhuma recidiva foi observada em 5 anos. Esses achados podem abrir caminho para mudanças no padrão de tratamento, desde que confirmados por estudos maiores e randomizados.

 

Comentário da avaliadora científica:

A cirurgia sempre foi considerada uma etapa fundamental no tratamento do câncer de mama invasivo. Porém, esse estudo publicado na JAMA Oncology em março de 2025 pode contrapor essa prática. Pesquisadores mostraram que, em casos selecionados, pode ser possível eliminar a cirurgia mamária com segurança.

O estudo investigou pacientes com câncer de mama HER2-positivo ou triplo-negativo de estadiamento inicial que foram tratadas com quimioterapia neoadjuvante. Quando as pacientes atingiram resposta patológica completa, a cirurgia foi omitida. Com seguimento de 5 anos, os resultados mostraram que 62% da amostra apresentou resposta patológica completa confirmada por biópsia por aspiração a vácuo e recebeu radioterapia exclusiva como tratamento local. Elas foram acompanhadas com mamografia semestral e não houve nenhuma paciente com recidiva local, configurando uma taxa de sobrevida livre de doença e sobrevida global de 100% nesse período.

Apesar dos resultados animadores, esse estudo não foi randomizado e incluiu um número pequeno de pacientes, o que impede, nesse momento, a mudança de conduta na prática clínica. Mais estudos robustos serão necessários antes que essa estratégia possa substituir a cirurgia. De fato, estamos caminhando para um futuro com tratamentos cada vez mais personalizados e menos invasivos para câncer de mama.

 

Citação: Kuerer HM, Valero V, Smith BD, Krishnamurthy S, Diego EJ, Johnson HM, et al. Selective elimination of breast surgery for invasive breast cancer: a nonrandomized clinical trial. JAMA Oncol. 2025 Mar 28. doi:10.1001/jamaoncol.2025.0207.

 

Avaliadora científica:

Dra. Emanuella Benevides Poyer

Oncologista Clínica pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA) – Rio de Janeiro/RJ

Oncologista clínica no Centro de Oncologia do Paraná e Hospital Universitário Evangélico Mackenzie – Curitiba/PR

Instagram: @manupoyer

Cidade de atuação: Curitiba/PR.