Instalar App SBOC


  • Toque em
  • Selecione Instalar aplicativo ou Adicionar a lista de início

SBOC REVIEW

Prevenção da síndrome mão-pé associada a anti-inflamatório não-esteroide (estudo D-TORCH)

Resumo do artigo:

A capecitabina é um agente quimioterápico antimetabólito oral frequentemente utilizado no tratamento de diferentes tipos de câncer, mais comumente câncer de mama e gastrointestinal. Porém o seu uso pode ser desafiador pois frequentemente o controle adequado dos eventos adversos exige intervenção médica ativa e rápida. Apesar da toxicidade responder bem ao ajuste de dose, manter a qualidade de vida exige, eventualmente, reduções amplas de dose de tratamento.

Dentre as toxicidades da capecitabina, uma das mais características é a síndrome mão-pé (SMP), podendo atingir até 77% dos pacientes. Atualmente, a melhor evidência no concernente à prevenção de SMP se trata do uso de celecoxibe, droga de limitado uso prático em virtude de potenciais toxicidades associadas. Outros estudos avaliando o creme de ureia possuem resultados inconsistentes na literatura.

Este estudo chama-se D-TORCH e foi um estudo de iniciativa do investigador, ocorreu em centro único e foi conduzido entre fevereiro de 2021 e janeiro de 2023 como estudo de fase 3, randomizado 1:1 e duplo cego no “All India Institute of Medical Sciences”, Nova Deli, Índia. Todos pacientes com câncer de mama ou gastrointestinais eram elegíveis independente da linha de tratamento. O tratamento foi realizado com diclofenaco gel 1% (um anti-inflamatório não-esteroide), ou placebo, duas vezes por dia, por 12 semanas. O desfecho primário avaliado foi a incidência de SMP grau 2 ou 3, ou seja, quando há dor ou limitação para atividades diárias.

O estudo possui boa base estatística e com poder calculado em 80% com alfa bilateral de 0,05 para uma diferença de 15% na incidência de SMP. Os pacientes foram bem distribuídos na randomização, em que 71,1% eram mulheres e 56,3% possuíam câncer de mama. 58,9% receberam terapia combinada, sendo a associação mais comum com oxaliplatina.

Ao término de 12 semanas, 9,5% desenvolveu SMP grau 2 ou 3 em toda população, sendo 3,8% no grupo diclofenaco e 15% no grupo placebo (p=0,003). A redução absoluta de risco foi de 11,3% (IC 95%, 3,0-16,4). A redução de dose também foi menos frequente no grupo intervenção com 16,2% vs 30,8%, uma redução absoluta de risco de 14,7% (IC 95%, 4,6-24,7%). A aderência foi acima de 90% em ambos os grupos. Escalas de qualidade de vida também sugeriram melhora com uso da intervenção. Os eventos adversos foram condizentes com o uso de capecitabina.

Em conclusão, o estudo D-TORCH demonstrou uma redução na frequência de eventos adversos tipo SMP grau 2-3 com uso profilático de diclofenaco gel nas mãos, com menor risco de redução de dose de capecitabina e melhor qualidade de vida.

 

Comentário do avaliador científico:

O estudo demonstra alguns pontos importantes como a viabilidade de estudos de iniciativa do investigador serem realizados para resolver problemas importantes na prática diária e utilizando intervenções de baixo custo. A taxa de SMP no grupo placebo foi abaixo do esperado pelos autores e abaixo do esperado na literatura, talvez pelo uso de hidratante no placebo, como considerado pelos autores.

Ainda assim, não foi comparado com uso de creme de ureia 10% que é comumente utilizado na prática clínica. A escolha de placebo como braço controle não permite afirmar cientificamente que haverá um avanço no manejo de capecitabina na prática clínica de quem já utiliza creme de ureia, porém sugere que o diclofenaco tópico também possa ser eficaz como medida profilática.

Apesar de algumas outras limitações dignas de nota, como o tempo de estudo ser limitado em 12 semanas e o uso apenas em mãos, a aplicação de diclofenaco gel deve passar a fazer parte da rotina de prevenção de toxicidades da capecitabina, especialmente por sua facilidade de uso e baixo custo. Além disso, deve incentivar outros estudos avaliando a combinação de demais terapias profiláticas e sua eficácia para prevenção de SMP associada a outras terapias antineoplásicas.

 

Citação: Akhil Santhosh et al., Topical Diclofenac for Prevention of Capecitabine-Associated Hand-Foot Syndrome: A Double-Blind Randomized Controlled Trial. JCO 0, JCO.23.01730. DOI:10.1200/JCO.23.01730

 

Avaliador científico:

Dr. Gabriel Marques dos Anjos. Coordenador da residência médica de

Oncologia Clínica do Hospital Ernesto Dornelles e oncologista do Grupo

Oncoclínicas/RS.