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SBOC REVIEW

Resultados do estudo randomizado de fase III do uso de Docetaxel como radiossensibilizante em pacientes com câncer de cabeça e pescoço, inelegíveis para quimiorradioterapia baseada em cisplatina

Resumo do artigo:

O tratamento quimiorradioterápico é uma das opções padrão como terapia definitiva ou adjuvante para o carcinoma de células escamosas de cabeça e pescoço localmente avançado. A cisplatina é o agente citotóxico mais utilizado e recomendado pelas diretrizes internacionais, devido ao seu impacto em ganho de sobrevida global. Porém, o tratamento combinado com cisplatina está associado à morbidade considerável e é necessário selecionar os pacientes elegíveis.

Estudos de fase I/II sugeriram que o uso do docetaxel concomitante à radioterapia (RT) é viável e leva a resultados promissores. No entanto, não havia evidência randomizada para comprovar a eficácia desse regime quando administrado no cenário de inelegibilidade à cisplatina.

Esse estudo aberto e de centro único, fase II/III, randomizou 356 pacientes com carcinoma de células escamosas de cabeça e pescoço localmente avançado e inelegíveis à cisplatina, para receber RT isolada ou RT combinada ao docetaxel 15 mg/m2 semanal, por até 7 ciclos. No estudo, 217 pacientes (60,9%) estavam em tratamento definitivo e 139 pacientes (39,1%) em tratamento adjuvante. O desfecho primário foi sobrevida livre de progressão (SLP) em dois anos.

A inexigibilidade à cisplatina foi avaliada pela presença de ao menos um dos seguintes critérios: ECOG PS 2; disfunções orgânicas de grau ≥ 2 (conforme CTCAE), tais como perda auditiva, zumbido ou neuropatia; hipersensibilidade à cisplatina; clearance de creatinina < 50 mL/min; função de órgão limítrofe ou comorbidades que impediam o uso da cisplatina; hipertensão não controlada ou mal controlada; perda de > 10% do peso corporal basal nos últimos 6 meses; desnutrição (< 16 kg/m2); uso de medicamentos nefrotóxicos.

Em um acompanhamento médio de 32,4 meses, a SLP em dois anos foi de 30,3% (IC 95% 23,6%-37,4%) no braço da RT e de 42% (IC 95% 34,6-49,2) no braço de docetaxel-RT, com Hazard ratio (HR) de 0,673 (IC 95% 0,52-0,86). A mediana de sobrevida livre de falha locorregional no braço da RT foi de 5,9 meses (IC 95% 4,9-7,5) e 12,4 meses (IC 95% 8,6-23,5) no braço de docetaxel-RT, com HR de 0,66 (IC 95% 0,51-0,85). A sobrevida global (SG) mediana foi de 15,3 meses (IC 95% 13,1- 22,0) contra 25,5 meses (IC 95% 17,6-32,5), respectivamente, com HR de 0,74 (IC 95% 0,56-0,98). A melhora na SLP e SG foi observada em todos os grupos prognósticos pré-especificados. Eventos adversos (EA) grau 3 ou mais foram observados em 58% dos pacientes que receberam RT isolada e em 81,6% no braço de docetaxel-RT, com destaque para mucosite, odinofagia e dermatite.

Este é o primeiro estudo randomizado que demonstra benefício de um agente radiossensibilizador alternativo em pacientes com carcinoma de cabeça e pescoço localmente avançado, inelegíveis para cisplatina e com indicação de tratamento quimio-radioterápico.

 

 

Patil VM, Noronha V, Menon N, et al. Results of Phase III Randomized Trial for Use of Docetaxel as a Radiosensitizer in Patients with Head and Neck Cancer, Unsuitable for Cisplatin-Based Chemoradiation. Journal of Clinical Oncology. Published online January 27, 2023. DOI: 10.1200/JCO.22.00980.
Resultados do estudo randomizado de fase III do uso de Docetaxel como radiossensibilizante em pacientes com câncer de cabeça e pescoço, inelegíveis para quimiorradioterapia baseada em cisplatina.

 

Comentário da avaliadora científica:

A quimiorradioterapia é um tratamento bem estabelecido para o carcinoma de células escamosas de cabeça e pescoço localmente avançado, seja como terapia definitiva ou adjuvante. A cisplatina é o agente antineoplásico de escolha com resultados comprovados de ganho em sobrevida global.

O grupo de pacientes “inelegíveis à cisplatina” é um desafio na prática clínica, e a busca de regimes alternativos, mas igualmente eficazes, vem ganhando destaque e interesse das instituições financiadoras de pesquisas. Os esquemas mais utilizados nesse cenário são a carboplatina isolada (ou em combinação com 5-fluoruracil) e o cetuximabe, ambos combinados à radioterapia.

O custo do cetuximabe é uma barreira para uso nos países subdesenvolvidos. Isso deve ser levado em consideração se os resultados são semelhantes aos de agentes mais baratos. A combinação de carboplatina e 5-fluorouracil também se mostrou eficaz nos ensaios randomizados, porém, essa combinação não é tão utilizada na prática pelo maior potencial de toxicidade. Tais regimes, porém, foram estudados em populações que seriam elegíveis à cisplatina.

Como o braço controle do estudo aqui comentado recebia radioterapia isolada, ficam dúvidas em relação às diferentes opções de tratamento sistêmico concomitante. A frequência de eventos adversos reportados foi semelhante à observada com cisplatina. Seria interessante esclarecer questões como qual a necessidade de corticoterapia com o docetaxel em doses semanais ou com que frequência foi necessário suporte com fator estimulador de colônia de granulócitos.

O docetaxel pertence ao arsenal de regimes de referência para o câncer de cabeça e pescoço. O presente estudo demonstra ser ele uma alternativa apropriada para concomitância em pacientes inelegíveis a platina. No entanto, como tal quimioterápico não foi comparado com alternativas existentes, não deve ser considerado como o único padrão. Ensaios randomizados são necessários para avaliar se algum regime não-cisplatina seria mais vantajoso que os demais.

 

Avaliadora científica:

Dra. Aline Letícia Kozak
Residência Médica em Oncologia Clínica pelo Hospital Erasto Gaertner, Curitiba-PR
Oncologista Clínica do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Curitiba e Grupo Notredame Intermédica Sul (GNDI Sul), Curitiba-PR