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Sobrevida global em pacientes com câncer endometrial tratados com dostarlimabe em associação com carboplatina e paclitaxel no estudo randomizado ENGOT-EN6/GOG-3031/RUBY [▶ Comentário em vídeo]
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Resumo do artigo:
O estudo ENGOT-EN6/GOG-3031/RUBY parte 1 é um estudo fase 3, randomizado, duplo-cego e multicêntrico, que incluiu 494 pacientes com câncer de endométrio avançado (estágios III ou IV), virgens de tratamento ou com recidiva após mais de 6 meses. Os braços de tratamento consistiam em carboplatina AUC 5 + paclitaxel 175 mg/m² + dostarlimabe 500 mg versus carboplatina AUC 5 + paclitaxel 175 mg/m² + placebo. Após indução de 6 ciclos, a quimioterapia era interrompida, dando lugar à terapia de manutenção com dostarlimabe 1000 mg ou placebo a cada 6 semanas, por um período máximo de 3 anos ou até progressão de doença. O estudo incluiu tanto pacientes com dMMR/MSI-H (31%) quanto pacientes com pMMR/MSS (69%). A amostra era composta majoritariamente por carcinoma endometrioide (71%), mas também foram incluídas histologias de carcinossarcoma (11%), seroso (27%), células claras (4%) e mista (5%). Os desfechos primários avaliados foram sobrevida livre de progressão (SLP) nas populações dMMR/MSI-H e população global, além de sobrevida global (SG) na população geral do estudo.
A primeira análise interina deste estudo, reportada em setembro de 2022, mostrou superioridade do dostarlimabe sobre o placebo, atingido o desfecho primário de SLP na população dMMR/MSI-H (HR 0,28; IC 95% 0,16-0,50; p < 0,0001) e população global (HR 0,64; IC 95%, 0,51-0,80; p < 0,0001), o que levou à sua aprovação pelas principais agências reguladoras como terapia de primeira linha para pacientes com dMMR/MSI-H.
Em junho de 2024, foram apresentados os resultados da segunda análise interina, com maior maturidade de dados para análise de SG. Nesta análise, o dostarlimabe demonstrou um ganho significativo de SG em comparação ao placebo na população geral, com uma redução de 31% no risco de morte (HR 0,69; IC 95%, 0,54-0,89; p = 0,0020), resultando em um ganho mediano de 16,4 meses (44,6 meses para o grupo dostarlimabe contra 28,2 meses para o grupo placebo).
Foi realizada também uma análise exploratória pré-especificada de SG para a população dMMR/MSI-H, a qual evidenciou uma redução significativa do risco de morte com o dostarlimabe em comparação ao placebo (HR 0,32; IC 95%, 0,17-0,63; p = 0,0002). No braço do dostarlimabe, a mediana de SG não foi alcançada, enquanto para o braço placebo foi de 31,4 meses. Para a população pMMR/MSS, observou-se tendência a uma redução do risco de morte que favoreceu o dostarlimabe (HR = 0,79; IC 95%, 0,60-1,04; p = 0,0493), com sobrevida mediana de 34 meses para o dostarlimabe em comparação a 27 meses para o placebo.
Essa análise interina também reportou dados sobre o tempo de progressão após o início de uma linha subsequente de tratamento (SLP2), mostrando resultados favoráveis ao dostarlimabe sobre o placebo na população geral (HR 0,66; IC 95%, 0,52-0,84), na população dMMR/MSI-H (HR 0,33; IC 95%, 0,18-0,63) e na população pMMR/MSS (HR 0,74; IC 95%, 0,57-0,97). Vale ressaltar que esses ganhos foram vistos mesmo com aproximadamente 55% dos pacientes no grupo placebo recebendo imunoterapia em tratamentos subsequentes.
Em termos de toxicidade, o braço com dostarlimabe apresentou mais eventos adversos sérios que o placebo (19,5% vs. 12,2%) e uma maior taxa de descontinuação por eventos adversos (19,1% vs. 8,1%).
Diante dos achados da segunda análise interina, as principais agências reguladoras estenderam a aprovação do dostarlimabe em associação com carboplatina e paclitaxel como opção de primeira linha para todos os pacientes com câncer de endométrio metastáticos, independentemente do status de instabilidade de microssatélite.
Comentário do avaliador científico:
Grandes avanços foram feitos no entendimento do papel da imunoterapia no câncer de endométrio metastático. Além do RUBY, outros estudos como o DUO-E (durvalumabe) e o NRG-GY018 (pembrolizumabe), mostram resultados bastante consistentes de ganhos de SLP com a associação dessa estratégia de tratamento à quimioterapia. Digno de nota, pacientes com dMMR/MSI-H performaram excepcionalmente bem em todos esses estudos, sendo até o momento o subgrupo identificado que mais se beneficia da adição da imunoterapia. Entretanto, há concordância nesses estudos de que alguns pacientes com pMMR/MSS também parecem derivar benefício da associação de imunoterapia – apesar de não ser claro quais seriam esses pacientes – o que aponta para a necessidade da identificação de melhores marcadores de resposta à imunoterapia para essa doença.
Pode-se argumentar que o benefício de SG na população geral do RUBY tenha sido derivado principalmente da população dMMR/MSI-H, mas vale ressaltar que esse subgrupo representava apenas cerca de 20% da amostra de pacientes. Além disso, há uma clara tendência de benefício em SG na população pMMR/MSS, bem como ganho significativo de PSF2. Tais dados foram considerados robustos o suficiente para que o dostarlimabe fosse aprovado para uso em primeira linha, independentemente do status de MMR/MSI.
Por fim, a associação de imunoterapia no cenário de primeira linha tem se mostrado consistente entre os estudos e o ganho em SG visto no RUBY ajuda a consolidar essa estratégia como padrão de tratamento, principalmente para pacientes com dMMR/MSI-H.
Citação:
Powell MA, Bjørge L, Willmott L, Novák Z, Black D, Gilbert L, et al. Overall survival in patients with endometrial cancer treated with dostarlimab plus carboplatin-paclitaxel in the randomized ENGOT-EN6/GOG-3031/RUBY trial. Ann Oncol. 2024 Aug;35(8):728-738. doi: 10.1016/j.annonc.2024.05.546. Epub 2024 Jun 10. PMID: 38866180.
Avaliador científico:
Dr. Daniel Negrini Batista
Oncologista Clínico na Oncologia D’Or e no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP) – São Paulo/SP
Oncologista Clínico pelo ICESP–FMUSP – São Paulo/SP
Instagram: @dnb_onco
Cidade de atuação: São Paulo/SP
Análise realizada em colaboração com a oncologista sênior Dra. Vanessa da Costa Miranda.