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SBOC REVIEW

Surufatinibe em tumores neuroendócrinos extrapancreáticos avançados (SANET-ep): um estudo fase III, duplo-cego e placebo-controlado

Resumo do artigo:

Neste estudo de fase III, o agente oral surufatinibe foi comparado a placebo em pacientes chineses com diagnóstico de tumor neuroendócrino (TNE) extrapancreático (qualquer origem) metastático, de graus 1 ou 2, com progressão dentro de 12 meses a pelo menos duas linhas anteriores de terapia sistêmica (análogo de somatostatina - SSA, quimioterapia, everolimo, interferon ou terapia por radioisótopo). Uso prévio de droga antiangiogênica e pacientes com TNE funcionantes que requeriam uso de SSA foram excluídos.

Os pacientes foram randomizados na proporção 2:1 para receber surufatinibe 300 mg VO contínuo ou placebo até progressão ou intolerância. Os fatores de estratificação foram terapia previa (sim ou não), grau 1 ou 2, e local do tumor primário: A (jejuno, íleo, duodeno, timo e ceco), B (pulmão, estomago, fígado, apêndice, colon ou reto) e C (outro ou 1º desconhecido). O desfecho primário foi sobrevida livre de progressão (SLP) por avaliação local dos investigadores; os desfechos secundários foram taxa e duração de resposta objetiva por RECIST 1.1, toxicidades e qualidade de vida (medida pelas variações de médias pré e pós/durante o tratamento através dos questionários EORTC QLQ-C30 and QLQ-GINET21). O tamanho da amostra foi calculado considerando um poder 90% para detectar uma razão de risco de 0.6 na SLP de surufatinibe em relação ao placebo. A hipótese nula considerou SLP mediana de 8 meses para o grupo placebo. Os dados reportados provêm de analise interina pré-planejada com valor de p = 0.015 (bicaudado).

Foram incluídos 198 pacientes, com características bem balanceadas entre os dois grupos: 47% dos pacientes tinham TNE gastrointestinal e 23% de origem tímica/pulmonar; aproximadamente 2/3 eram G2, 95% não-funcionantes, aproximadamente 2/3 com tempo desde diagnóstico de 24 meses, mais de 80% com tempo de progressão menor que 3 meses antes da randomização, mais de 60% pré-tratados, incluindo 40% já tratados com quimioterapia.

Em análise por intenção de tratamento, a SLP mediana na primeira análise interina por avaliação local foi de 9,2 versus 3,8 meses, favorecendo surufatinibe, com razão de risco de 0,33 (IC95% 0,22 – 0,50; p < 0.0001). Na análise independente, os números foram muito semelhantes: SLP mediana de 7,4 versus 3,9 meses (razão de risco de 0,66; p < 0.037). Todas analises prognosticas de subgrupos mostraram benefício para braço de surufatinibe. A taxa de resposta objetiva foi de 10% para surufatinibe e zero no grupo placebo. A qualidade de vida se manteve estável durante o tratamento, sem diferença entre os grupos.

Os eventos adversos de graus 3 ou maior mais comuns foram hipertensão arterial (36% vs 13%), proteinúria (19% vs zero), anemia (5% vs 3%), elevação de transaminases (4 vs 3%). Eventos sérios relacionados ao tratamento ocorreram em 29% do grupo de surufatinibe vs 13% no placebo, sendo os eventos mais comuns: icterícia, dor abdominal, hemorragia gastrointestinal e anemia.

Baseados nesses dados, o comitê de avaliação independente decidiu pela interrupção do estudo. O cegamento foi aberto e pacientes do grupo placebo puderam cruzar para braço de surufatinibe (43% já haviam recebido surufatinibe off label pós-progressão ao placebo durante esta análise interina).

 

Surufatinib in advanced extra-pancreatic neuroendocrine tumours (SANET-ep): a randomised, double-blind, placebo-controlled, phase 3 study. Jianming Xu et al. Lancet Oncol. 2020 Nov;21(11):1500-1512.doi: 10.1016/S1470-2045(20)30496-4.
Surufatinib em tumores neuroendócrinos extra-pancreáticos avançados (SANET-ep): um estudo fase III, duplo-cego e placebo-controlado.

 

Comentário da avaliadora científica:

Surufatinibe é um inibidor oral de várias vias distintas de sinalização intracelular com ações antinagiogênicas (receptores dos fatores de crescimento vascular endotelial [VEGFR] de tipos 1, 2 e 3), antiproliferativa (receptor 1 do fator de crescimento fibroblástico [FGFR1]) e imunoativadoras (inibição do receptor 1 do fator estimulador de colônias [CSF-1R]). Seu mecanismo de ação misto, antinagiogênico e imunomodulador, é inovador e traz resultados encorajadores num grupo de pacientes com TNE de mau prognóstico (ex. mais de 80% com tempo de progressão menor que 3 meses antes da randomização, 40% já tratados com quimioterapia, SLP mediana inferior a 4 meses no placebo). Além disso, a droga se mostrou ativa em subgrupos com poucas ofertas de tratamento, como TNE de pulmão ou timo. Por outro lado, a principal limitação do estudo é justamente ter incluído tipos muito distintos de TNE, como por exemplo, paragangliomas.

O surufatinibe certamente será uma opção de tratamento para pacientes com TNE. Resta, no entanto, a validação externa dos resultados de segurança do estudo SANET-ep em população ocidental e de segurança eficácia em grupos mais homogêneos de TNE.

 

Avaliadora científica:
Dra. Rachel Riechelmann, MD, PhD
Atualmente diretora do Departamento de Oncologia Clínica do AC Camargo Cancer Center
Orientadora da pós-graduação em Oncologia na Fundação Antônio Prudente e na Faculdade de Medicina da USP
Presidente do GTG – Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais
Membro do Conselho Científico da Sociedade Europeia de Tumores Neuroendócrinos (ENETS)
Membro dos Comitês Educacionais da ESMO em TGI e TNE
Chair – Gastrointestinal do LACOG
Fundadora e supervisora: Programa SBOC de Especialização em TNE
Editora do livro: Methods and Biostatistics in Oncology: Understanding Clinical Research as an Applied Tool, Springer 2018

Formação:
Oncologista clínica e doutorado pela Universidade Federal de São Paulo
Clinical research fellow, Princess Margaret Hospital