SBOC REVIEW

Terapia antiangiogênica como novo tratamento de manutenção para sarcomas avançados
Resumo do artigo:
O estudo EREMISS avaliou o inibidor multiquinase regorafenibe como terapia de manutenção pós-quimioterapia de primeira linha, em pacientes com sarcomas de partes moles avançados. Os resultados evidenciaram que o uso de regorafenibe levou ao aumento de sobrevida livre de progressão (SLP) nessa população.
O EREMISS é um estudo francês multicêntrico de fase II, randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, para o qual foram selecionados pacientes com sarcomas de partes moles não-adipocíticos, metastáticos ou localmente avançados (inoperáveis), que haviam apresentado resposta parcial ou doença estável após 6 ciclos de quimioterapia de primeira linha com esquema que contivesse doxorrubicina.
Foram excluídos pacientes que receberam menos do que os 6 ciclos preconizados, além daqueles com lipossarcoma, sarcoma de Ewing, rabdomiossarcomas alveolar ou embrionário ou sarcomas ósseos, ou aqueles que tivessem usado previamente inibidores de tirosina quinase ou que apresentassem contraindicações ao uso de regorafenibe.
Dos 127 pacientes incluídos, 62 foram alocados para o braço de placebo, enquanto os 67 restantes receberam regorafenibe na dose de 120 mg/dia. O tratamento era realizado continuamente, em ciclos de 4 semanas cada (3 semanas com a medicação, seguidas de 1 semana de pausa).
O desfecho primário do estudo foi SLP, conforme avaliação por exames de imagem (RECIST 1.1) por um comitê central cego e paralelamente pelos próprios investigadores. Desfechos secundários incluíam sobrevida global (SG), melhor resposta tumoral durante a manutenção e tempo para início de uma próxima linha de terapia antineoplásica.
Na população avaliada, o leiomiossarcoma (58,7%) era o subtipo mais comum, seguido do sarcoma pleomórfico indiferenciado (11,9%) e do tumor fibroso solitário maligno (6,3%). A maioria dos pacientes (92,1%) apresentava doença metastática no momento da inclusão no estudo. A maior parte (61,1%) havia recebido doxorrubicina em monoterapia na primeira linha.
A terapia de manutenção com regorafenibe aumentou significativamente a SLP em comparação ao grupo placebo, tanto na análise do comitê central, com medianas de 5,6 vs. 3,5 meses (HR 0,53; IC 95% 0,36-0,78; p = 0,001), quanto na avaliação pelos investigadores locais: medianas de 6,8 vs. 3,6 meses (HR 0,59; IC 95% 0,40-0,85; p = 0,005). O número de pacientes com resposta completa, parcial ou doença estável também foi significativamente (p = 0,001) maior no braço de regorafenibe: 80% vs. 49% (placebo). Houve, ainda, ganho em relação ao tempo livre de novas linhas terapêuticas: em 12 meses, 80,7% dos pacientes no grupo de placebo haviam iniciado um novo tratamento, em comparação a apenas 59,4% no grupo de regorafenibe.
Apesar de numericamente superior, a SG com regorafenibe não apresentou aumento estatisticamente significativo, com mediana de 27,6 meses para o inibidor multiquinase e de 20,5 meses para o placebo (HR 0,78; IC 95% 0,50-1,22; p = 0,28).
Como esperado, os eventos adversos (EA) foram muito mais numerosos no braço de regorafenibe, com risco de EA grau ≥ 3 de 56,3% nesse grupo, em comparação a 4,8% no grupo do placebo. Porém, não houve relato de EA grau 5 e os EA grau ≥ 3 mais frequentes com o inibidor foram, sobretudo, fadiga (9,4%), hipertensão (7,8%) e rash cutâneo (7,8%). Ainda assim, 28,1% dos pacientes interromperam o tratamento com regorafenibe devido a suas toxicidades.
Comentário do avaliador científico:
Os sarcomas de partes moles constituem um grupo heterogêneo de doenças, muitas vezes refratárias às limitadas opções de tratamentos sistêmicos disponíveis, o que reforça a necessidade de novas terapias eficazes. O estudo EREMISS se propôs a investigar o regorafenibe como potencial tratamento de manutenção para essas neoplasias, por sua já conhecida atividade contra subtipos histológicos diversos de sarcomas.
A população selecionada apresentava doenças agressivas, evidenciadas por SLP mediana de apenas 3,5 meses no braço de placebo e pela alta frequência de metástases hepáticas e ósseas, o que torna relevante o ganho demonstrado em SLP.
Nota-se que a dose padrão de 160 mg/dia não foi utilizada, entendendo-se que uma dose menor seria mais bem tolerada e suficiente num cenário de manutenção. Ainda assim, a toxicidade ao tratamento não foi desprezível, levando à interrupção em 28,1% dos pacientes.
Tendo em vista a escassez de opções terapêuticas, esses resultados apontam para o regorafenibe como possibilidade concreta de tratamento adicional nesse cenário. O impacto dos EA, no entanto, faz valer a ressalva de que é fundamental uma familiaridade com o manejo dessa medicação para a otimização do seu benefício clínico.
Citação: Penel N, Italiano A, Wallet J, Chaigneau L, Verret B, Firmin N, et al. Regorafenib as maintenance therapy after first-line doxorubicin-based chemotherapy in advanced non-adipocytic soft tissue sarcomas patients: a double-blind randomised trial. Ann Oncol. 2025 Aug;36(8):944-953. doi: 10.1016/j.annonc.2025.03.024.
Avaliador científico:
Oncologista clínico pelo Hospital Sírio-Libanês – São Paulo/SP
Oncologista clínico na Rede DASA/Américas e Coordenador de Oncologia Clínica no Hospital Nove de Julho Alphaville – São Paulo/SP
Título de Especialista em Oncologia Clínica pela SBOC/AMB
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Cidade de atuação: São Paulo/SP