SBOC REVIEW
Terapia de deprivação androgênica de curta duração combinada à radioterapia para tratamento de resgate após prostatectomia radical para câncer de próstata (GETUG-AFU 16): seguimento de 112 meses do estudo fase 3, randomizado
Resumo do artigo:
O câncer de próstata apresenta-se, em sua grande maioria, como doença localizada. Neste estágio, há diversas opções terapêuticas, que incluem desde vigilância ativa até prostatectomia radical (PR). Apesar da elevada chance de cura, cerca de 30% dos pacientes submetidos a PR apresentarão recidiva bioquímica (RB), principalmente dentro dos primeiros cinco anos após procedimento cirúrgico. Fatores como Escore de Gleason, valor inicial de Antígeno Prostático Específico (PSA) e estadiamento “T” são capazes de predizer o risco de RB. No momento dessa recidiva, os principais objetivos do tratamento são controle de PSA, aumento o tempo livre de metástase e aumento de sobrevida. Para isso, estratégias de tratamento de resgate são utilizadas, como por exemplo radioterapia (RT), bloqueio androgênico central (BH) e uso de antiandrogênicos.
Em 2016, Christian Carrie e colaboradores publicaram o estudo fase 3 GETUG-AFU 16 que buscou avaliar se a adição de BH (Zoladex™ 10,8 mg, via subcutânea, a cada 3 meses, por 2 ciclos, iniciado no primeiro dia de RT) à RT (em leito prostático, com ou sem irradiação de drenagem linfática) resultaria em melhora de Sobrevidas Livre de Progressão (SLP) Bioquímica ou Livre de Progressão Clínica (ou ambos), sem prejuízo da qualidade de vida. Este estudo incluiu 743 pacientes com RB, determinados pelo critério da Associação Americana de Urologia (sigla em inglês AUA), todos com PSA, à recidiva, menor que 2 ng/ml. Nestsa primeira publicação, após um seguimento mediano de 63 meses, a adição de Zoladex™ à RT trouxe ganho em SLP em 5 anos: 80% no braço RT+BH versus 62% naqueles que receberam apenas RT, com Hazard Ratio (HR), 0.5 e p < 0,0001. Em termos de qualidade de vida, a análise foi feita apenas no baseline, 1 um e 5 anos de tratamento, não se detectando diferenças clinicamente relevantes, exceto por piora na atividade sexual no tempo 1 (um) ano no braço BH+RT comparado ao braço RT. Ademais, não houve diferença nas toxicidades gastrointestinais e geniturinárias, agudas e crônicas.
Nesta publicação de 2019, Christian Carrie e colaboradores trazem atualização de SLP e dados de Sobrevida Livre de Metástase (SLM) após seguimento mediano de 112 meses. Em termos de SLP, a combinação RT+BH resultou em 64% de SLP em 10 anos versus 49% no braço RT, com HR, 0.54 e p < 0,0001. Quanto à SLM, a adição de BH à RT resultou em maior SLM em 10 anos, sendo 75% no braço combinação versus 69% no braço RT. Em ambos os desfechos, o benefício foi detectado em todos os subgrupos. Os dados de Sobrevida Global (SG) ainda estão imaturos, com poucas mortes por câncer de próstata e SG em 10 anos de cerca de 85% nos dois braços de tratamento.
Short-term Androgen Deprivation Therapy Combined with radiotherapy as salvage treatment after radical prostatectomy for prostate cancer (GETUG-AFU 16): a 112-month follow-up of a phase 3, randomised trial. Christian Carrie et al., Lancet Oncol. Volume 20, ISSUE 12, P1740-1749, December 2019.
Terapia de Deprivação Androgênica de Curta Duração Combinada a Radioterapia para Tratamento de Resgate Após Prostatectomia Radical para Câncer de Próstata (GETUG-AFU 16): Seguimento de 112 meses do Estudo Fase 3, Randomizado.
Comentários do editor:
- Apesar da ausência de maturidade dos dados de SG, os ganhos de SLP e SLM em favor da combinação de BH+RT, após mais de 10 anos de seguimento, reforçam a importância deste tratamento no cenário de RB após prostatectomia radical.
- O benefício deu-se mesmo nos grupos do bom prognóstico, aqui caracterizados por Escore de Gleason < 8, Tempo de Duplicação de PSA maior que 6 meses e características patológicas de doença menos agressiva (ao diagnóstico). Deve-se ressaltar que nenhum paciente deste estudo apresentava PSA detectável após prostatectomia radical e que quase 100% deles tinham PSA < 1,0 ng/ml no momento do início da terapia de resgate.
- Esses dados vêm em consonância com os dados do estudo RTOG 9601 (apesar das diferenças nas populações dos estudos), reforçando a importância da detecção precoce de recidiva bioquímica e da adição de Terapia Antiandrogênica à Radioterapia de Resgate, em pacientes com Recidiva Bioquímica após prostatectomia.
- Em relação à qualidade de vida, apesar do viés do momento da análise deste desfecho (questionários de qualidade de vida não foram aplicados durante a fase de concomitância do tratamento), não houve perda expressiva em qualidade de vida com adição de 6 meses de BH.
Editor:
Dr. Eduardo Saadi Neto
Membro da SBOC; Preceptor da Residência Médica de Oncologia Clínica da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto-SP; Sub-investigador em Pesquisa Clínica do Centro Integrado de Pesquisa (CIP) de São José do Rio Preto-SP; e Oncologista Clínico do Centro de Tratamento Oncológico (CTO) de Ribeirão Preto-SP.
Revisora:
Dra. Adriana Hepner
Membro da SBOC; Oncologista Clínica pelo Hospital Sírio Libanês; Médica do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP). Atualmente, participa como fellow clínica do Programa de Oncologia Cutânea do Melanoma Institute Australia, em Sydney.