SBOC REVIEW
Toripalimabe ou placebo mais quimioterapia como tratamento de primeira linha em carcinoma de nasofaringe avançado: um estudo de fase 3 randomizado e multicêntrico
Resumo do artigo:
Neste estudo de fase III, internacional, duplo cego, 289 pacientes com carcinoma de nasofaringe recidivado ou metastático e sem tratamento prévio nesse cenário de doença foram randomizados 1:1 para receberem quimioterapia com cisplatina e gemcitabina combinada a toripalimabe, um anticorpo monoclonal anti-PD-1, ou placebo a cada 3 semanas por até 6 ciclos, seguido de toripalimabe ou placebo de manutenção até progressão de doença. Os pacientes foram estratificados por performance status (ECOG 0 ou 1) e estágio da doença (recidivada ou metastática ao diagnóstico). Participaram do estudo 35 centros da China, Taiwan e Cingapura.
Na análise interina pré-especificada, após 130 eventos de progressão ou óbito, o desfecho primário do estudo, sobrevida livre de progressão (SLP) acessada pelo comitê independente cego, foi significativamente superior no braço toripalimabe, com uma SLP mediana de 11,7 versus 8,0 meses para o grupo placebo (RR=0,52; IC 95% 0,36-0,74; p=0,0003) na população por intenção de tratar. A estimativa de SLP em 1 ano foi de 49,4% no braço toripalimabe e 27,5% no braço placebo, um aumento absoluto de 21,5%. Esse aumento de SLP foi observado em todos os subgrupos analisados, incluindo pacientes PD-L1 positivos (definidos como expressão de PD-L1 ≥ 1% em células tumorais ou do infiltrado imune) com mediana de 11,4 versus 8,2 meses (HR=0,59; IC 95% 0,39-0,89; p=0,012) ou PD-L1 negativos, com mediana de 11,0 versus 6,0 meses (HR=0,39; IC 95% 0,15-0,81; p=0,01) para toripalimabe e placebo, respectivamente.
A taxa de resposta objetiva por RECIST 1.1, também acessada pelo comitê independente cego, foi significativamente superior para toripalimabe (77,4%; IC 95% 69,8-83,9) em comparação ao placebo (66,4%; IC 95% 58,1-74,1; p=0,0335), com taxa de resposta completa de 19,2% e 11,2% respectivamente. A duração de resposta também foi significativamente superior no braço toripalimabe, com uma mediana de 10,0 versus 5,7 meses para placebo (RR=0,50; IC95%: 0,33-0,58; p=0,065).
Com um seguimento mediano de 17,9 meses no braço toripalimabe e 17,4 meses no braço placebo e um total de 64 óbitos reportados (25 no braço toripalimabe e 39 no braço placebo), houve uma redução de 40% no risco de morte com o uso de toripalimabe (RR=0,60; IC 95% 0,36-0,99; p=0,0462), entretanto a sobrevida global (SG) mediana ainda é imatura em ambos os braços. A estimativa de SG em 1 ano é de 77,8% para toripalimabe e 66,3% para placebo.
A incidência de eventos adversos grau 3 ou superior foi semelhante em ambos os braços (89,0 e 89,5% para toripalimabe e placebo, respectivamente), assim como a incidência de eventos adversos fatais (2,7 versus 2,8%) e eventos adversos sérios (41,4 versus 43,4%). Não houve aumento de toxicidades relacionadas a quimioterapia com a adição de toripalimabe e a incidência de eventos adversos imuno-mediados foi condizente com os dados prévios com outros inibidores de PD1/PD-L1. Os eventos adversos imuno-mediados mais comuns foram hipotireoidismo (17,8 versus 8,4%), pruridro (6,2 versus 3,5%), rash (8,9 versus 4,2%), aumento de TGO (4,8 versus 1,4%) e aumento de TGP (4,1 versus 1,4%).
Toripalimab or placebo plus chemotherapy as first-line treatment in advanced nasopharyngeal carcinoma: a multicenter randomized phase 3 trial. Nat Med. 2021 Aug 2. doi: 10.1038/s41591-021-01444-0.
Toripalimabe ou placebo mais quimioterapia como tratamento de primeira linha em carcinoma de nasofaringe avançado: um estudo de fase 3 randomizado e multicêntrico.
Comentário do avaliador científico:
Baseado nos resultados do estudo JUPITER-02, a combinação de toripalimabe, cisplatina e gemcitabina é opção de tratamento em primeira linha para pacientes com carcinoma de nasofaringe recidivado ou metastático, podendo ser considerada como padrão em locais onde a droga estiver disponível. Apesar da ausência de benefício significativo em SG até o momento, a SLP pode ser um desfecho substituto para SG, como já demonstrado em doença localmente avançada. E, em geral, ganhos de SLP se traduzirem posteriormente em ganhos de SG nos estudos de inibidores de checkpoint. Estes dados seriam transponíveis à população ocidental visto que a maioria dos nossos pacientes apresenta doença EBV relacionada, e há dados do benefício da associação de imunoterapia com quimioterapia em carcinoma de células escamosas de outros sítios primário da cabeça e pescoço.
Os resultados de outro estudo com o mesmo desenho utilizando camrelizumabe, outro anti-PD-1 (Yang Y et al. Lancet Oncol 2021; 22: 1162-1174) sugerem um efeito de classe nesse cenário, entretanto não considero adequado a transposição destes resultados para outras combinações de quimioterapia com imunoterapia, utilizando drogas como nivolumabe ou pembrolizumabe, pela falta de resultados com estas combinações.
Avaliador científico:
Dr. Thiago Bueno de Oliveira
Oncologista clínico pelo AC Camargo
Oncologista Clínico Titular e Líder Clínico do Centro de Referência em Câncer de Cabeça e Pescoço do AC Camargo Cancer Center – São Paulo – SP
Membro do GBCP (Grupo Brasileiro de Câncer de Cabeça e Pescoço) e do LACOG – Head and Neck (Latin American Cooperative Oncology Group)