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SBOC REVIEW

Tratamento perioperatório com imunoterapia para tumores escamosos de cabeça e pescoço

Resumo do artigo:

O estudo Keynote-689 avaliou o acréscimo do pembrolizumabe, um anticorpo monoclonal anti-PD1, em regime neoadjuvante e adjuvante no tratamento dos carcinomas escamosos localmente avançados de cabeça e pescoço de diferentes sítios topográficos. O estudo mostrou ganho no seu desfecho primário sobrevida livre de eventos (SLE) em uma população de elevado risco de recorrência.

O Keynote-689 é um estudo de fase III, randomizado, controlado, aberto e multicêntrico, no qual os pacientes foram randomizados para o braço padrão com cirurgia seguida de radioterapia adjuvante com ou sem quimioterapia adjuvante, ou o braço investigacional com pembrolizumabe neoadjuvante e adjuvante associado ao tratamento do braço padrão.

O desfecho primário foi SLE, avaliado por um time central independente e cego, por meio dos critérios de avaliação de resposta em tumores sólidos (RECIST 1.1). A SLE foi definida como o tempo desde a randomização até a progressão da doença radiográfica, ocorrendo durante a fase neoadjuvante e impedindo a cirurgia, progressão ou recidiva local, ou a distância em imagens, ou biópsia, ou morte por qualquer causa. Essa avaliação foi feita em três subgrupos: o primeiro com o combined positive score (CPS) ≥ 10, o segundo com CPS positivo ≥ 1 e o último foi a população total independente do CPS. O CPS no estudo foi definido pelo número de células coradas pelo programmed death ligand 1 (PD-L1) – incluindo células tumorais, macrófagos e linfócitos dividido pelo número total de células tumorais.

Os desfechos secundários incluíram a sobrevida global avaliada nas subpopulações com CPS ≥ 10, CPS ≥ 1 e população total; a resposta patológica maior, caracterizada por <10% de células tumorais viáveis na peça cirúrgica; a presença de resposta patológica completa, segurança e perfil de toxicidade.

O estudo randomizou 714 pacientes (363 para o pembrolizumabe e 351 para o controle), entre dezembro de 2018 e outubro de 2023, com 96% da população com CPS ≥ 1 e, aproximadamente ,65% apresentando um CPS ≥ 10.

Após o tratamento neoadjuvante, no grupo do pembrolizumabe 321 pacientes (88,4%) realizaram cirurgia, enquanto no grupo padrão 308 pacientes (87,7%) foram abordados. A maioria dos atrasos na terapia cirúrgica aconteceu no grupo da imunoterapia, o que pode refletir um desafio na intensificação do tratamento.

O tratamento adjuvante foi iniciado em 267 pacientes de cada grupo, o que representa 73,6% e 76,1% nos braços de imunoterapia e padrão, respectivamente. O início do tratamento pós-operatório foi mais precoce no subgrupo exposto à imunoterapia, com 46,4% iniciando o tratamento em até 06 semanas, enquanto apenas 34,8% no controle seguiram essa programação.

As características demográficas e relacionadas a doença foram equilibradas entre os braços. Entretanto, ao analisar o tratamento instituído, é possível perceber que fatores patológicos de alto risco foram identificados em 118 participantes (32,5%) do grupo do pembrolizumabe e 156 participantes (44,4%) do grupo de controle. A exposição à cisplatina também foi menor no grupo do pembrolizumabe (38,9%) em relação ao controle (50,5%).

Na análise do desfecho primário, na população CPS ≥ 10, a mediana de SLP foi de 59,7 meses (41,1 – NR, IC 95%) no grupo do pembrolizumabe e 26,9 meses (18,3 – 51,5; IC 95%) no grupo controle, com um hazard ratio (HR) de progressão, recorrência ou morte de 0,66 (0,49 – 0,88; IC 95%, P = 0,004). Em 03 anos, 59,8% (52,3 – 66,5; IC 95%) e 45,9% (38,0 – 53,4 IC 95%) dos pacientes estavam vivos e sem eventos relacionados ao câncer, respectivamente.

Além disso, na análise sequencial da população CPS ≥ 1, o desfecho primário foi igualmente positivo com uma média de SLP de 59,7 meses (37,9 – NR; IC 95%) no grupo do pembrolizumabe e 29,6 meses (19,5 – 41,9; IC 95%) no grupo controle, com um HR de progressão, recorrência ou morte de 0,70 (0,55 – 0,89; IC 95%; P= 0,003). Em 03 anos, 58,2% (51,9 – 64,0; IC 95%) e 44,9% (38,4 -51,2; IC 95%) dos pacientes estavam vivos e sem eventos relacionados ao câncer, respectivamente.

Na população total, a SLP foi de 51,8 meses (37,5 – NR; IC 95%) no grupo do pembrolizumabe e 30,4 meses (21,8 – 50,1; IC 95%) no grupo controle, com um HR de progressão, recorrência ou morte de 0,73 (0,58 – 0,92; IC 95%; P= 0,008). Em 03 anos, 57,6% (51,5 – 63,3; IC 95%) e 46,4% (40,0 – 52,5; IC 95%) estavam vivos e sem eventos relacionados ao câncer, respectivamente.

Nos desfechos secundários, a análise de sobrevida global (SG) foi avaliada na população CPS ≥ 10, com uma sobrevida estimada em 3 anos de 68,2% (61,3 – 74,2; IC 95%) no grupo da imunoterapia e 59,2% (51,7 – 65,9; IC 95%) no grupo controle, com HR de 0,72 (0,52 – 0,98; IC 95%; P= 0,04). Contudo, pelo desenho do estudo, não houve significância estatística nesse dado para prosseguir com a análise de outros subgrupos.

No resultado de outro desfecho secundário, nenhum paciente com CPS < 1 ou com dados faltantes apresentou resposta patológica maior, ou completa, com o tratamento.

Os eventos adversos de qualquer grau pelo CTCAE (common terminology criteria for adverse event) ocorreram em 81,4% dos pacientes do braço do pembrolizumabe e em 81,9% dos pacientes no braço de controle, enquanto os eventos grau 3 aconteceram em 44,6% e 42,9%, respectivamente. O evento adverso mais comum grau 3 ou mais em ambos os grupos foi a estomatite com 11,6% no grupo do pembrolizumabe e 13,3% no grupo controle.

 

Comentários do avaliador científico:

Atualmente, para essa doença, nós temos aprovação de imunoterapia apenas no cenário metastático de primeira e segunda linha, com Keynote 048 e Checkmate 141, respectivamente. O estudo Keynote 689 avaliou a inclusão da imunoterapia (pembrolizumabe) no cenário perioperatório (neoadjuvante e adjuvante), com desfecho primário positivo. Embora o estudo tenha o potencial para mudar o tratamento dos tumores escamosos ou epidermóides de cabeça e pescoço, alguns pontos merecem ser observados.

Algumas subpopulações foram pouco representadas no desenho do estudo. O número baixo de pacientes HPV positivo, CPS negativo e de tumores de hipofaringe dificulta a interpretação dos resultados do estudo nesses grupos.

Outro ponto importante é a ausência de quimioterapia na fase neoadjuvante do protocolo. No estudo Keynote 048, de primeira linha metastática, a combinação de quimioterapia com imunoterapia ou mesmo a combinação de quimioterapia com cetuximabe gerou maior taxa de resposta objetiva em relação à imunoterapia com pembrolizumabe isolado. Portanto, uma maior redução do volume de doença seria importante para o planejamento cirúrgico e para a avaliação dos desfechos secundários, resposta patológica completa e resposta patológica maior.

Por fim, os dados de sobrevida global ainda são imaturos. Logo se faz necessário maior tempo de seguimento para avaliar o real impacto da entrada da imunoterapia em um cenário mais precoce.

 

Citação: Uppaluri R, Haddad RI, Tao Y. et al. KEYNOTE-689 Investigators. Neoadjuvant and Adjuvant Pembrolizumab in Locally Advanced Head and Neck Cancer. N Engl J Med. 2025 Jul 3;393(1):37-50. doi: 10.1056/NEJMoa2415434.

 

Avaliador científico:

Dr. Daniel Gonçalves Kischinhevsky

Oncologista clínico pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA) – Rio de Janeiro/RJ

Oncologista clínico no INCA e no Grupo Américas – Rio de Janeiro/RJ

Pesquisador no Instituto Américas-RJ

Instagram: daniel_kischin

Cidade de atuação: Rio de Janeiro/RJ