Instalar App SBOC


  • Toque em
  • Selecione Instalar aplicativo ou Adicionar a lista de início

SBOC REVIEW

Tumores Cabeça e Pescoço – Especial ASCO

Cabozantinibe versus placebo em pacientes com câncer de tireoide diferenciado refratário à terapia com iodo radioativo e que progrediram após terapia anterior com anti-VEGFR: Resultados do estudo de fase 3 COSMIC-311

Resumo do artigo:

Pacientes com carcinoma diferenciado da tireoide refratários à iodoterapia radioativa e que apresentam progressão de doença durante o tratamento com inibidor de múltiplas quinases anti-VEGFR têm um prognóstico muito sombrio. Essa foi a população estudada no estudo COSMIC-311, de desenho randomizado (proporção 2:1), duplo-cego, comparando cabozantinibe (60 mg VO uma vez ao dia, continuadamente) a placebo, com possibilidade de os pacientes alocados no braço placebo receberem cabozantinibe (crossover) após progressão de doença. Os pacientes tinham que ser refratários ou inelegíveis à iodoterapia radioativa, ter tido progressão de doença durante ou após tratamento com lenvatinibe e/ou sorafenibe, ter uma boa condição clínica (ECOG 0-1) e TSH < 0,5 mIU/L.

A primeira análise interina (planejada) do desfecho primário sobrevida livre de progressão, com um seguimento mediano de 6,2 meses e realizada após 187 pacientes terem sido randomizados, mostrou um significativo benefício com redução de 78% (HR = 0,22 [0,13-0,36], p < 0,0001), observado em todos os subgrupos de pacientes. A mediana de sobrevida no braço cabozantinibe não havia sido alcançada, enquanto foi de parcos 1,9 meses no braço placebo. As curvas do desfecho secundário sobrevida global já mostram uma separação em favor do braço cabozantinibe logo no início do seguimento (HR = 0,54 [0,27-1,11]), mas ainda sem significância estatística pelo reduzido número de eventos observados. Cerca de metade dos pacientes do braço cabozantinibe tiveram algum evento adverso grau 3 ou maior, o mais prevalente dos quais foi síndrome mão-pé (10%), com necessidade de redução de dose em 78% dos pacientes em função de evento adverso.

 

Cabozantinib versus placebo in patients with radioiodine-refractory differentiated thyroid cancer who have progressed after prior VEGFR-targeted therapy: Results from the phase 3 COSMIC-311 trial. ABSTRACT 6001.
Cabozantinibe versus placebo em pacientes com câncer de tireoide diferenciado refratário à terapia com iodo radioativo e que progrediram após terapia anterior com anti-VEGFR: Resultados do estudo de fase 3 COSMIC-311.

 

Comentários Dr. Augusto Mota:

Os resultados do estudo COSMIC-311 devem ser comemorados, pois mostram claro benefício do uso de cabozantinibe para uma população de pacientes cujas opções de tratamento eram extremamente limitadas, se existentes. Esse estudo muda a prática clínica ao postergar a progressão de doença, com mediana ainda a ser definida com a maturação dos dados, mas certamente muito superior aos 1,9 meses observados no braço placebo. Importante salientar que também se abrem as curvas de sobrevida, a despeito da permissão de uso de cabozantinibe pelos pacientes inicialmente alocados no braço placebo, o que sabidamente dificulta a demonstração de benefício de sobrevida global. Apesar da necessidade de redução de dose em 78% dos pacientes alocados para o braço do cabozantinibe, o que culminou em dose média de 42 mg (ante os 60 mg determinados pelo protocolo), pode-se considerar toxicidade aceitável, sobretudo quando olhado à luz do benefício clínico atingido. Diante dos dados apresentados é razoável considerar cabozantinibe o novo padrão de tratamento para essa população de pacientes.

 


 

JUPITER-02: Estudo randomizado, duplo-cego, fase III de toripalimabe ou placebo mais gencitabina e cisplatina como tratamento de primeira linha para carcinoma nasofaríngeo recorrente ou metastático (NPC)

Resumo do artigo:

O estudo JUPITER-02, apresentado na sessão plenária da ASCO 2021, trouxe os resultados da comparação de toripalimabe (um anticorpo anti-PD-1 [240 mg IV, 3/3 semanas]) versus placebo, ambos em associação a quimioterapia sistêmica com gencitabina + cisplatina em doses usuais (seis ciclos), para o tratamento de pacientes com carcinoma de nasofaringe recidivado ou metastático previamente não tratados para doença avançada/recidivada. Após o término dos seis ciclos de quimioterapia os pacientes que não tiveram progressão de doença receberam manutenção com toripalimabe ou placebo, conforme a alocação inicial, até progressão de doença ou toxicidade proibitiva. Esse estudo randomizado (1:1), multicêntrico (apenas em países asiáticos) teve como desfecho primário sobrevida livre de progressão (SLP) de doença. Um total de 146 pacientes foram randomizados para o braço toripalimabe (115 continuaram na manutenção) e 143, para o braço placebo (118 continuaram na manutenção), virtualmente todos com tumor não queratinizante, e 3/4 dos quais com tumor mostrando positividade para PD-L1. A análise por revisores independentes mostraram um benefício (para todos os subgrupos avaliados) do uso do toripalimabe no desfecho primário, com medianas de SLP de 11,7 meses e 8,0 meses, respectivamente para toripalimabe e placebo (HR = 0,52 [0,36-0,74], p=0,0003). Ao final de um ano 49,4% dos pacientes que usaram toripalimabe estavam livres de progressão de doença, ante 27,9% dos pacientes que receberam placebo. Foi observado benefício também no desfecho secundário de sobrevida global, com medianas não alcançadas em nenhum dos dois grupos, mas com sobrevida global nos grupos toripalimabe e placebo respectivamente de 91,6% versus 87,1% (1 ano), e 77,8% versus 63,3% (2 anos). O perfil de toxicidade foi semelhante nos dois grupos.

 

JUPITER-02: Randomized, double-blind, phase III study of toripalimab or placebo plus gemcitabine and cisplatin as first-line treatment for recurrent or metastatic nasopharyngeal carcinoma (NPC). ABSTRACT LBA2.
JUPITER-02: Estudo randomizado, duplo-cego, fase III de toripalimabe ou placebo mais gencitabina e cisplatina como tratamento de primeira linha para carcinoma nasofaríngeo recorrente ou metastático (NPC).

 

Comentários Dr. Augusto Mota:

Os resultados apresentados credenciam o toripalimabe como tratamento padrão para pacientes com carcinoma de nasofaringe metastático/recidivado, pelo menos em populações asiáticas. Considerando que o toripalimabe ainda não está aprovado para uso (e sequer disponível), uma pergunta relativamente óbvia é: podemos extrapolar os dados do estudo JUPITER-02 para os demais anticorpos monoclonais anti-PD-1 à disposição para uso? A resposta mais razoável é que não. Mesmo considerando resultados muito parecidos e igualmente promissores de um outro estudo apresentado na ASCO 2021, no qual foi avaliado o anticorpo monoclonal camrelizumabe comparado com placebo em população semelhante (resumo 6000), a sugerir um efeito de classe, recomenda-se prudência na extrapolação desses dados para os pacientes não asiáticos com carcinoma de nasofaringe.

 


 

Capecitabina metronômica como terapia adjuvante em carcinoma nasofaríngeo loco regionalmente avançado: Fase 3, multicêntrico, ensaio controlado randomizado

Resumo do artigo:

Este estudo de fase 3 avaliou o efeito da capecitabina usada em dose metronômica (650 mg/m2 2 vezes ao dia, continuamente, durante um ano) em pacientes com carcinoma de nasofaringe de alto risco de recidiva (estágios III – IVA, excluindo T3-4N0 e T3N1), tratados inicialmente com radioterapia (IMRT) e cisplatina concomitante (2 a 3 ciclos, 100 mg/m2). Tendo como desfecho primário a sobrevida livre de falha terapêutica, o estudo recrutou 406 pacientes (predomínio de T3-4 e N2-3) para ter erro tipo alfa bicaudal de 0,05 e um poder de 80% de detectar uma redução de risco do desfecho primário de 48%, razão de risco (RR) de 0,52. Quimioterapia de indução e os 3 ciclos de cisplatina concomitante foram usados em aproximadamente 3/4 dos pacientes. Os pacientes do braço capecitabine foram tratados por uma média de 12 meses, com 98% de intensidade de dose. Os resultados mostraram uma sobrevida livre de falha terapêutica em três anos de 85,3% e 75,7%, respectivamente para capecitabina e placebo (RR 0,50 [0,32-0,79], p=0,002). Sobrevida global em 3 anos foi de 93,3% e 88,6%, respectivamente para capecitabina e placebo (RR 0,44 [0,22-0,88], p=0,018). Análise de subgrupo mostrou benefício em todos os subgrupos. O tratamento foi bem tolerado, com todos os efeitos colaterais grau 3 na casa do dígito único, o mais prevalente dos quais tendo sido síndrome mão-pé (9%), e com necessidade de redução de dose em 18% dos pacientes.

 

Metronomic capecitabine as adjuvant therapy in locoregionally advanced nasopharyngeal carcinoma: A phase 3, multicenter, randomized controlled trial. ABSTRACT 6003.
Capecitabina metronômica como terapia adjuvante em carcinoma nasofaríngeo loco regionalmente avançado: Fase 3, multicêntrico, ensaio controlado randomizado.

 

Comentários Dr. Augusto Mota:

Este estudo bem desenhado de fase 3 mostra um benefício clinicamente significativo do uso de capecitabina em dose metronômica no tratamento adjuvante para pacientes com carcinoma de nasofaringe de alto risco de recidiva, observado em todos os subgrupos avaliados. Isso inclui os 78% de pacientes que haviam recebido quimioterapia neoadjuvante à base de platina. No entanto, é importante ressaltar as limitações do estudo, começando pelo fato de os pacientes recrutados terem tido diagnóstico de carcinoma não queratinizante de células escamosas, entidade comum na Ásia, mas menos incidente em países não asiáticos. Não sabemos ao certo se os dados podem ser extrapolados para os tumores queratinizantes que predominam no mundo ocidental. Além disso, resta saber se o desempenho da capecitabina seria o mesmo tivesse esse estudo sido conduzido em população não oriental, haja vista que estudos anteriores com outras fluropirimidinas orais usadas em tratamento de tumores do trato gastrointestinal mostraram resultados diferentes quando comparadas as populações asiáticas e ocidental, sendo inferior nessa última. Uma outra limitação importante é a natureza não cega do estudo, atenuada pelo fato de os radiologistas revisores externos desconhecerem a que grupo pertenciam os pacientes. Esse estudo tem potencial para mudar conduta no manejo de pacientes com carcinoma de nasofaringe localmente avançado e com alto risco de recidiva, ao menos nos países com alta incidência da doença na sua forma não queratinizando. Ressalte-se que um outro estudo de fase III (Miao, e colegas, resumo 6005) explorando o papel da capecitabina adjuvante nessa população de pacientes, ainda que com diferenças metodológicas notáveis, apontou para a mesma direção de haver benefício com a estratégia da adjuvância. Nos países ocidentais, contudo, é necessário exercitar cautela ao extrapolar os dados.

 

 

Avaliadoro científico:

Dr. Augusto Mota
Coordenador do Comitê de Tumores de Cabeça e Pescoço SBOC (Biênio 2019-2021)
Fellowship em Oncologia Clínica Na Universidade Yale
Oncologista clínico na Clínica AMO