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SBOC REVIEW

Atezolizumabe associado a enzalutamida versus enzalutamida isolada no câncer de próstata resistente à castração: estudo de fase 3 randomizado

Resumo do artigo:

O estudo de fase 3 The IMbassador250 alocou 759 pacientes entre 2017 e 2018, todos portadores de câncer de próstata metastático resistentes à castração e que haviam progredido durante uso de abiraterona. Em uma alocação cega, foram randomizados 1:1 para receberem atezolizumabe (ATZ) 1200 mg a cada três semanas em associação com enzalutamida (ENZ) (braço experimental) ou ENZ monoterapia (braço controle). Ambos os braços seguiram recebendo os referidos esquemas até progressão ou toxicidade limitante. O desfecho principal (EP) do estudo foi sobrevida global (SG) na população com intenção de tratar (ITT), seguido por sobrevida livre de progressão radiológica (rSLP) e de PSA (psaP), taxa de resposta (TR), além de segurança. Havia uma análise pré-planejada para que, através de imuno-histoquímica (IMH) e/ou sequenciamento gênico (NGS), amostras fossem estudadas para busca de possíveis biomarcadores.

O estudo foi interrompido precocemente devido a resultados da primeira análise pré-planejada realizada por comitê independente. Enquanto SG mediana foi de 16,6 meses para o braço da ENZ, aqueles expostos a combinação de ATZ e ENZ alcançaram 15,2 meses (HR 1,12, P=0,28) (figura 1).

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Figura 1: associação de antiandrógeno e imunoterapia não atingiu desfecho primário.

Da mesma forma, rSLP não foi superior no braço experimental (HR: 0,90) nem psaP (HR: 1,04). Atenção merece a avaliação de resposta: um número maior de respondedores foi identificado no grupo da associação, o que levanta a hipótese de que uma população ainda desconhecida possa se beneficiar dessa estratégia.

Dos eventos adversos (EA), nenhuma nova ocorrência que mereça destaque. Como esperado, a combinação ocasionou maior número de eventos graves (grau 5: 4,3% versus 3,2%). Em ambas as populações, 5,3% dos doentes suspenderam o tratamento por EA.

Dos 759 doentes, 750 possuíam tecido para análise molecular. Desses, 680 pacientes tiveram seus tecidos analisados, sendo que 280 em material da fase sensível a hormônio, enquanto os outros 400 doentes tinham tecido coletado em fase resistente a castração. Foram realizadas comparações entre ambas as fases (hormônio sensível ou resistente) de alguns possíveis alvos: alteração de dano de DNA (DDR), PTEN, PD-L1 nas células imunes, assinatura gene T efetor e amplificação do receptor androgênico.

Os resultados aqui encontrados reforçam a teoria de ser o câncer de próstata um “tumor frio”, baseado, dentre outros, por um baixo índice de células T efetoras. Além disso, expressão de PD-L1 >5% é bastante incomum, dando mais respaldo a hipótese de ser um câncer “pouco responsivo” a imunoterapia.

Em relação aos biomarcadores, assinatura gênica de células T efetoras mais elevada favoreceu o aumento de eficácia a ATZ (HR 0,73). PD-L1 > 5% (IC2/3) foi observado em 3% dos pacientes medido pelo Ventana SP142 e refletiu ganho em termos de SLP (HR: 0,28) nos pacientes expostos a imunoterapia. Outros biomarcadores, como CDK12, instabilidade de microssatélite (MSI), carga mutacional tumoral (TMB) e DDR, foram analisados através de Foundation Medicine.

Conclui-se, dessa forma, que a associação de ENZ e ATZ não deve ser uma estratégia oferecida a todos os pacientes e que o reconhecimento de biomarcadores é fundamental para a inclusão da imunoterapia no tratamento desses pacientes.

 

 

Powles, T., Yuen, K.C., Gillessen, S. et al. Atezolizumab with enzalutamide versus enzalutamide alone in metastatic castration-resistant prostate cancer: a randomized phase 3 trial. Nat Med (2022). https://doi.org/10.1038/s41591-021-01600-6.
Atezolizumabe associado a enzalutamida versus enzalutamida isolada no câncer de próstata resistente à castração: estudo de fase 3 randomizado.

 

Comentário do avaliador científico:

O estudo, infelizmente, não trouxe dados tão animadores aos pacientes portadores de câncer de próstata metastático resistentes à castração. Ao invés disso, nos encheu de hipóteses, várias delas já sabidas, outras nem tanto.

O desfecho não significativo em termos de SG reforça que a utilização da imunoterapia não deve ser aplicada a todos os doentes. Quando analisamos que se trata de um estudo fase 3, com quase 800 pacientes, acredito ser essa uma conclusão bastante consistente. Como positivo dentre a população total do estudo, talvez as questões de segurança: a associação de ENZ e ATZ não demonstrou riscos mais significativos, o que permite novos estudos e sua utilização quando indicada.

Outro ponto importante a ser destacado: o câncer de próstata, independente se em fases sensíveis ou resistentes à castração, é um tumor frio. TMB, PD-L1 e infiltração de CD8, parâmetros clássicos encontrados em tumores quentes, são bastante discretos nessa doença, e inferiores aos encontrados em outros tumores urológicos (figura 2).

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Figura 2: Nota-se que os marcadores inflamatórios são mais discretos nos tumores prostáticos quando comparados com o câncer de rim e de bexiga.

Apesar desses dados, alguns pacientes tiveram TR bastante significativo. Buscar as características desses doentes é fundamental para um tratamento mais eficaz. Talvez as subpopulações beneficiadas em termos de SLP sejam aquelas mais sensíveis a imunoterapia: portadores de perda de PTEN, assinatura gênica de células T efetoras mais elevada, PD-L1 acima de 5% (IC 2/3), infiltração de linfócitos T CD8 e TMB elevado (figura 3). A alteração de TP53 também demonstrou ganho de SLP, mas todos esses dados devem ser vistos com cautela, visto que as subpopulações são bastante pequenas e tais análises podem ter sido comprometidas.

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Figura 3: Forest plot mostrando possíveis biomarcadores para uso de imunoterapia.

Para finalizar, as considerações que julgo mais promissoras: o reconhecimento de mutação em alguns genes ofereceu ganhos de SLP muito significativos. CCL2, CXCL9 e TAP1 são alguns dos vários genes relacionados aos desfechos positivos quando expostos a imunoterapia, com HR~0,4. Provavelmente, o reconhecimento individual desses oncogenes nos traga dados mais robustos num futuro não tão distante.

 

Avaliador científico:

Dr. Elge Werneck
Residência em oncologia clínica pelo Hospital Felício Rocho em Belo Horizonte
Oncologista clínico no Grupo Oncoclínicas Unidade Curitiba e Coordenador do Núcleo de Educação Continuada