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SBOC REVIEW

Bloqueio de PD-1 em câncer de reto localmente avançado com deficiência de enzimas de reparo

Resumo do artigo:

O câncer de reto localmente avançado, rotineiramente, é manejado com terapia trimodal com quimioterapia e radioterapia associado a abordagem cirúrgica. Mais recentemente, estudos de tratamento neoadjuvante total, antecipando toda o tratamento com quimio e radioterapia a ser realizado, seguido de cirurgia têm demonstrado resultados animadores, com até 25% dos pacientes apresentando resposta patológica completa (RPC). No entanto, é importante apontar que o tratamento trimodal, apesar de curativo em uma parcela dos casos, não vem isento de toxicidades relevantes e a ressecção cirúrgica, muitas vezes, acompanhada de ostomia definitiva.

Diante do número considerável de casos de RPC e das complicações cirúrgicas, modalidades de tratamento com preservação do reto têm ganhado espaço. Ao usar resposta clínica completa (RCC) como desfecho em pacientes tratados com terapia neoadjuvante total, foi demonstrado que pacientes tratados com modalidades não-cirúrgicas têm benefício em sobrevida semelhante àqueles que são operados.

Cerca de 5 a 10% dos pacientes com câncer de reto apresentam deficiência das enzimas de reparo (dMMR) e classicamente respondem pouco a terapias contendo quimioterapia com ou sem radioterapia. Apesar disso, pacientes com dMMR apresentam resultados promissores com inibidores de checkpoint imune (ICI).

Com base em estudos no cenário metastático, foi desenhado este estudo prospectivo, fase II de braço único incluindo pacientes com adenocarcinoma de reto localmente avançado (EC II ou III) com dMMR que não haviam recebido nenhuma modalidade prévia de tratamento. Estes pacientes foram tratados de modo neoadjuvante com dostarlimabe (anticorpo monoclonal anti-PD-1) na dose de 500 mg a cada 3 semanas por 6 meses. Os pacientes receberiam uma avaliação completa ao final de 6 meses e os que apresentassem RCC ao anti-PD-1 seriam seguidos com manejo não-operatório. Os demais pacientes receberiam quimorradioterapia (QRT) (5040 cGy em 28 frações e capecitabina concomitante) com manejo não-operatório, caso RCC, ou cirurgia padrão com excisão total do mesorreto, se doença residual.

Os desfechos co-primários do estudo eram RCC sustentada após 12 meses ou RPC após término de tratamento com dostarlimabe com ou sem QRT e resposta ao dostarlimabe neoadjuvante com ou sem QRT.

Neste estudo, 12 dos 16 pacientes já recrutados completaram tratamento com dostarlimabe e tiveram pelo menos 6 meses de seguimento. Destes, todos os pacientes apresentaram RCC (100%; intervalo de confiança 95%, 74 a 100%) sem evidência de tumor em ressonância magnética, PET-CT, avaliação endoscópica, toque retal ou biópsia. Além disso, até o momento da publicação do estudo (com seguimento mediano de 12 meses), todos os 12 pacientes seguem vivos e nenhum paciente foi submetido a QRT ou cirurgia bem como não apresentaram evidência de progressão ou recidiva de doença. As respostas terapêuticas foram observadas de maneira precoce com resolução de sintomas após 9 semanas de início do dostarlimabe em 81% dos pacientes e 5 pacientes apresentaram RCC com 3 meses. Eventos adversos foram reportados em 12 dos 16 pacientes (75%), os mais comuns sendo sangramento retal, constipação e dor abdominal, porém nenhum evento adverso grau 3 ou mais foi observado.

Em conclusão, o adenocarcinoma de reto localmente avançado com deficiência de enzimas de reparo mostrou-se altamente sensível ao bloqueio de PD-1.

 

 

Cercek A et al. PD-1 Blockade in Mismatch Repair–Deficient, Locally Advanced Rectal Cancer. N Engl J Med 2022;386:2363-76. DOI: 10.1056/NEJMoa2201445.
Bloqueio de PD-1 em câncer de reto localmente avançado com deficiência de enzimas de reparo.

 

Comentário da avaliadora científica:

Em um cenário potencialmente curativo com a terapia padrão, o presente estudo buscou testar se é possível usar ICI para substituir (ou até mesmo eliminar) tanto quimio e radioterapia quanto cirurgia em câncer de reto dMMR localmente avançado unindo os benefícios da imunoterapia com ganhos já demonstrados do manejo não-operatório.

Neste estudo, grande parte dos pacientes apresentavam doença T4 e N+ e com alta probabilidade de receber terapia trimodal. No entanto, 100% dos 12 pacientes avaliados após 6 meses de dostarlimabe apresentaram RCC e mantiverem-se sem QRT ou cirurgia bem como sem progressão ou recidiva de doença. Resultado este que é, de fato, sem precedentes nesta população.

No entanto, vale ressaltar que a parcela de pacientes dMMR em câncer de reto é pequena. Além disso, trata-se de um estudo pequeno de centro único, com follow-up curto e com apenas um desfecho reportado até o momento.

Dorstarlimabe neoadjuvante no tratamento de pacientes com câncer de reto dMMR localmente avançado causou grande otimismo, porém estudos multicêntricos maiores, com follow-up maior e desfechos de sobrevida são cruciais para justificar uma mudança no tratamento padrão desta doença.

 

Avaliadora científica:

Dra. Maria Cecília Mathias
Residência de Oncologia Clínica no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP)
Preceptora de Oncologia Clínica no Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP)
Advanced Fellow em Oncologia Gastrointestinal no Grupo Oncoclínicas