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SBOC REVIEW

Câncer de Testículo na Era da Cisplatina: Causas de Morte e Taxas de Mortalidade em uma Coorte de Base Populacional

Resumo do artigo:

Estudo de coorte populacional, baseado no Registro de Câncer Norueguês, que incluiu 5.707 homens diagnosticados com tumores germinativos primários do testículo entre 1980 e 2009. Foram excluídos pacientes com malignidade prévia, idade < 16 anos ao diagnóstico, tumores extragonadais ou com dados clínicos incompletos.

A população foi categorizada em 4 grupos de tratamentos: cirurgia isolada (n=1405; 25%); quimioterapia (QT) baseada em platina (n=2521; 44%, onde apenas 359 pacientes receberam carboplatina, a maioria adjuvante); radioterapia (RT; n=1.550; 27%) e QT com platina + RT (n=231; 4%). Foram calculadas as taxas de mortalidade padronizadas (TMPs), dividindo-se o nº de mortes observadas no estudo pelo nº de mortes esperadas na população geral, e o excesso absoluto de risco e foram estimadas as incidências de mortalidade não relacionada ao câncer de testículo (CT).

O seguimento mediano foi de 18,7 anos e a idade mediana ao diagnóstico era de 33,1 anos. Ao todo, 846 pacientes (15%) faleceram durante o seguimento. destes, 181 (3,2% do total) óbitos foram relacionados ao CT (a maioria nos primeiros 5 anos após o diagnóstico). Dos 665 óbitos restantes (12% do total), não relacionados ao CT, 67% ocorreram em pacientes com histologia seminomatosa.

A mortalidade bruta cumulativa em 25 anos não relacionada a CT foi de 13,7%; superando o risco esperado populacional (estimado em 11,3%). Comparando-se com a população geral, observou-se um excesso de 23% na mortalidade não relacionada a CT, nesta coorte. Após tratamentos com platina e/ou RT, a mortalidade foi de 1,23 a 2,04 vezes maior que o esperado, com aumento mais significativo após os 10 anos de seguimento. As maiores incidências de mortalidade não relacionada a CT foram observadas nos pacientes diagnosticados antes dos 20 anos (TMP 2,27), particularmente nos tratados com platina.

Dentre as mortes não relacionadas a CT, 257 (4,5% do total) decorreram de uma 2ª neoplasia primária (segundo câncer, SC), representando um excesso de 53% em relação à população geral. Após tratamentos com platina e/ou RT, o risco de mortalidade por SC aumentou de 1,43 a 3,24 vezes. Exposição à platina aumentou o risco de morte por cânceres do lábio, cavidade oral e faringe; esôfago; pulmão; bexiga e leucemia. A RT associou-se a um aumento do risco de óbito por tumores do lábio, cavidade oral e faringe; estômago; fígado; pâncreas e bexiga. As TMPs por SC também foram maiores naqueles pacientes diagnosticados com CT antes dos 20 anos.

Em relação à mortalidade por outras causas, houve um excesso de 15% em relação ao esperado para a população geral. Após cirurgia, houve um aumento de mortes por doenças infecciosas. A QT baseada em platina foi associada a um aumento de 3,29 vezes da mortalidade por doenças geniturinárias e 1,65 vezes maior de suicídio. A RT associou-se a um risco maior de morte por doenças do trato digestivo. Nesta coorte, a mortalidade geral por doença cardiovascular (DCV) não aumentou em decorrência dos tratamentos, com exceção apenas no 1º ano de seguimento, quando se observou um excesso de mortes por DCV no grupo QT com platina (TMP 3,90). Porém, às custas de poucos eventos (n = 3; 2 IAMs e 1 AVC).

Comparando-se os grupos, a mortalidade não relacionada a CT foi maior nos que receberam platina e/ou RT do que com cirurgia, principalmente com um risco maior de mortes por SC (especialmente naqueles que receberam > 4 ciclos de QT baseada em cisplatina ou RT ≥ 20 Gy).

 

Ragnhild Hellesnes et al. Testicular Cancer in the Cisplatin Era: Causes of Death and Mortality Rates in a Population-Based Cohort. Journal of Clinical Oncology 2021 39:32, 3561-3573. DOI: 10.1200/JCO.21.00637.
Câncer de Testículo na Era da Cisplatina: Causas de Morte e Taxas de Mortalidade em uma Coorte de Base Populacional.

 

Comentário do avaliador científico:

Em virtude do diagnóstico em jovens e altas taxas de cura dos tumores germinativos desde a introdução da cisplatina, o seguimento dos sobreviventes de CT se tornou um paradigma para a avaliação de complicações relacionadas aos tratamentos oncológicos (especialmente RT e tratamentos citotóxicos) e seu impacto na morbimortalidade a longo prazo.

Um dos pontos positivos desta coorte foi o detalhamento dos tratamentos de QT e RT. Dados prévios foram corroborados, sugerindo aumento do risco de óbito por SC, conforme dose cumulativa de cisplatina e maior dose de RT. O aumento do risco de ansiedade e depressão, somado ao excesso de mortes por suicídio, aponta para a necessidade de atenção especial à saúde mental destes pacientes.

A mortalidade global por DCV semelhante à população geral neste estudo pode ser atribuída aos avanços no manejo de DCV nas 2 últimas décadas, com queda de mortalidade em geral.

O estudo aponta para a necessidade de estratificação mais precisa de risco, permitindo aprimorar as estratégias de tratamento e decisão de tratamentos intensificados. Há necessidade de orientações claras quanto a modificações do estilo de vida e atenção para o diagnóstico de novos tumores primários durante o seguimento.

 

Avaliador científico:

Dr. Guilherme Fialho de Freitas
Oncologista clínico pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo
Médico Assistente no ICESP - Grupo de Tumores Geniturinários e na Oncologia D'Or