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SBOC REVIEW

Eficácia do selpercatinibe em cânceres tireoidianos associados a alterações no gene RET

Resumo do artigo:

Mutações no proto oncogene RET são bastante prevalentes no carcinoma medular da tireoide (CMT), seja no contexto de uma síndrome hereditária de neoplasia endócrina múltipla (NEM2A e NEM2B), responsável por 25% do total de casos, mas também nos casos esporádicos, nos quais as mutações somáticas são encontradas em 60% dos casos.
O oncogene RET codifica um receptor tirosina quinase transmembrana defeituoso que permanece constitutivamente ativado independente da presença de um ligante, e exerce papel central na oncogênese do CMT. Ademais, a presença dessas mutações implica em pior prognóstico pois está associada a um curso de doença mais agressivo.
Em menor proporção (< 10% do total de casos), mas de extrema importância por serem doenças muito mais prevalentes na população, fusões envolvendo o gene RET também ocorrem nos cânceres que se originam das células foliculares, os carcinomas diferenciados da tireoide.
No momento, dispomos de inibidores não seletivos para tratamento dos cânceres de tireoide associados a alterações de RET. Vandetanibe e Cabozantinibe para CMT, e Sorafenibe e Lenvatinibe para carcinomas diferenciados. A despeito de apresentarem atividade contra essas doenças, com taxas de resposta variando de 12 a 65%, são drogas com perfil de toxicidade desfavorável, característica atribuída à inibição concomitante de quinases não-RET.
O Selpercatinibe é uma pequena molécula que age como inibidor altamente seletivo de RET. O LIBRETTO-001 é um estudo clínico em andamento de fase 1-2, cujo objetivo é avaliar a segurança e a eficácia do Selpercatinibe em qualquer tumor sólido no qual seja detectado um gene RET alterado (mutações e fusões). A publicação objetivo dessa discussão é uma análise da coorte cânceres tireoidianos.
Os dados de 162 pacientes com câncer de tireoide RET-Alt(+) foram apresentados, assim distribuídos: 55 pacientes com CMT previamente tratados com Vandetanibe e/ou Cabozantinibe; 88 pacientes com CMT não previamente tratados com Vandetanibe ou Cabozantinibe; e 19 pacientes com carcinomas diferenciados da tireoide (incluindo as variantes papilar, pouco diferenciado, anaplásico e células de Hürthle). O desfecho primário foi a taxa de resposta objetiva (resposta parcial ou completa) determinada por um comitê independente de radiologistas, que adotou os critérios do RECIST v1.1. Sobrevida livre de progressão (SLP), duração da reposta e segurança foram os end points secundários do estudo. Os participantes da fase 2 do estudo receberam uma dose de 160 mg duas vezes ao dia de Selpercatinibe.
Em CMT, a taxa de resposta observada foi de 69% (IC 95%, 55 a 81) nos previamente tratados com Vandetanibe e/ou Cabozantinibe; e de 73% (IC 95%, 62 a 82) nos não previamente tratados com esses inibidores multi-alvo. As taxas de sobrevida livre de progressão em 1 ano foram, respectivamente, de 82% (IC 95%, 69 a 90) e 92% (IC 95%, 82 a 97). Nos 19 pacientes com carcinomas diferenciados da tireoide associados a fusões no gene RET, a taxa de resposta objetiva foi de 79% (IC 95%, 54 a 94) e a SLP em 1 ano de 64% (IC 95%, 37 a 82).
Os eventos adversos de graus 3 e 4 mais comuns foram: hipertensão arterial (21%), elevação de aminotransferases (11% para ALT e 9% para AST), hiponatremia (8%), e diarreia (6%). Redução de dose foi necessária em 30% dos pacientes tratados. E a taxa de descontinuação de Selpercatinibe devido a efeitos colaterais foi de apenas 2% para toda a população do estudo LIBRETTO-001 (12 num total de 531 participantes).

 

Efficacy of Selpercatinib in RET-Altered Thyroid Cancers. Wirth LJ, et al. N Engl J Med. 2020;383(9):825-835.
Eficácia do Selpercatinibe em cânceres tireoidianos associados a alterações no gene RET.

 

Comentários do avaliador científico:

Em razão da alta prevalência de alterações no proto oncogene RET em carcinomas da glândula tireoide (CMT especialmente), o desenvolvimento de um inibidor seletivo capaz de induzir altas taxas de resposta, duráveis, e com um perfil de efeitos colaterais bastante favorável, é fato bastante desejável.
Ambos, Vandetanibe e Cabozantinibe, foram previamente aprovados para o tratamento do CMT metastático, após demonstrarem eficácia em estudos de fase 3 placebo-controlados. A título de comparação, as taxas de resposta e de SLP alcançados foram de 28% e 11,2 meses para o Cabozantinibe, e 45% e 30,5 meses para o Vandetanibe. A despeito da indiscutível eficácia em termos de aumento da SLP comparativamente a placebo, essas drogas frequentemente precisam ter suas doses reduzidas, ou mesmo necessitam ser permanentemente suspensas por efeitos colaterais. A inibição do VEGFR2 (vascular endothelial growth factor receptor 2) é o fator implicado em muitos dos eventos adversos toxicidade limitantes, e alguns pacientes são inelegíveis pelo risco inaceitável de sangramentos e/ou dificuldade de cicatrização de feridas. A seletividade do Selpercatinibe explica sua melhor tolerância clínica. Ou seja, a droga inibe eficientemente somente o necessário, justamente a tirosina quinase RET alterada, o cerne da patogênese da neoplasia, fazendo jus portanto ao termo “terapia-alvo”.
O estudo LIBRETTO-531 é um ensaio clínico de fase 3, multicêntrico, aberto, randomizado, de Selpercatinibe versus Cabozantinibe ou Vandetanibe em CMT RET-Mut(+) avançado, no momento em fase de recrutamento. O estudo é chefiado pelo Dr. Eric J. Sherman do MSKCC, e definirá o papel do Selpercatinibe no CMT RET-Mut(+) metastático.

 

Avaliador científico:
Dr. Rodrigo Bovolin de Medeiros
Oncologista do Hospital Sírio-Libanês em Brasília/DF