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SBOC REVIEW

Especial ASCO 2023 – Tumores Ginecológicos

KEYNOTE-826: Resultados finais de sobrevida global do estudo de fase 3, randomizado, duplo cego, de quimioterapia + pembrolizumabe vs quimioterapia + placebo no tratamento de 1º linha do câncer do colo do útero persistente, recorrente ou metastático

Monk et al. KEYNOTE-826: Final overall survival results from a randomized, double-blind, phase 3 study of pembrolizumab + chemotherapy vs placebo + chemotherapy for first-line treatment of persistent, recurrent, or metastatic cervical cancer. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 16; abstr 5500)

O estudo KEYNOTE-826 foi um estudo de fase 3 no cenário de 1ª linha, no qual pacientes com câncer do colo do útero persistente, recorrente ou metastático foram randomizadas para receber quimioterapia baseada em platina (paclitaxel + cisplatina ou carboplatina) por até 6 ciclos em associação a pembrolizumabe 200 mg EV a cada 21 dias ou placebo por 2 anos. Bevacizumabe era permitido a critério do investigador. Dados preliminares foram apresentados na ESMO 2021, com ganhos estatisticamente significativos em sobrevida livre de progressão e sobrevida global, embora a mediana de sobrevida global não havia sido até então alcançada na população CPS ≥ 1.

Na ASCO 2023, foram apresentados os dados finais após seguimento mediano de 39,1 meses. Na população CPS ≥ 1, a sobrevida global mediana foi 28,6 meses no grupo que recebeu pembrolizumabe versus 16,5 meses no grupo placebo (HR 0,6; IC 95% 0,49 – 0,74; P < 0,0001). Na população geral, a magnitude do benefício foi semelhante – 26,4 meses no grupo pembrolizumabe versus 16,8 meses no grupo placebo (HR 0,63; IC 95% 0,52 – 0,77; P < 0,0001), no entanto é imprescindível reforçar que 89% das pacientes incluídas no estudo eram CPS ≥ 1. Em relação a população CPS ≥ 10, a sobrevida global mediana foi 29,6 meses no grupo que recebeu pembrolizumabe contra 17,4 meses no grupo do placebo (HR 0,58; IC 95% 0,44 – 0,78; P < 0,0001). O benefício alcançado com pembrolizumabe + quimioterapia ocorreu independentemente da associação ou não do bevacizumabe.

Em termos de sobrevida livre de progressão, pembrolizumabe + quimioterapia também mostrou ganhos estatisticamente significativos, de modo que mesmo após suspensão da imunoterapia (no estudo ela era realizada por 2 anos), o benefício foi sustentado. Com relação a taxa de resposta objetiva, foi demonstrado um ganho de 50,9% para 68,5% na população CPS ≥ 1, com resposta duradoura (mediana de 19,2 meses).

Os eventos adversos grau ≥ 3 foram 82,4% no grupo pembrolizumabe e 75,4% no grupo placebo, porém os mais incidentes foram anemia, neutropenia e hipertensão, os quais são eventos sabidamente associados ao tratamento até então padrão (quimioterapia + bevacizumabe).

Assim, os dados finais apresentados são consistentes com os resultados preliminares e ratificam pembrolizumabe + quimioterapia ± bevacizumabe como tratamento de escolha em 1ª linha para pacientes com câncer do colo do útero avançado, com a atual aprovação pelas agências regulatórias para população com CPS ≥ 1.

Estudo internacional e randomizado de fase 3 comparando histerectomia radical e dissecção nodal pélvica versus histerectomia simples e dissecção nodal pélvica em pacientes com câncer do colo do útero estágio inicial baixo risco

Plante et al. An international randomized phase III trial comparing radical hysterectomy and pelvic node dissection (RH) vs simple hysterectomy and pelvic node dissection (SH) in patients with low-risk early-stage cervical cancer (LRESCC): A Gynecologic Cancer Intergroup study led by the Canadian Cancer Trials Group (CCTG CX.5-SHAPE). J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 17; abstr LBA5511)

Trata-se de um estudo de fase 3 de não inferioridade, que incluiu 700 mulheres com câncer do colo do útero em estágio inicial de baixo risco, definido como carcinoma de células escamosas, adenocarcinoma ou carcinoma adenoescamoso, estágios IA2 e IB1, com lesão ≤ 2 cm, invasão estromal de até 10 mm em LEEP/cone ou menor que 50% na RNM, grau 1 a 3 ou grau não acessado. As pacientes foram randomizadas entre dezembro/2012 a novembro/2019 para histerectomia radical ou histerectomia simples após estratificação de acordo com grupo cooperativo, mapeamento do linfonodo sentinela, estadiamento, tipo histológico e grau do tumor. Em ambos os braços, era realizada dissecção linfonodal pélvica.

Com um seguimento mediano de 4,5 anos, a taxa de recorrência pélvica em 3 anos na população com intenção de tratar foi 2,52% com histerectomia simples e 2,17% com histerectomia radical, demonstrando a não inferioridade da histerectomia simples em comparação com a cirurgia radical. Sobrevida livre de recidiva extra-pélvica e sobrevida global em 3 anos foram, respectivamente, 98,1% e 99,1% com histerectomia simples e 99,7% e 99,4% com histerectomia radical.

A indicação de tratamento adjuvante foi similar entre os braços (9,2% com histerectomia simples e 8,4% com histerectomia radical), sugerindo que pacientes que receberam histerectomia simples não foram mais propensas a receber recomendação quanto a tratamento adjuvante por não terem realizado cirurgia radical.

Não houve diferença estatisticamente significativa em relação a complicações cirúrgicas intraoperatórias; no entanto, pacientes submetidas à histerectomia radical apresentaram taxa 3 vezes maior de injúria vesical e quase 2 vezes maior de injúria ureteral.

Ainda, pacientes submetidas a histerectomia radical apresentaram incidência significativamente maior de incontinência urinária (11% versus 4,7%, P = 0,003) e retenção urinária (9,9% versus 0,6%, P < 0,0001) após 4 semanas da cirurgia. As escalas de qualidade de vida e saúde sexual demonstraram também diferenças relevantes, todas a favor da cirurgia simples.

O estudo SHAPE traz assim mudanças na prática clínico-cirúrgica, com a possibilidade de descalonamento de tratamento em pacientes selecionadas com câncer de colo do útero estágio inicial ao demonstrar a não-inferioridade da abordagem linfonodal e histerectomia simples em relação a histerectomia radical, aliado ainda a menores taxas de complicações e melhoria em qualidade de vida.

Dostarlimabe para câncer endometrial avançado ou recorrente: Resultados por revisão central independente cega do estudo RUBY (ENGOT-EN6-NSGO/GOG-3031/RUBY)

Powell et al. Dostarlimab for primary advanced or recurrent (A/R) endometrial cancer (EC): Outcomes by blinded independent central review (BICR) of the RUBY trial (ENGOT-EN6-NSGO/GOG-3031/RUBY). J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 16; abstr 5503)

RUBY foi um estudo de fase 3, randomizado, duplo cego em que pacientes com câncer de endométrio recorrente ou avançado (estágios III/IV) foram randomizadas para receber dostarlimabe 500 mg EV a cada 3 semanas ou placebo, associado a quimioterapia (carboplatina + paclitaxel) por 6 ciclos, seguido de dostarlimabe 1000 mg EV a cada 6 semanas ou placebo por até 3 anos. Interessante destacar que o estudo permitiu a inclusão de histologias mais raras: carcinossarcoma, células claras e seroso. Em uma primeira apresentação do estudo, realizada no SGO Annual Meeting de 2023, foram vistos os dados analisados pelo investigador, com sobrevida livre de progressão de doença atingindo HR 0,28 na população com dMMR/MSI-H e HR 0,64 na população geral. Dados de sobrevida global são ainda imaturos, porém uma tendência favorável inicial é vista no braço dostarlimabe + QT.

Na ASCO 2023, foram apresentados os resultados por revisão central independente cega (BICR). Os benefícios evidenciados por BICR foram consistentes com os vistos pelo investigador em todos os endpoints. Sobrevida livre de progressão por BICR foi significativamente mais longa com dostarlimabe + QT do que com placebo + QT na população geral (HR 0,66; IC 95% 0,517 – 0,853) e de maneira ainda mais proeminente na população dMMR/MSI-H (HR 0,29; IC 95% 0,158 – 0,543). A taxa de resposta objetiva por BICR com dostarlimabe + QT foi 68,2% na população geral e 77,1% na população dMMR/MSI-H, ao passo que no grupo placebo + QT as taxas atingidas foram 59,4% e 63,3%, respectivamente, além de que o grupo que recebeu imunoterapia teve uma resposta mais duradoura.

Em relação ao perfil de segurança, a frequência de eventos severos foi cerca de 10% mais alta com dostarlimabe + QT que com placebo + QT. Descontinuação de quimioterapia foi similar nos dois braços.

Concluindo, é um estudo de extrema relevância para as pacientes com câncer de endométrio recorrente ou avançado, particularmente naquelas com dMMR/MSI-H. Foi demonstrado que dostarlimabe + quimioterapia com carboplatina e paclitaxel reduziu o risco de progressão ou morte em 34% na população geral e em 71% na população dMMR/MSI-H quando avaliado por revisão central independente cega, com resultados consistentes e altamente concordantes com as análises pelo investigador.

Durvalumabe com carboplatina/paclitaxel e bevacizumabe, seguido de manutenção com durvalumabe, bevacizumabe e olaparibe em pacientes com câncer de ovário avançado recém diagnosticado sem mutação no tumor em BRCA1/2: resultados do estudo DUO-O, um estudo de fase 3, randomizado, controlado por placebo

Harter et al. Durvalumab with paclitaxel/carboplatin (PC) and bevacizumab (bev), followed by maintenance durvalumcab, bev, and olaparib in patients (pts) with newly diagnosed advanced ovarian cancer (AOC) without a tumor BRCA1/2 mutation (non-tBRCAm): Results from the randomized, placebo (pbo)-controlled phase III DUO-O trial. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 17; abstr LBA5506)

No estudo DUO-O, pacientes com câncer de ovário epitelial de alto grau recém diagnosticado, estágios FIGO III-IV, sem mutação tumoral em BRCA1/2 e que haviam realizado cirurgia de citorredução primária ou com planejamento de cirurgia de intervalo, receberam 1 ciclo de tratamento (carboplatina + paclitaxel ± bevacizumabe) e então foram randomizadas (1:1:1) em três braços: o 1º braço consistia de quimioterapia + bevacizumabe + placebo, seguido de manutenção com bevacizumabe e placebos; no braço 2, as pacientes receberam quimioterapia + bevacizumabe + durvalumabe, seguido de manutenção com bevacizumabe + durvalumabe + placebo; por fim, o braço 3 consistia de quimioterapia + bevacizumabe + durvalumabe, seguido de manutenção com bevacizumabe + durvalumabe + olaparibe. Bevacizumabe foi dado por um total de 15 meses, durvalumabe por 24 meses e olaparibe por 24 meses.

O endpoint primário do estudo foi sobrevida livre de progressão (SLP) no braço 3 versus braço 1, tendo sido atingida diferença estatisticamente significativa tanto nas pacientes HRD positivas sem mutação somática em BRCA1/2 (mediana de 37,3 meses no braço 3 em comparação com 23 meses no braço 1 – HR 0,49; IC 95% 0,34 – 0,69; P < 0,0001) como na população com intenção de tratar (24,2 meses no braço 3 em comparação com 19,3 meses no braço 1 – HR 0,63; IC 95% 0,52 – 0,76; P < 0.0001).

Em análise de subgrupos, visto também benefício em SLP na população HRD negativa, com HR 0,68.

Quando realizada a comparação entre os braços 2 e 1, um ganho numérico foi evidenciado em SLP na população com intenção de tratar, mas sem atingir diferença estatisticamente significativa – mediana de 20,6 meses no braço 2 versus 19,3 meses no braço 1.

Dados de segurança foram consistentes com o perfil já conhecido de cada um dos agentes, com uma frequência mais alta de anemia e neutropenia grau ≥ 3, vista no braço 3 durante a fase de manutenção, o que se justifica pelo acréscimo do olaparibe.
Trata-se de um estudo ainda em andamento, com dados finais de sobrevida livre de progressão, sobrevida global e outros endpoints secundários ainda a serem avaliados.

Estudo de fase III MIRASOL: relatório inicial de mirvetuximabe soravtansina vs. quimioterapia de escolha do investigador em pacientes com câncer epitelial de ovário de alto grau, tuba uterina ou primário peritoneal platino-resistentes e com alta expressão de alfa-receptor de folato

Moore et al. Phase III MIRASOL (GOG 3045/ENGOT-ov55) study: Initial report of mirvetuximab soravtansine vs. investigator’s choice of chemotherapy in platinum-resistant, advanced high-grade epithelial ovarian, primary peritoneal, or fallopian tube cancers with high folate receptor-alpha expression. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 17; abstr LBA5507)

Mirvetuximabe soravtansina é um ADC composto por um anticorpo dirigido ao alfa-receptor de folato (FRα) conjugado a um agente inibidor de microtúbulos. Alta expressão de FRα (≥ 75% das células tumorais positivas com intensidade ≥ 2+) é vista em 35 – 40% dos carcinomas de ovário resistentes a platina.

MIRASOL foi um estudo fase III onde pacientes com câncer de ovário histologia serosa de alto grau, resistentes à platina, com exposição a 1-3 linhas prévias e que exibiam alta expressão de FRα foram randomizadas para receber mirvetuximabe soravtansina 6 mg/kg, ajustado pelo peso corporal ideal, a cada 3 semanas ou quimioterapia de escolha do investigador (paclitaxel semanal, doxorrubicina liposomal peguilado ou topotecano).

Houve diferença estatisticamente significativa em sobrevida livre de progressão acessada pelo investigador, com mediana de 3,98 meses no braço de QT versus 5,62 meses com mirvetuximabe soravtansina – HR 0,65 (IC 95% 0,52 – 0,81; P < 0,0001).

Diferença significativa também foi evidenciada em taxa de resposta, com mirvetuximabe mais que dobrando essa taxa – 42% versus 16%. Sobrevida global mediana foi 12,75 meses no braço de quimioterapia de escolha do investigador versus 16,46 meses no braço do ADC, demonstrando também um ganho estatisticamente significativo, com HR 0,67 (IC 95% 0,5 – 0,88; P < 0,0046). A magnitude dos benefícios apresentados foi consistente independentemente da exposição prévia ou não a bevacizumabe.

Em relação a tolerabilidade, mirvetuximabe soravtansina demonstrou menores taxas de eventos grau ≥ 3 e de descontinuidade em decorrência de eventos adversos. As principais toxicidades foram oculares e gastrointestinais, predominantemente em graus mais baixos e passíveis de estratégias preventivas e de mitigação.

Trata-se, portanto, de um estudo importante no cenário do câncer de ovário por ser o primeiro estudo de fase 3 a demonstrar ganho em sobrevida global no contexto da doença platino-resistente.

 

Monk et al. KEYNOTE-826: Final overall survival results from a randomized, double-blind, phase 3 study of pembrolizumab + chemotherapy vs placebo + chemotherapy for first-line treatment of persistent, recurrent, or metastatic cervical cancer. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 16; abstr 5500) ———————————————————————– 1

Plante et al. An international randomized phase III trial comparing radical hysterectomy and pelvic node dissection (RH) vs simple hysterectomy and pelvic node dissection (SH) in patients with low-risk early-stage cervical cancer (LRESCC): A Gynecologic Cancer Intergroup study led by the Canadian Cancer Trials Group (CCTG CX.5-SHAPE). J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 17; abstr LBA5511) —————————————————— 2

Powell et al. Dostarlimab for primary advanced or recurrent (A/R) endometrial cancer (EC): Outcomes by blinded independent central review (BICR) of the RUBY trial (ENGOT-EN6-NSGO/GOG-3031/RUBY). J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 16; abstr 5503) ——————– 3

Harter et al. Durvalumab with paclitaxel/carboplatin (PC) and bevacizumab (bev), followed by maintenance durvalumab, bev, and olaparib in patients (pts) with newly diagnosed advanced ovarian cancer (AOC) without a tumor BRCA1/2 mutation (non-tBRCAm): Results from the randomized, placebo (pbo)-controlled phase III DUO-O trial. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 17; abstr LBA5506)————————————————————— 4

Moore et al. Phase III MIRASOL (GOG 3045/ENGOT-ov55) study: Initial report of mirvetuximab soravtansine vs. investigator’s choice of chemotherapy in platinum-resistant, advanced high-grade epithelial ovarian, primary peritoneal, or fallopian tube cancers with high folate receptor-alpha expression. J Clin Oncol 41, 2023 (suppl 17; abstr LBA5507) – 5

Avaliadora científica:

Dra. Giovanna Vieira Giannecchini

Residência Médica em Oncologia Clínica pela Fundação PIO XII, Hospital de Câncer de Barretos

Título de Especialista em Oncologia Clínica pela SBOC/AMB

Atual Fellow em Tumores Femininos pelo Grupo Oncoclínicas