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SBOC REVIEW

Os desafios para implementação da tomografia computadorizada de baixa dose no rastreamento de câncer de pulmão em países de baixa e média rendas

Resumo do artigo:

O câncer de pulmão é um dos maiores causadores de morte por neoplasias malignas no mundo todo. Dados da GLOBOCAN mostram 2.093.876 novos casos e um total de 1.761.007 mortes em 2018, sendo que 65,3% destas mortes acontecem em países economicamente classificados como baixa e média renda (PBMR). Com o aumento dos níveis de poluição do ar e a alta prevalência de tabagistas (80% dos 1,3 bilhões de tabagistas mundiais residem em PBMR), há tendência de aumento desses números e representa uma crise de saúde pública. Em estágios iniciais, o câncer de pulmão células não pequenas (CPCNP), tipo mais comum, pode ser tratado com intuito curativo, atingindo sobrevida global em 24 meses superior à 90% quando diagnosticado em estágio IA.

Os grandes estudos que avaliam o impacto do uso da tomografia computadorizada de baixa dose (TCBD) na redução da mortalidade por câncer de pulmão (CP) foram majoritariamente desenvolvidos em países de alta renda e mostram resultados heterogêneos. Dados de PBMR são escassos e provenientes daqueles com maiores rendas. O Brazilian Lung Cancer Screening Trial incluiu 790 participantes entre 2013 e 2014 e usou os critérios de inclusão do estudo NLST, com ponto de corte >4mm para nódulo suspeito. Neste estudo, o número de procedimentos invasivos e o diagnóstico de CP (1,3%) foi similar a outros estudos, sendo 80% diagnosticados em estágios 1A/B. A maior taxa de nódulos considerados positivos (39,6%) é associada com a alta prevalência de tuberculose.

Um programa de rastreamento deve envolver desde o acesso ao sistema de saúde, a identificação da população de alto risco, captação, adesão e implementação, seguido de interpretação, comunicação do resultado e, em curto período, referência para diagnóstico e tratamento específico. Uma das barreiras citadas é a dificuldade de acesso aos programas de rastreio em algumas regiões devido grandes distâncias, falta de transporte ou má condições das estradas.

Nas fases de implantação do rastreamento em PBMR, é prioritário investir em programas de educação e estratégias de sensibilização da população, respeitando a cultura local. Há evidência que do benefício em empregar trabalhadores de saúde da comunidade para recrutamento e aconselhamento em PBMR, promovendo campanhas de cessação de tabagismo e conscientização (diminuindo os estigmas do diagnóstico de CP), triando casos elegíveis e seguindo os pacientes, aumentando aderência. Trata-se de estratégia factível e complementar à uma equipe médica que pode estar sobrecarregada.

Há necessidade de disponibilizar tomógrafos ao longo do território nacional e de equipes treinadas segundo protocolos, selecionando melhor os casos suspeitos e evitando gastos com sobrediagnóstico e tratamento excessivo. Além de radiologistas intervencionistas, cirurgiões torácicos e patologistas experientes. Tudo isso requer um investimento financeiro alto, mas como há relação direta entre doença avançada e maiores gastos, os custos do tratamento não curativo podem ser superiores à implantação do rastreamento.

São pontos importantes para aumento da eficácia, aplicabilidade e custo-efetividade da TCBD: (1) seleção dos critérios de elegibilidade com recomendação locais, como uso de modelos de predição de risco; (2) aumento do intervalo dos exames: exames bianuais ou adaptados segundo a presença de nódulos e/ou estratificação de risco, (3) políticas antitabagismo, (4) parceria entre sistemas público e privado, onde infraestrutura privada devidamente regulamentada, com provedores experientes e capacidade ociosa dos equipamento poderiam ser contratados e negociados orçamentos acessíveis; (5) uso de novas tecnologias, como telemedicina, telepatologia, educação continuada e comunicação entre os centros de referência e periféricos; (6) definição nacional e equidade nos valores para novas tecnologias implantadas, com custos adaptados às regiões de recursos limitados.

 

Edelman Saul, E., Guerra, R.B., Edelman Saul, M. et al. The challenges of implementing low-dose computed tomography for lung cancer screening in low- and middle-income countries. Nat Cancer 1, 1140–1152 (2020). https://doi.org/10.1038/s43018-020-00142-z.
Os desafios para implementação da tomografia computadorizada de baixa dose no rastreamento de câncer de pulmão em países de baixa e média rendas.

 

Comentário da avaliadora científica:

Este artigo discute importantes estratégias para a criação, planejamento e implementação de programas de rastreamento de câncer de pulmão utilizando a TCBD em PBMR.

Por conta das adversidades decorrentes das dificuldades e disparidades econômicas dos PBMR, não é apropriado utilizar exclusivamente os dados de estudos conduzidos em países de alta renda para implementação do programa. Além disso, mesmo unificados como um grande grupo, os PBMR carregam profundas diferenças entre si. Deve-se considerar a realização de estudos de custo-efetividade, permitindo a implementação de programas desenhados de forma personalizada e ajustados às prioridades e realidade de cada país.

No Brasil, por exemplo, que é um país de acentuada desigualdade social, multiplicidade étnica e com notáveis disparidades regionais, é improvável que um único programa de rastreio atenda a todo território nacional. No entanto, é possível que o sonho seja construído baseando-se no princípio da isonomia.

 

Avaliadora científica:

Dra. Poliana A. Signorini
Oncologista clínica pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA)
Gerente do Departamento de Oncologia Clínica da Fundação Centro de Controle de Oncologia do Amazonas (FCECON)
Médica pesquisadora do Centro Integrado de Pesquisa da Amazônia (CINPAM)